O custo emocional da entrevista de Robinho
Robinho deu uma entrevista de quase meia hora para Carolina Ferraz, na Record. Minha função jornalística me obriga a assistir à íntegra antes de comentar. Eu não gostaria de ver a íntegra porque toda mulher se aproxima de uma entrevista como essa com o organismo já estressado: suor, taquicardia, mãos trêmulas.
Robinho fala de racismo, sugerindo que se fosse branco não estaria condenado. Não temos como negar que vivemos em uma sociedade racista e nem como dizer que a estrutura racista tenha deixado de desempenhar um papel em sua condenação. Mas as provas contra ele, incluídos os áudios, são tão sólidas que fica bastante difícil tentar se afastar das acusações com essa alegação.
Robinho terá seu julgamento italiano avaliado aqui no Brasil. A sentença recebida na Europa pode ou não ser confirmada. Seria importante que as acusações de racismo fossem levadas em consideração. Estamos diante de um caso que se revela com complexidades das quais não poderemos escapar: existe um debate de raça que se faz necessário, e um de gênero que igualmente se apresenta. É hora de entender onde um se encontra com o outro, e onde eles se separam.
Venho argumentando que, tão importante quanto a aplicação da lei, seria que Robinho e outros condenados passassem por algum tipo de reforma para que começassem a se implicar na questão da violência de gênero.
É comum perceber que não há verdadeira implicação quando o acusado ou condenado tenta responsabilizar a vítima sugerindo que ela é vadia ou está interessada em dinheiro. É em momentos como esse que a indignação nos invade mais pesadamente. Uma indignação que, para ser organizada, custa demais. Custa nossa saúde física e mental.
Robinho, eu gostaria que você soubesse que as minúcias mórbidas que você narrou a fim de comover a opinião pública e assim provar o que você alega ser inocência causam mais dor nas mulheres que te ouvem. Eu recomendaria que você as evitasse.
Esse detalhamento é um rolê seu com a Justiça. Que você faça uso de todos meios legais, e desse detalhamento, para se defender no âmbito da Justiça eu acho absolutamente legítimo. Que você não culpe a si mesmo é também é da ordem do legal. São dimensões da lei que quero para mim e para os que eu amo. Então, em relação à Justiça, vai lá e faz teu corre.
Só seria preciso compreender que o universo das coisas legais ou ilegais não existe isoladamente em si mesmo. Ele se expande em outras dimensões: as do legítimo, do moral e do ético.
Robinho está muito longe de entender do que se trata a questão. Ele sequer começou uma jornada em busca de algum tipo de compreensão. Robinho navega pelo episódio tentando se des-implicar implicando a vítima. Pede desculpas, não sabemos pelo que. Não queremos desculpas. Queremos implicações e ações.
Acho importante ressaltar que assistir a um depoimento como esse é ação muito diferente para ouvidos masculinos e femininos: até na escuta é preciso fazer o recorte de gênero. Para uma mulher, estamos sendo arrastadas contra a nossa vontade para dentro de um passado tão doloroso quanto particular. É um custo emocional altíssimo. Fazemos por dever de ofício. Mas, quando acabamos de ver, velhas cicatrizes estão sangrando e somos nós que teremos que lidar com elas. Só a gente sabe quanto custa cuidar de feridas reabertas e ter que seguir a vida.
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