Milly Lacombe

Milly Lacombe

Siga nas redes
Só para assinantesAssine UOL
OpiniãoEsporte

Homens, aprendam a perder

Não existe futebol sem que reclamemos do juiz, do resultado, da falta de sorte, das marcações. Desde sempre. Nelson Rodrigues escrevia sobre a figura do juiz-ladrão, que era todo juiz que levava seu Fluminense a perder. Perdemos, reclamamos, seguimos. Ou pelo menos era assim. Agora quem perde tem chiliques e manda fazer dossiê da Good Game. Não consigo pensar em nada mais cafona do que entregar nas mãos dos gringos o veredito final sobre se somos ou não capazes de jogar esse esporte.

É realmente horrível perder. Machuca, entristece e, por vezes, revolta. O jogo do momento é o do Atlético contra o Palmeiras. Hulk teria sido injustamente expulso. Faço coro. Acho que o juizão exagerou sim na dose. Mas e o Hulk? O cara estava desde o minuto um tendo chiliques por qualquer marcação. Ia pra cima do juiz, abria os braços, berrava, colava o corpo no corpo do árbitro. Isso pode? Tá tudo bem com esse tipo de descontrole? Desde quando aprendemos a dar chilique depois de qualquer marcação? O jogo das mulheres não é assim não. Tem, claro, discordâncias do juiz, mas sem essa quantidade de histeria.

O presidente do Botafogo, John Textor, e seu agora já histórico chilique pela perda de 2023 inauguraram uma nova fase: a do dono do time que não aceita a derrota. Perdeu? Toma dossiê. Chama a Good Game. Quanto custa isso aí? Pode rodar.

No jogo em questão, o Galo perdeu porque foi pior do que o Palmeiras. Não seria prudente um dirigente que fizesse menos barulho e cuidasse de deixar o treinador arrumar o que não deu certo? Olhar muito para fora é não olhar para dentro é o caminho mais curto para o fracasso. Rancor e amargura nunca foram bons orientadores.

Isso não quer dizer que o jogo seja incorruptível. Não é, claro que não. Isso quer apenas dizer que tentar tirar do futebol a dimensão do erro, chamando tudo de corrupção, vai matá-lo. Tentar encontrar em toda a derrota um espaço para o crime é coisa de mau perdedor. E maluquice de gente com mania persecutória.

Textor não entende de futebol. Considerar que o dossiê que ele levou a Brasília reúne provas de crimes é atitude de quem simplesmente não sabe que jogo é esse. Textor é um homem muito muito rico que, entediado, resolveu comprar um clube no Brasil. Conseguiu ser proprietário de um dos mais tradicionais e do uniforme mais bonito do mundo. Tirou o Botafogo da série B, montou um time que quase foi campeão em 2023 e que está jogado o fino em 2024. Não basta? Não. A lógica liberal manda vencer sempre e a qualquer custo. Ela não admite derrotados. Losers, como dizem lá na terra dele. Perder é uma vergonha. Coisa de gente fraca. Não é coisa de homem.

Bem, eu argumentaria o oposto. Quando homens aprenderem a perder - e a escutar - viveremos num mundo melhor para todos, inclusive para eles porque deve ser horrível ter que ganhar sempre a fim de não se sentir um inútil. Sim, sim, a gente sabe: nem todo homem. Você que acha que não é esse homem manda seu endereço que enviaremos a medalha. É isso o que você quer, certo?.

Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

Deixe seu comentário

Só para assinantes