Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.
A trágica dança de Neymar e o debate da degradação
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Neymar Jr. fez três vídeos de apoio a Jair Bolsonaro. Os dois primeiros não declaravam voto, mas o terceiro sim.
Fica parecendo, como disse Walter Casagrande, que os dois primeiros não foram satisfatórios para os desejos de Neymar pai e do atual presidente.
Seria preciso um terceiro para sacramentar o voto.
Deixar tudo muito claro porque todos os dias aparece uma celebridade apoiando Lula. Bolsonaro foi atrás da dele.
Neymar Jr. fez então um derradeiro vídeo bastante explícito. Escolheu uma estética que combina com ele: um gamer dançando sentado o funk de Bolsonaro com cara de menino safado.
A vida é uma farra. Apertem 22 aí e segue o jogo. Vem, hexa.
A vida não é exatamente uma farra nesse Brasil que Bolsonaro destruiu.
São 33 milhões de famintos e 125 milhões de pessoas que não sabem quando farão a próxima refeição.
Apoiar Bolsonaro não é leve como uma dancinha marota.
Apoiar Bolsonaro é apoiar tudo o que ele representa: o genocídio, o fascismo, a pulsão de morte, a destruição de nossas florestas, o racismo, o machismo, a misoginia, a LGBTfobia, a adoração a tortura e torturadores, o elogio ao estupro.
Apoiar Bolsonaro a essa altura da devastação é compactuar com esse horror.
E ainda que Neymar estivesse disposto a fingir que nada disso aconteceu, bastaria saber do completo dilaceramento que o governo de Bolsonaro e de Guedes impôs ao esporte no Brasil para se colocar radical e sonoramente contra ele.
Recomendo as colunas do repórter Demétrio Vecchioli no UOL esporte para entender o tamanho do prejuízo ao esporte em todas as suas dimensões. E recomendo esse fio aqui para o Twitter:
Nenhuma taça apagará o que fez Neymar. Não tem hexa que corrija a indecência abjeta da dancinha em apoio a Bolsonaro.
Mas há maneiras e maneiras de apoiar Bolsonaro.
Uma é com o voto declarado e escancarado. A outra é arquitetando um debate com o formato do que vimos na Globo ontem.
Permitir que um candidato fantasiado de padre, que entrou no debate para enaltecer Bolsonaro, faça dueto com o atual mandatário é uma forma de legitimá-lo.
Não desmentir suas mentiras na hora e ao vivo, com dados e fatos, e deixar que os candidatos se digladiem numa arena de lama moral é legitimar Bolsonaro.
Permitir que Bolsonaro minta livremente sem que o mediador interfira e contando apenas com a réplica do oponente, num jogo de "uma palavra contra a outra", é legitimar Bolsonaro.
Havia no debate de ontem seis candidatos que atuam no campo democrático e um que arquiteta um golpe. Se o aprendiz de ditador não é confrontado no ato e à luz da verdade, o jogo que está sendo jogado é o dele.
O debate e a dança de Neymar são registros históricos da nossa degradação.
Apoiar alguém que atua dentro da arena fascista é tão grave quanto não confrontar institucionalmente a pessoa que atua dentro da arena fascista.
Era mais do que necessário que o formato do debate fosse alterado e incorporasse tecnologias atuais que servem para checar dados.
Se as outras emissoras não têm como fazer isso, a Globo certamente tem.
Seguir nesse formato conservador, decadente e rígido só serve ao circo, ao apodrecimento e a Jair Bolsonaro.
Globo e Neymar prestaram um enorme e irreparável desserviço ao Brasil.
Não importa quem ganhou esse debate macabro. Importa quem perdeu. Todas e todos nós.
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