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Brasil pode ter um 'Caso Diarra', que mude vínculo de atleta com clube?

As regras da Fifa que regulam transferências internacionais de jogadores violam as leis europeias, dado que impõem restrições à liberdade de circulação de trabalhadores e à livre concorrência. Assim decidiu o Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE) no início de outubro, ao julgar o caso do ex-jogador francês Lassana Diarra, que atuou por Chelsea, Arsenal, Real Madrid e PSG.

Especialistas acreditam que a decisão da Corte deve revolucionar as transferências no futebol. Os primeiros efeitos do veredicto já estão sendo observados. Na semana passada, a Fifa anunciou que convidou diversos stakeholders do futebol para discutir mudanças no artigo 17 do Regulamento sobre o Status e Transferências de Jogadores (RSTP).

O artigo 17 impede que um jogador com contrato vigente saia de um clube para atuar em outro sem o pagamento de multa. No entanto, ao derrubar o dispositivo no caso de Lassana Diarra, o TJUE acendeu um sinal de alerta para toda a comunidade do futebol.

A grande discussão agora é: qual será o impacto da decisão? O veredicto pode desencadear um efeito dominó, aumentando o assédio de clubes sobre jogadores e provocando mais rompimentos contratuais sem justa causa. Isso afetaria a estabilidade contratual e a economia dos clubes, já que a mudança poderia reduzir as taxas de transferência e aumentar o poder econômico dos jogadores.

Caso Lassana Diarra pode se repetir no Brasil?

Se aconteceu com Diarra, pode acontecer com outros jogadores na Europa e, eventualmente, em todo o mundo. Mas será que o mesmo poderia ocorrer no Brasil?

"Claro que a decisão — por envolver o futebol — provoca reflexão em todos os lugares. O jogador é um dos poucos trabalhadores que tem sua liberdade de trabalho limitada por uma regra privada. Isso pode ser discutido na esfera judicial brasileira também. No entanto, o caminho mais seguro seria um posicionamento firme dos atletas contra essa restrição, buscando mudanças nas regras do futebol, o que traria mais segurança jurídica", avalia o advogado desportivo e jornalista Andrei Kampff, que tratou sobre o tema em sua coluna no Lei em Campo. Andrei entende que "o sinal de alerta esta ligado. Exemplos históricos mostram como essas decisões na Europa acabam refletindo no Brasil e nas relações no futebol. A questão do vínculo do atleta é algo sensível ao futebol, mas que não está desconectado das relações de trabalho."

Já o advogado Rafael Teixeira Ramos, especialista em direito desportivo e trabalhista, acredita que o impacto será menor no Brasil do que na Europa.

"Além de o Brasil não ser membro da Comunidade Europeia, o país é exportador de mão de obra, e nossas Leis Pelé e Geral do Esporte mantêm a cláusula indenizatória desportiva sem limites para transferências internacionais. A única mudança que pode prejudicar os clubes e as Sociedades Anônimas do Futebol (SAFs) seria o fim da obrigatoriedade de registro dos documentos de transferência na Fifa, caso não haja uma negociação favorável. Isso deve se tornar tendência após o caso Lassana Diarra", explica.

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A advogada Ana Mizutori, especializada em direito desportivo, entende que "no Brasil, as regras específicas da Lei Geral do Esporte e da Lei Pelé e a forma como a Justiça do Trabalho brasileira trata os contratos de atletas podem dificultar um movimento semelhante ao ocorrido na Europa. A legislação esportiva brasileira já prevê a existência de cláusulas indenizatórias e compensatórias em contratos de atletas, prevendo, inclusive, a obrigatoriedade de tais penalidades. Além disso, a Justiça do Trabalho tem reconhecido a validade desses acordos, desde sejam pactuados de forma transparente e prévia, e observados os limites, mínimo e máximo, legais. Na minha ótica, esse contexto legislativo e previsões legais específicas dificulta uma interpretação que sirva de fundamento para não aplicação e incidência das cláusulas penais esportivas em razão da rescisão antecipada do contrato de trabalho."

Entenda o caso Lassana Diarra

Em 2014, Lassana Diarra, ex-volante do Real Madrid, Chelsea e PSG, teve seu contrato rescindido pelo Lokomotiv Moscou, da Rússia, quando ainda tinha mais um ano de vínculo. O jogador não reconheceu a rescisão, mas, mesmo assim, foi condenado a pagar uma indenização.

O Lokomotiv afirmou que Diarra não cumpriu seu contrato e exigia 20 milhões de euros (R$ 124 milhões) perante a Câmara de Resolução de Disputas (DRC) da FIFA e a Corte Arbitral do Esporte (CAS).

A Câmara de Resolução de Disputas da Fifa condenou Diarra a pagar 10,5 milhões de euros ao Lokomotiv. Após a decisão, o ex-jogador recorreu ao TJUE.

Por conta do imbróglio com o clube russo, Diarra ficou um ano longe dos gramados. O ex-jogador alega que a situação prejudicou sua carreira, uma vez que possíveis equipes interessadas se afastaram de um acerto com o francês por conta da indenização devida ao Lokomotiv Moscou, conforme previsão no RSTP.

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No dia 4 de outubro, o TJUE deu razão a Diarra, por considerar que o atual regulamento (RSTP) impede a livre circulação de jogadores profissionais para um novo clube dentro dos limites da União Europeia.

De acordo com a Corte Europeia, as regras da Fifa visam à "restrição da concorrência" e "não parecem ser indispensáveis ou necessárias".

"Essas regras impõem riscos legais consideráveis, riscos financeiros imprevisíveis e potencialmente muito altos, além de grandes riscos esportivos para os jogadores e clubes que desejam contratá-los. Isso, em conjunto, impede as transferências internacionais desses jogadores", diz um trecho da decisão do TJUE.

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