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Liga dos Campeões - 2021/2022

REPORTAGEM

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Sávio vê Benzema melhor do mundo e 'evolução absurda' de Vinicius Junior

Sávio tem três taças da Liga dos Campeões pelo Real Madrid (1997/98, 1999/00 e 2001/02) - Matthew Ashton/EMPICS via Getty Images
Sávio tem três taças da Liga dos Campeões pelo Real Madrid (1997/98, 1999/00 e 2001/02) Imagem: Matthew Ashton/EMPICS via Getty Images

Enviado especial a Paris, França

26/05/2022 04h00

Duas finais de Liga do Campeões no Stade de France, duas vitórias e dois títulos. O Real Madrid tem 100% de aproveitamento no principal estádio de Paris, que volta a receber os merengues, sábado (28), agora na edição de 2021/22, contra o Liverpool.

O time espanhol foi campeão pela primeira vez em 1955/56, ao bater o Reims por 4 a 3, e repetindo o feito no mesmo local na edição de 1999/20, ganhando por 3 a 0 do Valencia, num jogo em que Sávio saiu do banco de reservas no segundo tempo e fechou o triunfo com uma assistência para Raúl.

Com três taças europeias no currículo (1997/98, 1999/00 e 2001/02), o ex-atacante brasileiro conhece o clube espanhol como poucos. Foram cinco temporadas no Santiago Bernabéu e uma identificação cultivada até os dias hoje, especialmente porque os filhos são torcedores madridistas.

Em entrevista ao UOL Esporte, Sávio, que atualmente trabalha como empresário no ramo do futebol, recordou em detalhes a decisão de 2000, quando o Real entrou em campo sem o favoritismo de sempre. Analisou também o momento dos jovens compatriotas Rodrygo e Vinicius Junior e rasgou elogios ao francês Karim Benzema, que desponta como o melhor jogador do mundo na temporada.

UOL Esporte: Com tantas remontadas e emoções, uma eventual campanha vitoriosa do Real Madrid na Liga dos Campeões de 2021/22 é digna de algum tipo de filme ou documentário especial?

Sávio: (Risos) Curioso. Eu até comentei recentemente com meus filhos, um principalmente que é torcedor do Real, apaixonado mesmo. Eu falei: "olha, se o Real Madrid ganhar essa competição, realmente vai ter que fazer um filme". Eu falei justamente isso, porque... Tudo bem que isso está baseado um pouco na história do Real Madrid, principalmente em Ligas dos Campeões, de momentos inacreditáveis, que o time vira e consegue o título. Só que esse ano foi um pouco atípico, né? Até pela situação que foi, pelas três eliminatórias incríveis (PSG, Chelsea e Manchester City). Filme ou documentário? Com certeza, porque seria, caso conquiste o título, algo de remontada, de superações incríveis.

UOL Esporte: Todo documentário ou pelo menos quase todos filmes têm um personagem principal. Consegue destacar alguém ou algo que faça com que esse Real Madrid de 2021/22 seja tão histórico?

Sávio: Eu acho que é difícil a gente colocar um ponto só, né? A gente está falando de um time muito cascudo, um time que se acostumou a grandes conquistas, principalmente na Liga dos Campeões. Um time individualmente muito forte, e taticamente também. O que o Ancelotti fez... Ele recuperou o sistema do time. Mas, individualmente, a gente está falando de muitos bons jogadores. A gente fala muito das temporadas do Benzema, agora no Vinicius Junior, ambos realmente fazem uma temporada espetacular. Aí também aparece o Rodrygo. A gente está falando de jogadores que, há muito tempo, estão dentro do clube, um meio-campo tradicional, que tem Modric, Kroos, Casemiro, enfim... São muitos destaques. Mas eu vou destacar um ponto principal também nessa temporada: o Santiago Bernabéu. Eu acho que foi o ponto forte, foi o ponto. Praticamente todo mundo via algo perdido, mas o Santiago Bernabéu não, e ajudou, incentivou, pegou o time pelos ombros. O Santiago Bernabéu abraçou muito esse time e fez com que os jogadores também acreditassem.

UOL Esporte: O caminho do ônibus no meio da torcida do Real, a entrada no Santiago Bernabéu, o aquecimento com o estádio lotado... É impossível um jogador não ficar mexido com tudo isso, não?

