Direitos humanos e grandes eventos: uma grande oportunidade
Participando de um evento internacional de Direitos Humanos no Esporte organizado pelo Instituto Asser, muitos temas urgentes me fizeram refletir, como o direito das mulheres no esporte, a importância da governança na proteção de direitos humanos e o papel da justiça desportiva. Falarei de alguns deles mais tarde. Hoje quero escrever algumas linhas algumas linhas sobre mega-eventos e direitos humanos.
A especialista Lucy Amis trouxe um contexto de regulamentos privados e proteção de direitos humanos, bem como algumas questões que ainda precisam ser tratradas pelas entidades esportivas a fim de tornarem praticas compromissos assumidos em seus estatutos.
Claro que podemos questionar escolhas recentes do esporte, como levar Copa para a Arábia Saudita. O país tem uma série de denúncias graves de violação a direitos humanos universais feitas por entidades globais de proteção de DH.
Mas não podemos esquecer também que o esporte tem avançado em pautas necessárias, mesmo que muitas vezes motivado por pressões externas e decisões judiciais (mas mudanças vêm sempre de lutas). Pautas sociais podem ganhar força e acelerar transformações dentro do esporte e também na sociedade a partir de grandes eventos.
Vou lembrar aqui avanços importantes em dois maiores eventos esportivos do planeta.
Compliance no COI
Pela primeira vez na história das Olimpíadas, os Jogos de 2024, em Paris, passaram a ter um programa de compliance. Dentro dele, foi dada uma atenção a proteção de direitos humanos e ao combate à corrupção.
Nos item 13, e 13.1, são apresentados o compromisso da cidade-sede com os princípios da Carta Olímpica, como a proteção de direitos humanos. Já o item 13.2 do documento diz que a cidade anfitriã, o comitê olímpico nacional e o comitê organizador dos jogos devem "abster-se de qualquer ato envolvendo fraude ou corrupção, de forma consistente com quaisquer acordos internacionais, leis e regulamentos aplicáveis no país anfitrião e todos os padrões anticorrupção internacionalmente reconhecidos aplicáveis no país anfitrião, inclusive estabelecendo e mantendo relatórios efetivos e compliance".
Além disso, o documento exige respeito às leis nacionais e internacionais de direitos humanos. Dessa maneira, por exemplo, a cidade-sede não pode contratar empresas que usam trabalho escravo, além de intensificar o combate ao tráfico de pessoas, por exemplo.
O documento também determina que se for constatado algum ato de corrupção ou que viole os direitos humanos, a sede dos Jogos deverá pagar multa ao Comitê Olímpico Internacional. E mais: se a falta for muito grave, está prevista, inclusive, a possibilidade do COI determinar a troca de sede das Olimpíadas.
No futebol?
Depois do escândalo do Fifagate, a Fifa precisava criar uma agenda positiva. Dentro dessa estratégia, a valorização de direitos humanos ganhou destaque. Em 2017, foi lançada a Política de Direitos Humanos da entidade.
Como avanço trazido por essa política, há que se destacar a Copa de 2026, com sede em três países - Canadá, México e Estados Unidos. Ela é a primeira a ter no contrato com o país-sede cláusulas de direitos humanos.
Como parte dessas medidas, os países sedes do Mundial precisam se comprometer a seguir obrigatoriamente os princípios orientadores da ONU sobre empresas e direitos humanos e a desenvolver estratégias nessa proteção.
A determinação acaba por trazer para o ambiente esportivo o debate necessário e contemporâneo indispensável à sociedade, aos Estados e aos organismos internacionais. O esporte não se afasta do direito e o direito não se afasta da proteção de direitos humanos.
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Com essas novidades, as principais entidades do esporte mundial protegem de maneira efetiva compromissos estatutários. Mas esses avanços vão além da integridade e dos direitos humanos. Eles também protegem a própria autonomia, evitando irritações que a vigilância do estado poderia trazer.
As medidas tomadas para escolhas das sedes de grandes eventos esportivos decorrem também de recomendações constantes em suas novas políticas e regramentos internos. Isso mostra uma resposta efetiva do movimento esportivo às críticas que sofreu relacionadas a questões como sustentabilidade, transparência, gestão e respeito aos direitos humanos.
A verdade é que a sociedade não admite mais um comportamento passivo (de respeito) a direitos humanos. Ela exige de todos, inclusive do esporte, uma atitude ativa (de proteção) em relação a esses direitos.
O evento do Asser serve para isso. Para levantar questões urgentes, nos incomodar, entender que o caminho ainda é longo na proteção de direitos humanos no esporte. Mas, também para mostrar que estamos avançando. E avançar é oxigênio para seguir em frente.
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