Luís Rosa

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Opinião

'Seo Pelé' faz muita falta, mas não merecia ver a tragédia do seu Santos

"Seo Pelé" completaria 75 anos neste dia 9 de dezembro.

"Seo Pelé" é meu pai, que nos deixou no dia 6 de março de 2019.

Conhecido e famoso pintor de paredes em Sertãozinho, no interior de São Paulo, "Seo Pelé" era um santista fanático.

Exceto os familiares mais próximos, pouquíssimas pessoas sabiam que o seu nome era Antônio Evaristo Rosa, mas era difícil alguém não notar rapidamente a sua paixão pelo Santos Futebol Clube.

Também pudera: com esse apelido, fica muito fácil.

Nas nossas incontáveis conversas, ele nunca contou com riqueza de detalhes como originou o apelido, que o liga ao Santos e ao Rei Pelé, que morreu no dia 29 de dezembro do ano passado.

Certa vez minha mãe e minhas tias, suas irmãs, me disseram que era pela semelhança física, mas fotos antigas do "Seo Pelé", que aliás não gostava de ser chamado de senhor, não corroboram esse tese.

Outra possibilidade, essa ainda mais duvidosa, é o que o apelido teria surgido porque meu pai, quando jogava futebol nas fazendas e usinas da região, era um ponta-direita arisco e apenas esforçado.

Entretanto, na zoeira dos amigos próximos, nem de longe, dizem, tinha talento para se tornar um jogador profissional.

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Não o vi jogar, mas sempre o admirei pelo talento em usar as tintas para embelezar casas, apartamentos, escritórios e afins. Nisso Pelé Pintor foi disparado o melhor que eu vi.

Assim como meu pai, a minha mãe, Leila Maria da Silva Rosa, também é santista. Pelo que eu me lembro, ambos nunca me forçaram a ser santista. Naquela coisa de o filho, antes de nascer, os pais contam para todos que o filho vai seguir o time da família.

Digamos que esse "descuido" teve o lado ruim: fui ver meu time campeão pela primeira vez em 1993, aos 21 anos, amarguei dois rebaixamentos (2002 e 2012), mas atualmente a fase é da multiplicação de títulos.

Vocês sabem de qual time estou falando.

Bom, o futebol uniu demais eu e meu pai. Foi com ele a minha primeira vez em um estádio de futebol, curiosamente em um Santos e Comercial, em Ribeirão Preto.

Graças a ele peguei o gosto pelo rádio. Ouvir jogos, os programas esportivos diários, os debates antes e depois das partidas.

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Mesmo com tudo isso, nunca pensei em ser jornalista esportivo, que virou motivo de orgulho para o "Pelé Pintor" nas resenhas com os seus amigos nos botecos do bairro.

Nós nunca brigamos ou tiramos o sarro um do outro por causa de futebol e da rivalidade entre as nossas camisas.

Em dezembro de 2016, eu e a minha filha, Anna Rhúbia, escolhemos uma camisa do Santos (essa da foto que ilustra essa coluna). Curioso, que meu pai poucas vezes a usava. Parecia que era um presente com valor muito alto para ser exibido por aí.

Como homenagem, fizemos questão de que ele fosse enterrado vestido com ela.

Enquanto o seu túmulo era coberto por terra, eu puxei o hino não oficial do Santos. Consegui ir até o "glorioso alvinegro praiano, campeão absoluto desse ano".

Dói demais relembrar essa cena, mas era o que tinha ser feito em um dos dias mais tristes de nossa família e amigos queridos.

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Desde 2016, ano que comprei essa camisa e do último título, os dirigentes do Santos iniciaram um processo de maltratar, com requintes de crueldade, os seus torcedores até culminar, na última quarta-feira, com o primeiro rebaixamento de sua história.

Agora é amargar a Série B do Campeonato Brasileiro.

Uma mancha terrível para o clube formador de tantos e tantos craques. Nem vou citar Pelé, pois este será sempre o maior de todos.

Ao lembrar como "Seo Pelé" ou Pelé Pintor vibrava com as vitórias e títulos, e o seu semblante de desolação nas derrotas, só posso encerrar a coluna assim.

Pai, o senhor faz muita falta, mas não merecia ver a tragédia do seu Santos.

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Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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