Sávio: É preciso ter um equilíbrio muito grande, para que isso também não te leve a uma ansiedade exagerada, um nervosismo, né? Esse time, o Real Madrid, tradicionalmente, tem uma conexão muito forte com o Santiago Bernabéu e com sua torcida. Então, é aquele momento em que os jogadores no ônibus olham para fora e falam assim: "meu deus! A gente pode até perder, mas a gente vai perder morrendo, lutando até o final". Eu acho que essa é sempre a mensagem que a torcida passa, e os jogadores absorveram muito esse ano. Quer dizer: "gente, olha quanta gente está do nosso lado, olha quanta gente se emociona". Eu acho que essa conexão é muito forte, e eu falo sempre que é um conjunto de fatores, né? A gente está falando de um treinador muito experiente (Carlo Ancelotti, de 62 anos), que está fazendo uma grande temporada. Individualidades que estão muito bem. O Benzema, por exemplo... Muita gente fala do Benzema desta temporada, mas o Benzema faz temporadas regulares há dez anos. Então, pelo amor de Deus, se não der o prêmio de melhor do mundo para ele neste ano, eu não sei para quem vai ser...

UOL Esporte: O Vinicius Junior tem chance de "incomodar" o Benzema na briga pelo posto de melhor do mundo?

Sávio: Para este ano? Olha, eu fico muito contente também pelo que o Vinicius está fazendo. Aqueles momentos das primeiras temporadas, de adaptação, de dificuldades... Poxa, um menino que você vê que trabalha, trabalha, trabalha... A temporada está sendo magnífica. O Rodrygo também. Muito legal. É incrível o que o Vinicius está fazendo na Liga dos Campeões e o que fez no Campeonato Espanhol também. Agora, neste ano... Na verdade, não só neste ano, né? Mas o Benzema já merecia ser o melhor jogador do mundo, e o que ele tem feito nesta temporada é um absurdo. É mesmo um absurdo. É o melhor do mundo hoje, eu não tenho dúvida. Eu sou suspeito, porque... Não existe perfeição, mas é um jogador quase perfeito dentro de campo. O que ele faz, o que ele vê, como ele enxerga o futebol.

UOL Esporte: Tudo o que envolve o Real Madrid ainda te surpreende?

Sávio: Eu acho que quando você tem três eliminatórias consecutivas, da maneira que foram, surpreende, né? É fato. Mesmo o Real Madrid. Mas, ao mesmo tempo, no fundo, no fundo, você sabe que pode acontecer algo. Até pela minha história no clube, pelo que eu vivi lá e pelo que eu conheço, a história do Real Madrid, muitas vezes, ela foi feita de muitos desafios, superações e conquistas. É claro que o futebol sempre surpreende. E, neste ano, surpreendeu. Principalmente da maneira que foi. Mas, no fundo, você fala assim: "caramba, isso é o DNA do Real Madrid!". "Minuto 90, está perdendo", mas não acabou o jogo. Para esse time, para esse clube, para essa torcida, o jogo realmente só termina quando o juiz apita. É surpreendente, mas é algo que pode acontecer.

UOL Esporte: Você tem três títulos da Liga dos Campeões pelo Real Madrid, sendo um deles conquistado em Paris, em 1999/20, contra o Valencia. A decisão deste ano, agora diante do Liverpool, no mesmo Stade de France, te faz lembrar aquela conquista? Há semelhanças?

Sávio: Olha, não é uma comparação, mas aquela foi uma competição difícil. Se eu não me engano, a gente ficou em quarto ou quinto no Campeonato Espanhol naquela temporada (quinto colocado, com sete pontos de diferença para o campeão Deportivo La Coruña). A gente colocou todas as fichas na Liga dos Campeões. Eu lembro que, nas quartas, nós empatamos em 0 a 0, no Santiago Bernabéu, com o Manchester United. Um time bom do Manchester United, que era o atual campeão da Europa. A gente foi para Old Trafford com esse resultado, e era muito difícil. Fizemos 0 a 3 - no final o United fez dois gols, terminou 2 a 3, e a gente se classificou. Disputamos também a semifinal contra um timaço do Bayern de Munique. Nós ganhamos em casa e perdemos em Munique por 2 a 1. Também foi muito difícil. E, na final, por incrível que pareça... O Valencia tinha um time muito forte. Nós não entramos na final, em Paris, como favoritos. Era mesmo o Valencia. E fizemos um 3 a 0 contundente. Foi uma partida praticamente perfeita.

UOL Esporte: Aquele Real Madrid, com Casillas, Roberto Carlos, Fernando Redondo, Raúl, Anelka, não era o favorito contra o Valencia?

