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Ilsinho diz por que parou de jogar futebol: 'Mais lesão do que diversão'

Ilsinho decidiu parar de jogar futebol aos 36 anos, no Philadelphia Union - Icon Sportswire/Icon Sportswire via Getty Images
Ilsinho decidiu parar de jogar futebol aos 36 anos, no Philadelphia Union Imagem: Icon Sportswire/Icon Sportswire via Getty Images

Colunista do UOL

12/03/2022 04h00

Ilsinho parou de jogar futebol por causa das lesões. Em entrevista ao Blog, o agora ex-jogador de São Paulo, Palmeiras e Internacional apontou o condicionamento físico como principal motivo da decisão anunciada nesta semana de pendurar as chuteiras.

"Se não estivesse tão doloroso, se não doesse tanto continuar jogando, até tentava", admite. Além dos times brasileiros, Ilsinho jogou no Shakhtar Donetsk (Ucrânia) e encerrou a carreira no Philadelphia Union (Estados Unidos), clube pelo qual atuou a última vez em agosto de 2021. Aos 36 anos, a aposentadoria veio antes do que ele imaginava. "Como era mais lesão do que diversão acho que isso me obrigou a parar".

Em uma conversa de aproximadamente 30 minutos, Ilsinho mostrou gratidão por mensagens recebidas de torcedores do São Paulo, admitiu que a passagem pelo Palmeiras não terminou bem e exaltou o Shakhtar que "chocou" com o título da Liga Europa (antiga Copa Uefa) de 2009. Também relembrou o dia em que fez um gol contra o Barcelona de Xavi, Iniesta, Henry e Messi —o detalhe é que o argentino entrou durante o jogo, fez dois gols e virou a partida de Liga dos Campeões, em 2008. O que vai fazer no futuro? "É uma boa pergunta".

Leia trechos da entrevista:

Por que se aposentou?
Tomei essa decisão mais pelo lado físico. Ano passado foi bem duro para mim. Não consegui ficar em campo por 90 minutos somando o tempo em que joguei. Comecei o ano com lesão na pré-temporada, fiquei algumas semanas fora e no meu primeiro jogo do ano estourei o músculo adutor da coxa. Rompeu completamente. Fiz uma cirurgia que me tomou uns quatro meses. Depois dessa cirurgia não consegui mais voltar nem perto fisicamente do que era com várias outras lesões musculares.

E aí chega o momento em que você coloca na balança se prefere ficar bem ou tentar jogar. Se eu tentasse jogar, era todo dia com dor, toda semana no hospital fazendo ressonância magnética, infiltração, remédio, injeção, acupuntura com agulha que dá choque. Não é agradável. Não estava legal. E esse é o principal e único motivo de eu ter parado. Tenho 36 anos, tinha totais condições de jogar contra os meninos de 16 anos, 18, 20 e 22. Sem o mesmo vigor de antes, mas tecnicamente e velocidade de raciocínio não ficava para trás dos moleques. Mas como era mais lesão do que diversão acho que isso me obrigou a parar.

Dá para dizer que perdeu para o próprio corpo?
Sim, 100%. Sempre tive problema com peso, desde a base do Palmeiras. Diziam que meu peso era 77 kg e nunca chegava, ficava com 80 kg. Era mais novinho e não aparentava. No São Paulo, o fisiologista falava: "Você não pode passar dos 85 kg". Mas eu jogava no 85.8, 85.9 e cobravam. Sempre tive essa briga. Era muito difícil manter o peso. No Shakhtar, o treinador ameaçava a gente com multa salarial por peso. Essa briga que tive com meu corpo estava respondendo agora. Chegou a hora em que diz: "Não dá mais, não". O que conseguimos foi ótimo, mas está na hora de descansar. Infelizmente foi assim. Pretendia jogar mais um pouco, mas por motivos de força maior.

Pretendia jogar até quando?
Ano passado e esse. E depois ver se estaria em condição ou não, se estava ficando para trás. Falei com o treinador que [continuaria] enquanto conseguisse fazer meu trabalho que era tipo o bombeiro do time, entrava em caso de urgência e incêndio. Fazer o que era proposto em 20, 25 minutos bem feito, de mudar dinâmica do jogo, de colocar fogo, era meu objetivo. Fazer o que a maioria tem medo, arriscar. Enquanto conseguisse, ia levando. Nem que fossem dez minutos. Mas chegou a hora em que não conseguia ficar nem no treino. Tentava treinar forte e machucava. Resolvi parar. Era melhor para todos. Queria jogar mais? Se não tivesse tão doloroso, se não doesse tanto continuar jogando até tentava, mas hoje, pensando friamente o que eu passei no ano passado não dava. Acho que eu tomei a melhor decisão.

