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Milly Lacombe

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Pedro Guimarães representa a família ficcional brasileira

Presidente Jair Bolsonaro ao lado do presidente da Caixa, Pedro Guimarães - Isac Nóbrega/PR
Presidente Jair Bolsonaro ao lado do presidente da Caixa, Pedro Guimarães Imagem: Isac Nóbrega/PR

Colunista do UOL

04/07/2022 15h40

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Pedro Guimarães representa uma importante pauta identitária no Brasil. Uma que se pretende universal e que, não por acaso, é a mesma defendida por seu grande amigo Jair Bolsonaro: a do homem branco cisgenero heterossexual e que acredita que ser homem de verdade é celebrar essa identidade e suas violências acima de tudo e de todos.

É essa a identidade que eles julgam superior às demais - e a ela as outras devem ser comparadas sabendo-se menores.

Ser mulher é menos, ser LGBTQ é menos, ser negro é menos.

Esse é o homem chefe da família tradicional brasileira. A família que eles exigem que seja respeitada, que eles comandam e que é um núcleo reprodutor de hierarquias.

Existem milhares de Pedros por aí dando as cartas desse jogo no qual tudo o que não parece eles pode ser triturado, abusado, assediado, excluído, eliminado.

Passou da hora de expor a podridão ética desse sujeito que está em cargos de poder, nas empresas, nas corporações, nas instituições. É um tipo de homem, e ele manda no Brasil e no mundo.

Esse homem que tudo pode tem uma mulher submissa para chamar de sua e, juntos, eles são uma usina produtora de heterossexualidade.

Qualquer filho que escape a isso pode perfeitamente morrer - afinal, melhor filho morto do que filho gay como disse Bolsonaro antes de ser eleito.

Esse homem é rigorosa e publicamente contra o aborto até engravidar alguém fora do casamento, momento em que passa a ser secreta e fervorosamente a favor do aborto.

Essa é a família que eles querem defender como a tradicional.

Uma família em que papai é o rei da casa e, no trabalho, pode assediar e abusar de seus subordinados e subordinadas.

Uma família que prega a monogamia em nome de Deus e que fecha os olhos para o que papai faz na rua.

Para esse homem, as relações amorosas sempre foram secretamente abertas.

Já a mulher deles, se usar os mesmos princípios, pode acabar morta.

Foi em nome dessa família que se votou pelo golpe em Dilma Rousseff.

O voto era, portanto, contra qualquer outro arranjo familiar.

O voto era em nome dessa família ficcional, uma que só existe nos sermões de domingo realizados dentro das igrejas que essa ideia de homem frequenta.

Depois que os relatos de assédios sexual e moral começaram a aparecer, Pedro Guimarães teve o descaramento de expor sua mulher a um espetáculo público de dilaceramento ao aparecer ao lado dela dizendo ser um homem pautado pela ética.

Talvez Guimarães acredite mesmo que ética seja isso: chefiar uma família ficcional e, no trabalho, transformar assédio em modelo de gestão, como escreveu a jornalista da Globonews, Andreia Sadi, em seu blog.

Pedro Guimarães representa com fidelidade essa ideia de um homem que está vendo o mundo mudar e não aceita que haja outras formas de vida e de família.

Quer a todo o custo se impor pela força e vai cair berrando e esperneando porque não haverá futuro se essa ideia de homem tão bem representada por Guimarães e Bolsonaro seguir no poder.

Então, se quisermos continuar vivendo, teremos que esvaziá-los de poder e expor cada um deles pelo que realmente são: pessoas violentas, apequenadas em seus castelos, apavoradas com a ideia de que haja um mundo sem eles.

Covardes e minúsculos, uma gente que acredita que o ódio é material válido para constituir família.

Família é tudo menos o que esses homens representam.

Família é um circuito de acolhimento, compartilhamento, amor e construção. Não é bom o tempo todo, é cheio de conflitos e disputas, mas sempre tendo como base uma tapeçaria tecida por amor e respeito.

O que esses homens brutos e vulgares chamam de família é, além de ficção, uma usina de opressão.

A família que eles representam e da qual falam com orgulho simplesmente não existe para além da fotografia de Natal.