Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.
Milly: O Vasco não tem preço
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Quanto vale o Vasco? Quanto vale seu time? Por que aceitamos tão alegremente que magnatas do mercado financeiro saiam precificando e adquirindo nossas paixões?
"Porque os clubes estão falidos", dizem as sempre sensatas e aplaudidas vozes liberais. Verdade. Boa parte deles está em apuros. Mas, diante dessa realidade, a saída é vendê-los a magnatas? A solução é concentrar ainda mais poder, misturar de forma grotesca o futebol a tudo o que representa o mercado financeiro? Não podemos ser mais criativos e menos simplistas?
Vejamos a chamada 777 Partners, o conglomerado financeiro que quer comprar 70% do Vasco.
O acordo, segundo a Bloomberg, avalia que o preço do Vasco em 330 milhões (de dólares, imagino), incluídas aí as dívidas. Vão vender o Vasco "na baixa", como diz o jargão - mas sobre isso não se fala.
Segundo o mesmo texto: "777 está apostando que um novo gerenciamento e entrada nova de dinheiro podem fazer o clube ser lucrativo novamente". Mas, em nome de tudo o que há de mais digno na vida, o que faz alguém pensar que um clube de futebol precisa dar lucro? Como é possível que não nos descabelemos diante de uma colocação como essa, jogada à mesa de forma naturalíssima, como se nada fosse.
A 777 Partners está baseada em Miami - "of all places", como dizem na gringa. Fundada em 2015, resultado da fusão de duas outras empresas, a 777 "originalmente estava focada num amplo escopo de serviços financeiros e de tecnologias e agora investe em seis linhas de negócios e avalia oportunidades em empresas que possam crescer".
A 777 tem experiência no setor da aviação, de mídia e, no esporte, do basquete. O interesse agora é investir em empresas que estejam sendo ineficientemente gerenciadas. "Nós também buscamos oportunidades na estrutura do capital onde o valor é assimétrico ao detectado perfil de risco". Tá tudo no site da 777.
É a essa linguagem, a esses valores, a essa ganância que queremos associar o futebol? Em nome do que? De reduzir o esporte que amamos à economia? É isso o que é o futebol? Apenas mais um aspecto economico de nossas vidas?
Sim, os clubes estão na maior pindaíba. Sim, alguma coisa precisamos fazer. Mas por que a solução não pode passar por menos concentração de poder em vez de por mais concentração de poder? Por que a solução não pode ser socializar em vez de privatizar? Por que aceitamos tão acomodadamente que gringos venham aqui e transformem nosso futebol em mais um braço do sistema financeiro e em nada além disso?
No dia 20, o Vasco, essa instituição gigantesca, sempre alinhada a causas sociais, prestou homenagem a Moise Kabagambe, o congolês linchado até a morte na beira da praia da Barra da Tijuca. Em texto, celebrou imigrantes e refugiados, associando-se à história dessa mistura cultural que, afinal, deu vida ao clube. Em pouco tempo, ações como essa só serão efetuadas se "derem lucro". Mas, como sabemos, não dá muito lucro se alinhar a causas sociais nem a minorias políticas. Não dá lucro jogar luz em linchamentos. Essas coisas podem dar grandeza e dignidade; podem causar empatia e fazer circular afetos. Mas lucro, lucro mesmo, não dão.
Até aqui, são estadunidenses que estão comprando nossos times. Como sabemos, eles não apenas amam o futebol, que chamam de soccer, como entendem deveras dessa instituição. Como diz uma amiga, a cada dia mais, o campo não é de grama, é de casca de banana.
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