Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.
Bia Haddad: especialista em recomeçar
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A tenista Bia Haddad é uma improbabilidade.
Primeiro, porque é vencedora em um país que não apoia ou incentiva o esporte com organização, planejamento ou paixão.
Assim como Guga, Bia não foi estimulada, pela sociedade que a produziu, a chegar tão longe.
Segundo, porque Bia lida com lesões sérias desde muito cedo.
Incontáveis vezes, teve a carreira interrompida pelo departamento médico, incluindo cirurgias, e incontáveis vezes foi convidada a recomeçar.
Quando as lesões deram um tempo, um exame de urina apontou uso de substância proibida.
Estamos em 2020, Bia já não é uma adolescente no tênis, e a sentença anuncia uma carreira interrompida precocemente.
Bia é obrigada a parar.
Despenca mil posições e vê o sonho de ser uma das mais competitivas tenistas mundiais desabar.
Mas lutar é seu verbo de estimação.
Bia lutou contra a sentença, que acabou fixada em 10 meses, (poderia chegar a quatro anos), conseguindo assim encurtar o tempo de afastamento.
Aos 24 anos, Bia volta - e volta forte.
Mentalmente sólida, fisicamente soberana, tecnicamente afiada. Usou o afastamento para preparar um retorno triunfal.
"Desde muito pequena a Bia já era uma tenista diferente", diz Luciana Tella, que foi uma de nossas melhores tenistas e também ranqueada pela WTA. "Ela tinha cabeça muito forte e técnica agressiva", completa, explicando por que a Bia criança se destacava das demais.
Tella conta que a trajetória de Bia é considerada difícil mesmo num meio conhecido por histórias de trajetórias difíceis: muitas lesões, muitos recomeços, muitos desafios pessoais.
"Bia é boa em tudo. Uma pessoa maravilhosa, uma tenista altamente técnica e uma atleta fisicamente forte. Fora isso, a Bia é adorada por todos no meio", diz Tella, que evita comparar Bia a Guga, mas explica que, assim como Guga, Bia é pessoa muito decente, doce e bacana demais fora das quadras.
Com Bia, o interesse pelo tênis volta a crescer. A resposta, aliás, é imediata.
Tella, dona de uma academia de tênis em Campinas, interior de São Paulo, diz que assim que a partida que levou Bia à semfinal acabou duas mulheres entraram em contato para marcar aulas.
"A jornada da Bia coloca o tênis feminino, ainda muito invisibilizado pelo masculino, em evidência. Vai ser muito bom para o esporte como um todo, mas especialmente para as mulheres e para o tênis feminino", diz Tella.
Seria maravilhoso que fizéssemos agora o que não fizemos com Guga: transformar o tênis em mania nacional.
Construir quadras nas favelas e periferias, criar políticas públicas que difundam o esporte, dar a chance para milhões de crianças se inspirarem em Bia e seguirem seus sonhos.
Não se trata de formar campeões; se trata de usar o esporte para formar cidadãos capazes de saber que viver é um contínuo recomeço e que, assim como Bia, a gente pode evitar match-points e virar muito jogos.
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