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Milly Lacombe

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

O primeiro dia do resto de nossas vidas

A advogada Erica Meireles, que vai viajar a Brasília para ver a posse de Lula - Arquivo pessoal
A advogada Erica Meireles, que vai viajar a Brasília para ver a posse de Lula Imagem: Arquivo pessoal

Colunista do UOL

31/12/2022 15h09

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A imagem do avião levando para longe daqui o mais perverso presidente da nossa história, e um dos piores seres humanos vivos, é simbólica em muitos níveis.

De imediato, o alívio. Acabou. Fim. Foi.

Na sequência, a constatação de que sobrevivemos.

Estamos aqui na luta, respirando, dispostos a reconstruir um país.

Fazer de novo, dessa vez com foco na verdadeira história dessa nação: uma história que envolve genocídios, extermínios, escravidão, opressão.

Encarar para transformar, como pediu James Baldwin: "nem tudo o que se encara pode ser transformado, mas nada pode ser transformado até que seja encarado". Um salve para a genialidade de James Baldwin.

Chega de exclusão, de opressão, de repressão. Chega de um mesmo sujeito político trabalhando para nos dominar e sujeitar.

Estamos vivos, a despeito da guerra travada contra nossos corpos e modos de vida.

Vontade de chorar, abraçar, dançar, pular, berrar.

Vivos e testemunhando a construção de um ministério minimamente representativo. Pela primeira vez.

Vivos e deixando o medo sair de nossos poros.

Vivos e, depois de um longo e tenebroso inverno, confiantes.

Festejar sem jamais esquecer o que tivemos que enfrentar. Dos dias sombrios. De quem nos deixou antes da hora. De tanto sofrimento desnecessário. De tanta pulsão de morte e destruição.

Cobrar punição, cobrar justiça e o devido destino a todos os que nos trouxeram até aqui.

Lembrar sempre de quem apoiou esse estado terrível de coisas.

Paulo Guedes, o arquiteto da barbárie.

Damares Alves e sua demoníaca concepção de sociedade.

Jair Bolsonaro e seu exército macabro de pessoas não necessariamente fardadas mas necessariamente perversas.

Acabou.

Ver o avião levar daqui esses dejetos foi ao mesmo tempo um conforto e uma revolta.

Não vão escapar da justiça. Voltarão. Um a um.

Enquanto isso a gente se abraça e constrói um país socialmente legítimo.

Agora é hora de festa. Hora de amarmos uns aos outros livremente. Hora de fazer a nossa arte.

Deixar ir os que não sabem amar. Os que não gostam de abraçar. Os que não têm aptidão para a paixão.

Acabou. Estamos vivos e vamos comemorar do nosso jeito.