Milly Lacombe

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OpiniãoEsporte

Qual a medida das críticas a Pia Sundhage?

Pia é corresponsável pelos fracassos da seleção brasileira em seu mais recente ciclo. Acho que a afirmação não choca. Ao lado dela, CBF e comissão técnica.

Pia assumiu o time há quatro anos com a missão de prepará-lo para conquistas inéditas. Elas não vieram, e, pior ainda, o time jogou mal quando precisava jogar bem e jogou bem quando não importava tanto. Salve, Tite, aquele abraço.

Assumir nosso naco no latifúndio do fracasso é importante. Mas Pia não é a única responsável.

Ela não é responsável por ser sueca e vir de uma cultura fria. Queríamos sua frieza e razoabilidade e fomos buscar. Tudo planejado.

Mas talvez seja responsável por nunca ter se misturado à cultura do país da seleção que estava comandando. Dançar, cantar e cair no samba é pouco. Teria sido necessário levar a campo, em forma de tática e presença, esse embalar.

Chamar Pia de velha é baixo e covarde.

Pia não tem culpa de não ter morrido e, com sorte, todas e todos alcançaremos idades mais avançadas.

Tite tem a idade dela e não mereceu esse tipo de qualificação. Quem usa "velha" para se referir a ela deve entender que está aplicando toscamente o abecedário do machismo.

Pia é experiente e tem conhecimento. Seria importante, sempre, ressaltar que ela movimentou nossa seleção para ambientes ainda pouco visitados, como o da disciplina, da seriedade, da aplicação.

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Com Pia, vieram mais investimentos, mais popularidade, mais respeito.

Seu trabalho não foi em vão, e isso também devemos dizer.

A misoginia e o machismo rolaram pelo campo depois da eliminação.

Todo ódio ao feminino e às mulheres guardado nos primeiros dias da competição saiu dos armários.

Gente que nunca viu um jogo da Copa sentenciando por que perdemos, gente que nunca escutou o que as comentaristas mulheres dizem repetindo tudo o que foi falado como se estivessem fazendo uma análise originalíssima, gente que estava calada enquanto o Brasil ganhava desdenhando do resultado.

E, claro, os de sempre vociferando contra a popularidade e a badalação que a Copa e a seleção estavam recebendo.

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Mais uma vez fica claro como a cultura heterossexual masculina é homoafetiva.

Uma cultura que encoraja homens a desprezarem mulheres e a gostarem de outros homens. É com eles que querem fazer mesas redondas, é deles que querem as opiniões, o respeito, a admiração, o carinho, a atenção, as ideias, as análises, as conjecturas. De mulheres querem silêncio e sexo.

É o último estrebuchar de uma cultura que já convive, abestalhada, com sua própria decadência.

A Copa segue. A seleção segue. Nós seguimos. Para chilique e histeria dos mais pilhados e infames entre os anti.

Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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