Topo

Milly Lacombe

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Caso do coach de macho mostra o maior medo de homens em relação a mulheres

Sucesso com "Manual Red Pill", Thiago Schutz já participou de reality da Netflix e virou meme após podcast viralizar nas redes - Reprodução/Youtube
Sucesso com "Manual Red Pill", Thiago Schutz já participou de reality da Netflix e virou meme após podcast viralizar nas redes Imagem: Reprodução/Youtube

Colunista do UOL

28/02/2023 13h22

Receba os novos posts desta coluna no seu e-mail

Email inválido

O maior medo que um homem tem em relação a uma mulher é que ela ria dele. As mulheres, por sua vez, já não têm esse medo. O medo delas é que os homens as matem.

A reação destemperada e criminosa do coach de virilidade Thiago Schutz diante de uma piada feita em cima de seu discurso altamente debochável mostra em cores fortes o que faz um homem quando mulheres riem dele: ele ameaça de morte e, em muitos casos, mata.

O episódio traz para a superfície uma epidemia moderna: a dos homens que não sabem como se comportar numa sociedade a cada dia mais feminista.

A epidemia é mundial e por todos os cantos existem Incels (celibatários involuntários) e agora, mais recentemente, os redpillados, uma alusão aos que teriam optado por tomar a pílula vermelha de Matriz e, assim, ver a verdade.

Schutz é um redpillado.

Essa nova categoria de machos inconformados com mudanças que vão em direção aos direitos das mulheres prega delírios persecutórios em relação à masculinidade. O feminismo estaria deixando eles sem lugar na sociedade, sem ter como agir, sem poder se movimentar.

A inversão do discurso é arma antiga usada por toda estrutura hegemônica de poder. Homens seriam os oprimidos.

Vejamos: a cada dia três mulheres são assassinadas por maridos, parceiros, namorados, conhecidos, peguetes, amantes, ficantes. A cada dez minutos uma é estuprada. A cada hora 26 são agredidas por essa mesma classificação de homens. Esses números são abissalmente subnotificados. E, ainda assim, são números de uma guerra.

O discurso do macho perseguido é uma alucinação, portanto. Mas uma alucinação convincente porque a cultura heterossexual masculina é - e sempre foi - homoafetiva. Homens não gostam de mulheres - homens heterossexuais gostam de sexo com mulheres, mas gostar de transar não é gostar do gênero.

E sexo para eles inclui estupro. Só que não. Estupro é sobre poder e dominação e não sobre sexo e tesão. Estupro é arma de guerra, usada por exércitos na ocupação de território inimigo, que é precisamente o que significa o corpo da mulher para o coach de macho e para boa parte da sociedade: território inimigo.

Estupro é também uma cultura. A sociedade educa as meninas dizendo: não se deixe estuprar. O recado é: em caso de estupro a culpa é sua.

Para os meninos é dito: seu capital masculino vem do número de mulheres que comer. Quanto mais, mais macho. Faça o que tiver que fazer para ser um macho de sucesso.

Daí os estupros coletivos serem tão comuns: um homem está performando para o outro.

Homens citam homens. Homens respeitam homens. Homens riem com homens. Homens celebram homens. Homens honram homens. Homens se exibem para homens.

Das mulheres querem sexo, submissão e silêncio. (Viva o pensamento de Marilyn Frye).

Mas o mundo está mudando e não tem volta. Não nos calaremos, não deixaremos de denunciar e os coaches de virilidade terão o que merecem: uma sonora tiração de sarro.