Sávio: Nós tínhamos noção de que o time do Valencia era muito forte. E o Valencia tinha feito uma campanha muito forte, muito boa (eliminou Barcelona, Lazio e Manchester United). Era um jogo muito difícil. Só que nós fizemos um jogo praticamente perfeito na decisão. A gente não deu chances para o Valencia. Claro que tem a qualidade do elenco, dos jogadores, mas aí vem a questão do que é a final da Liga dos Campeões para o Real Madrid: a camisa, a torcida, a mística. É um pouco de tudo. Essa competição, de 1999/00 foi, das três que eu conquistei - aqueles cinco anos de três conquistas - essa foi a de maior dificuldade. Foi realmente uma superação ali.

UOL Esporte: Real Madrid ou Liverpool: quem é o favorito agora na decisão de 2021/22, novamente em Paris?

Sávio: São dois grandes times. Uma final, jogo único, então tudo pode acontecer. É aquele jogo em que a margem de erro que você dá para o adversário precisa ser zero, ou quase zero, sabe? Você não pode errar. E, principalmente, quando os dois times têm muita qualidade individualmente falando. São dois grandes times, jogadores que podem decidir, dos dois lados. São duas camisas pesadíssimas do futebol europeu, do futebol mundial. Eu não sei. A pessoa que botar "o Real Madrid é favorito, o Liverpool é favorito"... Eu não consigo concordar com essa tese, porque é uma final em que tudo pode acontecer. Eu espero que seja, diante do que a gente tem, dos dois grandes times, uma grande final.

UOL Esporte: Serão cinco os brasileiros à disposição do Real Madrid na decisão: Éder Militão, Marcelo, Casemiro, Vinicius Junior e Rodrygo. É um recorde. Como explicar a relação entre jogadores de origem brasileira e o clube espanhol?

Sávio: É uma conexão muito forte, Real Madrid e Brasil. É um clube que, tradicionalmente, tem muitos jogadores brasileiros. Desde as décadas passadas, muitos que fizeram sucesso. Eu não sei, é uma conexão bacana, é uma ligação que a torcida, o Santiago Bernabéu, gosta, sempre gostou. É muito legal. É uma mescla ali de um clube muito grande, de um clube de uma mística enorme, com essa alegria brasileira, do futebol brasileiro, do improviso. Eu falo um pouco por mim também. Foi uma conexão muito bacana com o Santiago Bernabéu. Eu, desde o começo, sabia que seria difícil conquistar a torcida. Mas, desde o começo, eu conquistei. E o mais importante: a qualidade técnica é fundamental. O torcedor e o clube gostam dessa conexão. Eu fico muito feliz. Como você falou, são cinco brasileiros disponíveis para esta final, e é algo muito legal. Eu espero que isso siga sempre na história do clube.

UOL Esporte: Considera que o Vinicius Junior, apesar do longo percurso que tem pela frente, já atingiu o posto de "jogador completo"?

Sávio: Olha, me perguntavam, há um tempo, e eu falava da questão da paciência, né? Jogador que chega com 18 anos em um clube tão grande como o Real Madrid... Tem que ter paciência, tem que trabalhar, tem que aperfeiçoar. Ele praticamente pulou uma etapa importante, que é o sub-17. Ele foi direto, praticamente, para o profissional. Então, ele pula aquela barreira do sub-20. O que a gente vê hoje é uma evolução absurda, muito grande. E cabe sempre melhorar. Eu acho que, para ele, individualmente, ele sabe que ele ainda pode melhorar, pode evoluir, pode se aperfeiçoar dentro de campo. É um jogador em quem a gente vê, como eu falei, uma evolução muito grande. Em relação a dribles, ele já é, desde a categoria de base do Flamengo, um driblador, com o um contra um muito forte. Uma velocidade, uma arrancada. E a gente via, no começo, aquela dificuldade de terminar a jogada, na finalização, de concluir a gol. Ele aperfeiçoou esses fundamentos. Eu não vou falar que é completo, perfeito, enfim.... Mas é um jogador que está demonstrando, realmente, um poder técnico enorme, e eu acredito que ele ainda vai evoluir muito mais daqui para frente, com a maturidade, com a experiência, com a rodagem que é jogar no Real Madrid.

UOL Esporte: Vinicius Junior e Rodrygo, ambos com 21 anos, são uma dupla para mais uma década de sucesso no Real Madrid?

Sávio: É uma dupla de muita projeção ainda, né? É uma dupla muito jovem, jovens que evoluíram muito rapidamente. Eu acho que pode ser, eles têm possibilidades para isso. É claro que, no futebol, é difícil a gente fazer uma análise muito mais ampla de cinco, oito, dez anos, por exemplo... Se continuarem trabalhando assim, se continuarem tendo esse respaldo da torcida, do clube, é uma dupla que ainda pode evoluir mais e dar muitas alegrias para o clube e para a torcida, juntamente com outros grandes jogadores que podem chegar, ajudar e somar.