Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.
Jorge Jesus rabisca o passado de ídolo do Flamengo
Jorge Jesus conquistou com o Flamengo os títulos de Libertadores, Campeonato Brasileiro, Supercopa e Estadual. Mas não compreendeu o seu tamanho na história e, pior, a imensidão do clube que lhe abriu a porta de entrada para o futebol brasileiro. Saiu de um jeito meio incompreensível, e agora, mais cruel que o descaso na negociação fracassada pelo retorno é a forma como conduz o futuro. Ao conversar com o Galo, pode estar rabiscando o passado de ídolo eterno em um dos maiores clubes do mundo.
Jorge Jesus pode negociar com outro clube do Brasil? Pode, mas há uma distância do tamanho de um abismo sem fim entre seu direito de escolha e a opção ideal. É a tal história do forasteiro que, morrendo de calor, viu um rio à sua frente e perguntou ao anfitrião se podia mergulhar. "Pode sim", disse-lhe o amigo. Mergulhou como se não houvesse amanhã e acabou sofrendo um ataque de piranhas. "Por que você disse que eu podia mergulhar?", questionou, com o que lhe sobrou do corpo, em carne viva. "Uai, você pode mergulhar. Mas não deve", respondeu o anfitrião.
Jorge Jesus pode mergulhar em outras águas não rubro-negras? Pode. Mas há o risco de sofrer arranhões na imagem até então intacta, perfeita, divina. Se não percebeu isso, perdeu a chance de aproveitar o que de melhor há no Flamengo: a paixão incondicional de uma torcida fiel e gigante. Como ele não percebeu o calor desse abraço? Era para ser eterno; pelo visto, não será.
O futebol mudou, mas, em respeito à sua imagem construída por aqui, Jorge Jesus bem que poderia ser exceção. Hoje, a identificação do personagem com o clube tem prazo de validade, o ídolo não resiste a uma vida de dedicação àquele emprego - como era bonito ver Zico mais envelhecido a cada pôster de campeão do Flamengo, com as rugas brotando de fotografia em fotografia, as mais antigas sem a nitidez das lentes que registraram suas últimas imagens com a faixa no peito.
Só a torcida não muda de time. É até morrer. E eu sigo achando que o Flamengo deu mais a Jorge Jesus do que Jorge Jesus ao Flamengo. Ele ainda impôs um fracasso retumbante à diretoria do clube, que foi a Portugal buscá-lo e de lá conseguiu apenas um sotaque que se aproxima do seu. Humilhante demais.
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