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Milly Lacombe

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

O comportamento de Neymar prova por que precisamos formar homens

Pênalti sofrido por Neymar em amistoso do PSG gera debate sobre fama de cai-cai do brasileiro - Reprodução/Twitter
Pênalti sofrido por Neymar em amistoso do PSG gera debate sobre fama de cai-cai do brasileiro Imagem: Reprodução/Twitter

Colunista do UOL

26/07/2022 15h49

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Neymar foi flagrado teatralizando um pênalti em jogo da pré-temporada do PSG. Ele foi tocado antes de desabar? Talvez. Não há como, vendo as imagens, dizer categoricamente que não tenha sido tocado. Mas o teatro da queda, a simulação da dor e os rolamentos no gramado dão a certeza de que, mesmo que tenha sido tocado, o que se seguiu foi um espetáculo miseravelmente triste.

Neymar é um dos cinco jogadores no mundo que não precisaria de modo algum fingir que sofreu uma falta. Ele as sofre de fato. E precisaria menos ainda cair ao chão como quem está em sofrimento extremo quando, se muito, tomou um toco.

Quem ganha com essa cena tosca? Reclamamos tanto da qualidade da arbitragem, mas falhamos em apontar um dedinho para esse tipo de teatralização.

A dramaturgia infantil visa chamar o cartão para o adversário? É legítimo fazer esse tipo de encenação? Precisamos jogar o futebol nessa vala de indecência humana?

Abel Ferreira recentemente disse que somos ruins em formar homens. Não sabemos mesmo. Embora ele falasse apenas a respeito da classe "jogador de futebol", a verdade é que somos uma sociedade absolutamente fracassada na formação do sexo masculino.

Homens de todos os tipos são construídos embebidos no suco da masculinidade tóxica.

Incentivados a não amadurecerem. Incentivados a serem espertos. Incentivados a não levarem desaforo pra casa. A ludibriar, ter vantagem, sair por cima, ficar com a última palavra, ganhar sempre, perder jamais.

Vencer a qualquer custo, não olhar para os lados, passar por cima se preciso for, não se mostrar vulnerável.

Gerações inteiras de homens-moleques. Eterno gamer de um jogo vazio e sem objetivo.

Uma espécie de ser humano que celebra a própria heterossexualidade como troféu, mas que só sabe elogiar os parças.

Andam com homens, confraternizam com homens, veneram homens. Até os que se dizem aliados na luta feminista agem assim.

No público, criticam o machismo; no privado comunicam-se docemente com gente condenada por violência sexual.

Não pega nada escrotizar mulher nesse mundo. O importante é eu me manter bem aqui com meu chapa. O cara é fera. É famoso. É uma boa eu me dar bem com ele. Vou deixar a comentarista no vácuo porque se me posicionar vou enfurecer meu parça.

Quero que ele goste de mim. Já ela, tanto faz. De mulher quero só sexo e silêncio.

Meus amigos, esses não; esses quero que falem. Eu quero ouvir o que vocês têm a dizer. Me fala como conseguiu aí esse bíceps. Tá malhando muito? Tu é fera demais, mano.

O pacto macabro da masculinidade é a grande masturbação coletiva responsável pela má formação dos homens.

Abel está certo. Falhamos nesse negócio de formar homens.

É uma pena que o treinador tenha proposto o tema e, ao ser criticado, deixado pra lá para, como ele argumentou, não ser sugado para assuntos políticos.

Mas tudo sobre a precária formação de nossos homens é político.

Só precisamos alargar para "todos os homens". Ricos, pobres, brancos, negros, gays, héteros. Jogadores, empresários, advogados, motoristas, jornalistas, escritores, médicos, vendedores.

A boa notícia é que é possível desprogramar esse negócio de masculinidade tóxica.

Muitos homens estão nessa aventura. Muitos estão na batalha para se deseducar de padrões limitantes. Muitos estão lendo mulheres, escutando mulheres, estudando mulheres, citando mulheres.

E muitos estão sendo bem sucedidos na tarefa. Para sorte de todos os envolvidos.