Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.
Ataques contra Ângelo e Messias alertam para normalização do racismo
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A repercussão da presença do ex-santista Neymar na Vila Belmiro, na última quinta-feira, quando o Santos empatou sem gols com o Audax Italiano-CHI, pela segunda rodada da Copa Sul-Americana, ofuscou e mostrou o quanto atos racistas, como os que ocorreram contra o atacante Ângelo e o zagueiro Messias, estão se normalizando dentro e fora das arenas de futebol.
Como são raros os casos de pessoas punidas, os ataques racistas se proliferam com tamanha frequência que não será surpresa se voltarem a acontecer, com outros jogadores, neste domingo, na partida em que o Peixe recebe o Atlético-MG, pela segunda rodada do Campeonato Brasileiro.
Após o final do primeiro tempo, segundo relato da influencer digital Nanny Santos, uma pessoa, que jamais pode ser considerada torcedor do Santos, avisou que ia xingar o atacante Ângelo de "macaco". Ela ficou surpresa e só acreditou quando viu que ele cumpriu o que havia dito e destilou seu ódio com palavrões e insultos racistas.
Além de Ângelo, essa pessoa, que não é possível ser identificada na gravação de Nanny, repetiu as mesmas ofensas "Seu macaco do car*****, filho da p***" em direção ao zagueiro Messias.
Tudo isso aconteceu quando os jogadores caminhavam em direção ao túnel que dá acesso ao vestiário. Pela proximidade, daria para Ângelo e Messias responderem ao autor dos xingamentos, mas eles deixaram o gramado sem ao menos encarar essa pessoa.
Em entrevista ao UOL, Nanny Santos disse que procurou policiais militares e pediu providências, mas, segundo ela, a recomendação era prestar queixa em uma delegacia para que a pessoa fosse investigada.
Por fim, segundo a influencer, o autor do ato racista passou por ela como se nada tivesse acontecido.
Como é de praxe, o Santos, por meio de sua assessoria de imprensa, emitiu uma nota de repúdio, na qual destaca que o clube não vai se omitir e prometeu uma investigação para tentar encontrar essa pessoa e denunciá-lo "para que as autoridades tomem providências".
Clubes, federações, organizações e torcedores com o mínimo de bom senso fazem campanhas de conscientização contra o racismo, mas é evidente que os estádios de futebol refletem, por mais que os atos racistas sejam cometidos por uma minoria desajustada, o quão doente está a nossa sociedade.
Pior é que, principalmente, no esgoto chamado redes sociais e antissociais, muitos entendem como um "desabafo normal", que foi apenas uma maneira de a pessoa extravasar a sua indignação com o futebol apresentado pelo Santos.
O cúmulo do absurdo é que cada vez mais pessoas dizem que é "mimimi" reclamar de xingamentos como os proferidos por essa pessoa com o famoso "isso é coisa de estádio de futebol."
Sempre penso se o ideal é então usar o olho por olho, dente por dente. Que tal se Ângelo e Messias fossem ao local de trabalho desse sujeito e retribuíssem na mesma moeda? Para que ele sinta o quanto dói ouvir as piores barbaridades, engolir seco e ainda ter que chegar em casa e encontrar sua família abalada.
Eu sei, revidar é se rebaixar ao nível do agressor. É seguir a vida, denunciar para que as leis dos homens punam os agressores.
Da minha parte, por já ter passado por situações parecidas, é usar esse espaço e jamais me omitir. Se tenho essa liberdade para falar e escrever sobre como não demos certo enquanto seres humanos, eu vou seguir nesse caminho na luta contra o racismo estrutural.
Quando uso essa minha coluna, ou quando participo como comentarista do programa "Fim de Papo", e não me calo diante de atos racistas, o que mais tenho lido nos comentários é que sou um "lacrador".
Confesso, como alguém que começou no jornalismo antes da internet e, repito, também do esgoto das redes sociais e antissociais, só agora eu tenho me atentado a termos como "lacrador", que, na verdade, é uma forma de o internauta, travestido de racista, dizer que somos exagerados nas queixas e diminuir a nossa luta.
Por fim, a Ângelo e Messias, a minha solidariedade. Torço fortemente para que vocês, e tantos outros jogadores negros, sigam firmes e fortes, afinal o Santos do Rei Pelé, maior jogador de futebol de todos os tempos, que morreu há quatro meses, não merece ter a sua história manchada pela presença de um racista que frequenta a Vila Belmiro.
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