Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.
A CBF não pode ignorar a tragédia inscrita na marca de 500 mil mortes
Receba os novos posts desta coluna no seu e-mail
Não há como CBF e seleção ignorarem a marca de 500 mil mortes por Covid no Brasil. Isso não quer dizer que nosso futebol se manifestará. Mas quer dizer, em volume muito alto, que se a CBF optar por silenciar dará um passo enorme - mais um - rumo à desconexão com a população, fazendo uma aliança ainda mais sólida com a imoralidade, a indecência, a conivência.
Já não se torce mais pela seleção brasileira, e isso deveria ser considerado um problema. Quem assiste aos jogos, o faz com certa frieza. O sonho do torcedor e da torcedora envolvendo a seleção é o de que ela não convoque seus craques. A camisa amarela, bem, essa deixou de pesar faz um tempo. A seleção milionária vai sumindo do imaginário popular, chafurdando em lama moral, uma goleada por vez.
Mas a vida, soberana, renova nossas chances de reparar erros passados, de repensar rumos, de corrigir rotas. Então, se a CBF escolher se manifestar formalmente a respeito das vidas desnecessariamente perdidas de 500 mil brasileiros e brasileiras - homenagens que precisam ir além do um minuto de silêncio que abre os jogos do Brasileirão e da Copa do Brasil - poderá recuperar um mínimo do prestígio que perdeu.
Existem muitas formas de se manifestar. Colocar uma faixa de luto no braço de cada jogador - uma atitude que clubes poderiam fazer -, pensar em uma campanha de conscientização, usar espaços publicitários para homenagear o SUS... são amplas as possibilidades.
Vejam: não estou sequer sugerindo que a CBF tenha a dignidade de se posicionar contra a catastrófica e desumana administração de Jair Bolsonaro. Seria correto, enorme, histórico.
Mas sabemos que a CBF não é feita desse tipo de coragem, ou sequer desse tipo de desalinhamento ideológico. O que estou dizendo é que, quando o país atinge a triste marca de meio milhão de mortos por uma doença para a qual existe vacina, seria no mínimo íntegro que a associação que rege uma das maiores instituições brasileiras - o futebol - demonstrasse algum tipo de empatia e de compaixão para deixar, assim, um fio, uma miga, de esperança para a possibilidade de não se tratar de uma associação interessada apenas em dinheiro e em poder. Mas também em pessoas e no futebol que essas pessoas amam.
Sabemos perfeitamente que pensar assim é ingenuidade e inocência, mas em tempos de guerra como esses, quando tudo é cinismo e destruição, precisamos nos agarrar até em ilusões fabricadas.
Silenciar diante de 500 mil corpos é, mais uma vez, se acovardar. É renovar o pacto macabro com a delinquência moral que nos inunda. É debochar da cara das 500 mil famílias que hoje choram a morte de quem não precisaria ter morrido se o Presidente da República tivesse agido para interromper a circulação do vírus - e não para espalhá-lo.
Não se trata aqui de especular sobre o tema; estamos falando de fatos, de dados, de pesquisa. Quase 400 mil vidas, entre as 500 mil que foram perdidas, teriam sido salvas se o governo federal tivesse atuado para controlar, para isolar, e para vacinar enquanto havia tempo.
Calar frente ao absurdo que é estarmos sendo exterminados por políticas públicas que nos submetem - alguns mais do que outros - ao vírus, à fome e à bala é seguir sendo conivente com o genocídio.
Se for esse o caso - e eu apostaria que vai ser - deveríamos nos perguntar: por quem e para quem joga a seleção brasileira de futebol masculino? Para a população brasileira é que não é.
Vamos lá, CBF. Hora de escolher se seguirá de braços dados com o fascismo ou se existe pelo menos um farelo de dignidade entre seus membros.
ID: {{comments.info.id}}
URL: {{comments.info.url}}
Ocorreu um erro ao carregar os comentários.
Por favor, tente novamente mais tarde.
{{comments.total}} Comentário
{{comments.total}} Comentários
Seja o primeiro a comentar
Essa discussão está encerrada
Não é possivel enviar novos comentários.
Essa área é exclusiva para você, assinante, ler e comentar.
Só assinantes do UOL podem comentar
Ainda não é assinante? Assine já.
Se você já é assinante do UOL, faça seu login.
O autor da mensagem, e não o UOL, é o responsável pelo comentário. Reserve um tempo para ler as Regras de Uso para comentários.