Milly Lacombe

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OpiniãoEsporte

Treinador e dirigente unidos pelo grotesco pacto da masculinidade

Cá estamos nós outra vez: Na sequência de uma Copa do Mundo histórica, quando o assunto deveria ser essa imensa conquista para todas as mulheres do mundo, a pauta é o abjeto comportamento de homens em situação de poder.

Imagens do presidente da confederação de futebol espanhola, Luis Rubiales, segurando com força o rosto de Jenni Hermoso para dar um beijo não solicitado ou desejado em sua boca, imagens de Jorge Vilda deixando sua mão boba sobre o peito de uma integrante da comissão técnica, imagens do mesmo Rubiales segurando o saco como quem diz "vem que tem" logo depois da conquista, ainda na tribuna de honra e ao lado da Rainha Leticia.

Se essas coisas vêm à tona é seguro que há mais nos bastidores que ainda não sabemos.

Alguns homens em situação de poder se sentem suficientemente confortáveis para praticar assédios e vulgaridades até em público sabendo que, no máximo, terão que pedir desculpas. Quando muito.

Fazem porque sabem que nada acontecerá a não ser o aumento imediato de seu capital erótico.

Fazem para poderem se gabar a outros machos quando estiverem sozinhos.

Fazem para se exibir a colegas e parceiros.

Fazem em nome do erótico que há nesse tecido social que liga um homem a outro.

Deveríamos cobrar de Adidas e Ibéria, dois dos maiores patrocinadores e apoiadores da seleção nacional feminina espanhola, um posicionamento.

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Não virá de outro lugar uma solução para que esses homens percam seus postos de poder.

Teria que vir dos financiadores dessa palhaçada. E do MP espanhol.

Vem? Não sou otimista.

A situação toda é incrivelmente delicada: logo depois de uma conquista, quando o foco deveria ser justamente o feito, eles chamam a atenção para si. Não pega nada. Tá tudo em casa. Elas venceram mesmo assim. Parem de ser chatas.

Elas ganharam a despeito de tudo isso. Ganharam mesmo tendo que responder a esses dois homens. Ganharam entubando sabe Deus mais quantos abusos, assédios, vulgaridades e violências.

Fica agora bastante nítido o que havia por trás de tantas reclamações das atletas contra Vilda.

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Nítido também a parceria desses dois homens, que se apoiaram e se protegeram durante toda a polêmica.

Protegido por Rubiales, Vilda se sentiu livre para exercer seu domínio. O que mais ainda será revelado?

É lamentável ter que ver as cenas repetidamente. Toda mulher volta para a situação de seus abusos e assédios.

O que aconteceu em Sidney durante a entrega das medalhas, segundo advogados espanhóis que já se manifestaram sobre o episódio, é um ato constitutivo de delito agravado pelo fato de Hermoso ser trabalhadora subordinada ao homem que cometeu o ato.

A Espanha tem se adiantado na legislação contra crimes sexuais e não por acaso é lá que Daniel Alves, acusado de estupro, está preso e será julgado.

Consentimento é levado a sério e mais do que "não é não" a lei passa a ser orientada por "só sim é sim".

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As imagens do assédio cometido contra Hermoso são de uma violência inédita. No auge do que deveria ser uma celebração de todas as mulheres, um ato de abuso é cometido pelo chefe aos olhos do planeta inteiro.

Consciente ou não, Rubiales estava, com seu gesto tosco e criminoso, dizendo ao mundo que o protagonismo não pode ser nosso, que quem manda são eles, que nada está realmente se transformando, que voltemos a nossos lugares de coadjuvantes.

Que Vilda e Rubiales paguem com o que importa: a perda do poder, essa força que pulsa direto para seus pênis flácidos e faz com que homens como eles vivam de ereções imaginárias e de gozos vazios, solitários, deprimentes e vulgares.

Atores pornográficos de filmes horríveis encenados dentro de seus castelos decadentes feitos de ruína moral e assistidos apenas por uma audiência de homens igualmente gosmentos que aplaudem automaticamente a mínima ereção do colega ao lado com a efusividade dos zumbis sociais que são, e sob o olhar debochado dos vivos.

Vermes pálidos que rastejam sem rumo por um mundo no qual não valem mais nada, já não são mais cortejados, já não conseguem ser vistos a não ser por seus esqueletos apodrecidos enterrados sob as ocas estátuas daquilo que ainda acham que são.

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Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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