Milly Lacombe

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OpiniãoEsporte

Carta aberta ao novo presidente do Corinthians

Meu caro Augusto, parabéns pela vitória. Que sejam anos de lisura, correção, amor e paixão na liderança do dia a dia desse escudo tão importante na vida de 30 milhões de brasileiras e brasileiros.

Desejo que sua administração esteja atenta aos erros cometidos pelos administradores que o antecederam. Erros ensinam e apontam caminhos que não devem mais ser percorridos. Depois, preciso dizer que futebol é coisa pra homens e mulheres e torcer para que os áudios vazados com sua voz sejam os da voz de um homem que ficou para trás. Espero que você tenha evoluído como pessoa e possa se envergonhar do que um dia foi e do que um dia representou.

Seria bom que você continuasse evoluindo e se letrasse em assuntos fundamentais para o time que se considera do povo: antirracismo, feminismo e anti-homofobia. O povo não é feito de homens brancos heterossexuais como você. Olhe para as arquibancadas e veja quantas mulheres existem nela chorando e sofrendo por esse clube. Olhe nos bares, nas praças, nas ruas e perceba quem usa a camisa desse time tão amado.

Eduque-se sobre a parte LGBTQ de sua torcida. Entenda o que passam e como sofrem. Pense em formas de incluir a comunidade. Eduque-se sobre o que passam as corintianas nos estádios. Violência de gênero, opressões, abusos, assédios. Chame mulheres para conversar, para falar com os jogadores. Compreenda o tamanho do time feminino do Corinthians e trabalhe para aumentar seu espaço, seus salários, seus domínios.

Trabalhe com os patrocinadores para lançar camisas a preços populares, valorizar quem não tem dinheiro para ser sócio-torcedor, olhar para a torcida de baixa renda e pensar em como fazer com que ela tenha acesso aos jogos. Outro dia fui tomar café-da-manhã com o padre Julio Lancellotti, que faz trabalho humanitário junto a pessoas em situação de rua. Éramos quase quinze pessoas à mesa e eles e elas me contaram para que time torciam: O time do povo. Perguntei quem já tinha visto o Corinthians de perto e escutei como resposta uma unanimidade: ninguém. Nunca foram ao estádio, nunca chegaram perto dos jogadores e assistiam aos jogos de longe, espiando pelos monitores de padarias e botequins.

Um time verdadeiramente do povo vai até as pessoas excluídas por essa sociedade elitista. Convida o povo para um café da manhã com os jogadores, deixa entrar em treinos, fornece camisas, acolhe, ampara, cuida. O time do povo estaria ao lado do padre Julio trabalhando com ele pela saúde dos esquecidos.

Entenda que você está à frente de um estado de espírito a que se dá o nome de Timão. Vivos e mortos estão representados por essa camisa. É coisa demais. É povo demais. Não dê as costas para os que amam esse time sem pedir nada em troca. Não liquide a base. Não privilegie empresários em detrimento da qualidade do elenco. Não enxergue o Corinthians apenas como um negócio. O Corinthians é uma instituição social que, no limite, forma sujeitos e salva vidas. Não se perca desses valores por vaidade e riqueza.

Boa sorte. Que os guerreiros São Jorge, Ogum e Oxossi guiem seus passos.

Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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