Chacinas em favelas e periferias provam que nossa democracia é relativa
Se você mora em Higienópolis, bairro nobre em São Paulo, você sabe que não corre o risco de ser acordado no meio da noite com policiais chutando sua porta e atirando em pessoas dentro da sua casa.
Se você mora em Paraisópolis, uma favela que fica a uma dúzia de quilômetros de Higienópolis, essa certeza já não existe.
Se alguém morre em Higienópolis, a morte dessa pessoa será respeitada: ela terá seu nome divulgado e, quem a amava, direito ao luto.
Morrer em Paraisópolis depois de batida policial não te dá direito a nome nem a luto. Bora trabalhar, seus vagabundos.
Se você é vítima de alguma violência em Higienópolis, pode ir até uma delegacia buscar justiça e reparação.
Quem morre assassinado pela PM em Paraisópolis não tem muito por onde tentar apelar para a justiça.
Não importa que os indícios de que houve uma chacina estejam ali para todos verem. O Governador fala que foi uma "operação" policial e que ele ficou satisfeito com o resultado.
Estamos diante de uma nova "operação", agora no Guarujá, litoral de São Paulo.
O policial que morreu trabalhando era um pai de família. Quem morreu na favela no Guarujá voltando do trabalho, bem, não vem ao caso se tinha filhos. O governador não se importa com esses.
Se há democracia em um bairro mas não há no outro podemos dizer que vivemos numa democracia? Se alguns de nós podem fazer uso de ferramentas democráticas mas outros não podem, vivemos numa democracia?
Fala-se em guerra às drogas, mas todos sabemos que isso não existe. Se existisse, a polícia estaria buscando os grandes responsáveis pelo comércio de entorpecentes em outros bairros, esses nos quais as pessoas dormem sossegadas.
Ou, por outra: Se essa tal de guerra as drogas é travada há décadas e nunca foi capaz de mudar nada no cenário, bem, talvez ela não funcione, não é mesmo? A quem ela interessa então?
A polícia, que deveria proteger, instaura o medo. A milícia entra e cobra pela paz.
O padre explica como o esquema se dá. Desenha, na verdade. O governador avisa que bandido não terá vez sem dizer quem é que decide quem é e quem não é bandido nessa bagunça.
Aceitamos com naturalidade que a polícia entre matando em alguns bairros. Acredita-se que faz parte da vida.
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Se a polícia entrasse atirando no Vivendas da Barra, no Leblon, nos Jardins ou em qualquer bairro nobre do Brasil e matasse dez, hoje o país teria parado, os jornais só falariam disso e o presidente estaria chorando na TV.
Pegamos um caminho errado e seria preciso que todos nos implicássemos para que pudéssemos sair desse lugar sombrio.
Se você acha normal o que aconteceu no Guarujá, você também precisa de ajuda porque nossa própria desumanização tem um custo alto para nós mesmos.
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