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Milly Lacombe

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Seleção feminina conquista a América ignorando nossa cultura futebolística

Colunista do UOL

31/07/2022 10h04

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A seleção brasileira impôs seu jogo contra as colombianas na final da Copa América disputada na casa das rivais. O placar magro talvez esconda o tamanho da superioridade brasileira, que manteve a bola nos pés e, quando precisou se defender, foi bastante sólida.

O Brasil de Pia Sundhage é uma seleção formada aos moldes do futebol do hemisfério norte: blocado, defensivo, conservador, baseado em fundamentos muito bem treinados. Não tem muita ginga, nem drible, nem improviso. Tudo pensado dentro de caixinhas que pretendem controlar o jogo na medida do possível.

O Brasil passa pela Copa América sem levar um gol sequer. É um dado significativo e eloquente.

Quem não viu os jogos e se informou apenas dos placares aplicados pelo Brasil até a final pode acreditar que se trata de um time que tem na força ofensiva seu maior trunfo; mas não é bem assim que a banda de Pia toca.

Acho o trabalho de Pia memorável no que diz respeito à seriedade, entrega, dedicação e disciplina.

Acho que o Brasil feminino nunca respeitou esses princípios e não tenho dúvida que Pia e sua comissão nos elevam a uma categoria de deferência nunca antes vista. Mas precisamos de mais.

O Brasil não pode apenas imitar esquemas táticos e estratégias baseados no pragmatismo do futebol praticado na gringa porque somos a matriz mundial do futebol-arte.

O espaço do futebol feminino, que briga por público, patrocínio e audiência, teria na criatividade, na inventividade e na engenhosidade sua maior vantagem competitiva. Ignorar isso é ignorar muita coisa.

Insisto na ideia de que o futebol feminino não pode ser comparado ao masculino a não ser para fins de investimento, premiação e promoção.

Tudo o que diz respeito ao jogo no campo não tem paralelos de desenvolvimento porque estamos falando de um esporte que foi proibido para mulheres até "ontem" no Brasil.

Compará-lo a quem joga, pratica e se organiza há mais de 100 anos é insensato.

Compará-lo a homens que, ao nascer, são encorajados a jogar enquanto somos a todo instante desencorajadas e ridicularizadas, é injusto.

O futebol feminino deve ser comparado ao que ele era há uma, duas décadas; ao que ele era há cinco anos.

Mesmo sem incentivo, mesmo jogado nas valas do preconceito e da exclusão, mesmo sem base para formação de jogadoras, nós existimos e brilhamos.

Pia fez o mais difícil, que era imprimir seriedade e respeito ao trabalho da CBF em relação ao futebol feminino.

Agora precisamos colocar nossa cultura em jogo: a alegria, a ginga, o drible, a criatividade.

Essas, infelizmente, apareceram muito pouco durante a Copa América disputada na Colombia.