Jogadores atuam pelo Brasileiro em intervalo menor do que 66h. E agora?
A presidente do Palmeiras, Leila Pereira, disponibilizou um de seus aviões para trazer o zagueiro Gustavo Gómez e o meio-campista Richard Ríos após os jogos de suas respectivas seleções, Paraguai e Colômbia, nesta terça-feira (19), pelas Eliminatórias da Copa do Mundo de 2026.
A "operação" garantiu que a dupla não desfalcasse o Verdão na partida desta quarta-feira (20), contra o Bahia, na Arena Fonte Nova, pela 34ª rodada do Campeonato Brasileiro. O Alviverde garantiu a vitória por 2 a 1 e segue na cola do Botafogo.
Mas assim como os jogadores do Palmeiras, outros que participaram das Eliminatórias entraram em campo pelo Brasileiro em um intervalo inferior ao previsto pelo Regulamento Geral de Competições (RGC) — documento da Confederação Brasileira de Futebol (CBF) que estabelece as regras de todos os campeonatos de futebol realizados no Brasil —, que é de 66 horas.
No entanto, isso não significa que estão contrariando a regra. O advogado Matheus Laupman explica que o intervalo de 66 horas previsto no RGC não é válido quando consideramos partidas de seleções nacionais.
"Neste caso concreto, devemos verificar o que diz o artigo 27 do RGC da CBF. Essa disposição estabelece que, em regra, os atletas não poderão atuar em partidas por competições coordenadas pela CBF sem observar o intervalo de 66 horas entre uma partida e outra. Logo, uma das possíveis interpretações é que a restrição se aplica apenas às competições coordenadas pela CBF, ou seja, as partidas das eliminatórias não contariam para essa proibição das 66 horas, e, por consequência, os atletas estariam liberados a atuar por seus clubes. Cabe destacar que esse intervalo foi amplamente negociado entre as entidades desportivas e de classe", explica o especialista em direito desportivo.
O artigo 27 do RGC possui a seguinte redação: "Como regra geral, os clubes não poderão disputar, e os atletas não poderão atuar em partidas por competições coordenadas pela CBF, sem observar o intervalo mínimo de 66 (sessenta e seis) horas entre o horário de término previsto da primeira partida e o horário de início previsto da segunda partida."
Além de deixar expresso que o intervalo de 66 horas atende exclusivamente às competições organizadas pela CBF, o parágrafo 1º do artigo em questão diz: "O disposto neste artigo não se aplica aos casos de nova disputa de partidas suspensas, de partidas de desempate em competições oficiais ou de partidas em que o atleta retorna da sua Seleção Nacional."
Contudo, como as legislações desportivas brasileiras — Lei Pelé e Lei Geral do Esporte — são omissas quanto ao intervalo entre partidas, o tema pode ser discutido na esfera trabalhista. É o que explica a advogada Carolina Mayer Spina.
"A questão é superimportante, sobretudo porque exige uma interpretação jurídica sistemática, no sentido de entender os motivos para a existência de normas de proteção. Se analisarmos a Lei Pelé ou a Lei Geral do Esporte, identificaremos que não há previsão sobre a temática dos intervalos entre partidas de futebol. No entanto, devido à relevância das questões de saúde dos trabalhadores — lembrando sempre que o jogador de futebol é um trabalhador —, a CBF, com expressa adesão dos clubes, convencionou um intervalo de 66 horas entre o término de uma partida e o início de outra. Isso está previsto no artigo 27 do Regulamento Geral de Competições da CBF. Esse intervalo, inclusive, já foi de 72 horas; atualmente, é de 66 horas. Trata-se do que a doutrina chama de 'intervalo interjogos'", explica a especialista em direito trabalhista.
"Aliás, o próprio regulamento diz que, para haver redução desse intervalo de forma excepcional, é necessária a apresentação de um atestado médico comprovando a aptidão do atleta (parágrafo 2º). Sendo assim, sobretudo porque as partidas do Brasileirão serão disputadas após os jogos das Eliminatórias, os clubes, por mais que criem condições teóricas 'seguras' para o retorno rápido dos atletas a fim de participarem da rodada, estão violando normas vigentes de proteção à saúde dos jogadores. E essa violação gera, sim, direito à reparação. Em tempo, mesmo que o atleta fique no banco de reservas, persiste a infração, pois o intervalo é uma pausa", conclui.
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