Qual foi o clube da sua carreira?
Joguei em poucos. Todo clube tem uma marca boa ou ruim. Infelizmente, a minha história no Palmeiras é marcada por um episódio ruim, mas foram oito anos lá dentro. Do jeito que saí não foi legal. Depois no São Paulo começa o "change game". Cheguei como quarto reserva, sobrou uma brecha que eu aproveitei, me tornei bicampeão brasileiro, fui para a seleção brasileira e me mostrei para o Shakhtar. Fui pelo lado financeiro e profissionalmente foi muito bom. Ganhamos a UEFA, teve uma visibilidade muito grande. Tanto que o Fernandinho foi para o Manchester City, Willian foi para o Chelsea, o Jadson voltou pro São Paulo e depois Corinthians, Luiz Adriano também depois foi para o Milan...

Depois, por estar muito tempo num lugar, tive desgaste. Achei que meu tempo lá [no Shakhtar] tinha acabado. Voltei para o Brasil e escolhi os Estados Unidos como lugar para morar. Queria dar uma qualidade melhor para minha família depois de seis anos e meio na Ucrânia. Acham que você ganha muito dinheiro aqui, mas, financeiramente, não é nem perto do Brasil. Um ou outro escolhido a dedo, sim, mas eu escolhi vir para cá pela qualidade de vida.

Passei pelo Inter, apenas uma passagem relâmpago mesmo, e aqui eu encerro. Cada time tem sua parte especial na minha carreira. Não acho que marquei história em nenhum desses times. A galera lembra e tal, mas eles foram muito importantes na minha carreira.

Consegue escolher um momento mais marcante?
Consegui atingir o sonho de todo jogador: brilhar no Brasil, ganhar títulos, ser vendido, ganhar título internacional, chegar à seleção brasileira, contratos com grandes marcas e depois deixar uma galera que goste de você. No São Paulo, grandes jogadores que passaram pela lateral e ainda lembram [de mim]. Coloquei o post [da aposentadoria] e dizem: "Você foi um dos melhores laterais que passou". Pô, os caras tiveram Cafu, Vitor, Cicinho... e gostam de mim. Tenho moral, então! O clube [Philadelphia] vai fazer uma homenagem, é legal saber que tem uma galera que gosta de você. Dá um orgulho, sabe? É para falar: "P***, eu tentei o máximo! Errei? Errei! Teve escolhas erradas? Muitas! Mas acho que acertei mais do que errei e saio com a sensação de dever cumprido.

O que faltou fazer?
Um gol de bicicleta (risos). Acho que joguei contra os melhores times da época: Milan de 2007, Barcelona de 2008, que perdemos na fase de grupos da Champions. Na minha opinião, um dos melhores ou o melhor Barcelona. Era o Daniel [Alves], Piquet, Rafa Marques, Puyol, Xavi, Iniesta... acho que jogou Yaya Touré, Ibrahimovic, Eto'o e Henry. Depois veio o Messi no segundo tempo. Se esse time não for um dos melhores da história, não sei qual é. Fiz um gol ainda. Tava 1 a 0 com gol meu contra os feras [nota da redação: o jogo terminou 2 a 1 para o Barcelona com dois gols de Messi].

Fomos campeões da UEFA. Na final contra o Werder Bremen, os cara, olhavam para baixo, sentia até um desmerecimento. Eu gordinho, o Jadson menor que eu, os moleques da mesma estatura, e ganhamos. Nosso time "chocou" a Europa, um time ucraniano aparentemente só de moleque. É difícil, se você parar pensar hoje, para um time fazer o que a gente fez. Acho que só CSKA do Wagner Love do leste europeu que conseguiu esse feito.

O que você pretende fazer agora?
Boa pergunta. Tentando algo nesse mundo dos e-sports. Não queria mexer com futebol, mas a visão aqui, nos Estados Unidos, do futebol é diferente daí do Brasil. O soccer é para os ricos, os caras pagam muito dinheiro para fazer parte do Philadelphia Union Academy. Eles priorizam o investimento na criança do esporte porque pode dar uma faculdade. Então os pais que têm condição pagam uma mensalidade para o filho fazer um esporte. Pretendo ficar aqui e vou começar com uma clínica do Ilsinho futsal. Aqui onde moro, os campos ficam inacessíveis no inverno, então, no futsal dá para trabalhar no verão, inverno e ter uma sequência.