Por que marroquina fez história em goleada da Alemanha no Mundial feminino
Quando Nouhaila Benzina entrou em campo nesta segunda (24) para defender Marrocos pelo Mundial Feminino de futebol ela já fazia história, mesmo antes da bola rolar. E mesmo tendo ficado no banco de reservas durante a partida. A marroquina de 25 anos foi a primeira jogadora a competir no torneio usando um hijab (um tipo de véu que cobre a cabeça). A zagueira se tornou um símbolo de uma nova conquista de direitos humanos em ambiente esportivo.
O esporte entendendo e protegendo a fé da atleta. Um símbolo da inclusão no esporte.
Quando falamos de cultura islâmica, por muito tempo o esporte esqueceu o ideal esportivo de inclusão. Esporte protege direitos humanos, como o próprio estatuto da FIFA traz.
No art. 3, ele traz a previsão de que a "FIFA está comprometida com o respeito aos direitos humanos internacionalmente reconhecidos e deverá empreender esforços para promover a proteção desses direitos".
Mas alegando questão de segurança, o uso do hijab foi proibido não só no futebol, mas em vários esportes.
Faltou sensibilidade ao esporte. Faltou entender sua natureza.
Faltou ouvir, dialogar, chamar a ciência para a conversa e encontrar um caminho sem agredir direitos humanos.
Benzina se tornou um símbolo de inclusão em um esporte que até pouco tempo não permitia que as mulheres muculmanas usassem hijab.
O hijab proibido no futebol
As mulheres muçulmanas usam o hijab, um véu islâmico que cobre cabelo e pescoço. No dia a dia e também na prática esportiva.
No Irã, por exemplo, o uso do véu pelas mulheres que se expõem publicamente é uma imposição do ordenamento jurídico. E isso trouxe inúmeros problemas às federações esportivas do país. No futebol, no judô, no basquete, no boxe.
O problema é que regras esportivas de várias modalidades vedavam o uso do hijab em competições, alegando que ele poderia comprometer a saúde dos atletas, aumentando o risco de lesões na cabeça e no pescoço. O cenário esportivo ajudava a afastar ainda mais as mulheres muçulmanas de competições esportivas internacionais.
De novo, um conflito entre Lex Sportiva e Direitos Humanos.
Em 2011 a seleção de futebol feminino do Irã foi eliminada das eliminatórias para os jogos olímpicos de Londres 2012 porque as atletas se recusaram a tirar o hijab na partida contra a Jordânia. A decisão da FIFA repercutiu, e várias entidades muçulmanas, além de outras de direitos humanos, como também atletas, se uniram em uma campanha chamada "Let us play".
Com o auxílio da tecnologia, os véus foram adaptados à prática esportiva, diminuindo a força dos argumentos daqueles que defendiam que ele era perigoso e ameaçava a saúde dos atletas. A FIFA cedeu e, em 2014, anunciou que permitiria o hijab em competições nacionais.
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Quero receberMas só agora, 9 anos depois, Nouhaila Benzina nem precisou entrar na partida para representar essa conquista do esporte. Uma conquista gigante, que nem a derrota de Marrocos por 6 a 0 irá apagar.
A cultura do esporte vem mudando depois de decisões como a da FIFA
Em Londres 2012, pela primeira vez mulheres da Arábia Saudita e do Qatar puderam participar dos Jogos Olímpicos. Na Rio 2016, Ibtihaj Muhammad foi a primeira atleta americana a competir com o véu. Ganhou medalha de bronze na esgrima e subiu ao pódio de hijab.
Também no Rio uma imagem de um jogo de vôlei de praia que nem valia medalha ganhou destaque em todo o mundo. Na partida entre a seleção da Alemanha e a seleção do Egito, uma foto mostrou a disputa entre a alemã em trajes de praia e a egípcia com roupas cobrindo todo o corpo. Foi a primeira vez que o Egito participou da modalidade nos Jogos Olímpicos.
Existe caminho
Ou seja, existem caminhos. E ele passa necessariamente pelo diálogo necessário, entendendo os princípios do esporte e a necessária proteção de direitos humanos.
Cada vez mais a Lex Sportiva e os Direitos Humanos parecem caminhar na mesma direção com relação a importância de se entender e proteger a cultura local.
Ao conciliar a fé com a prática esportiva, o esporte dá um bom exemplo para a sociedade de como é possível, com diálogo, bom senso e flexibilidade, encontrar boas soluções também para importantes conflitos da nossa sociedade.
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