Pedido de desculpas de Abel apenas aprofunda o horror

Antes de redigir uma nota pública de desculpas Abel, ou quem quer que tenha cometido a postagem, deveria gastar uma horinha do dia tentando compreender o alcance da dor que causou. Quando milhares de mulheres e de jornalistas se revoltam de imediato com uma resposta dada durante coletiva de imprensa pós-jogo, alguma coisa tem ali que ele não percebeu.

Não é o erro o mais grave, afinal todas e todos erramos. O mais grave é passar arrogantemente por um erro, não tentar entender o que o levou a errar e vomitar uma nota como a que ele vomitou.

"Utilizei a pergunta da referida profissional para transmitir uma mensagem que já estava na minha cabeça, sem me dar conta de que, naquele contexto, a declaração poderia gerar uma interpretação diferente ou soar hostil", escreve Abel.

Qual mensagem estava na cabeça dele? Que ele só deve satisfação a três mulheres? Antes da repórter da BandNews falar, cinco homens fizeram perguntas a ele e essa tal mensagem não foi vomitada. Quando a única mulher da coletiva fala é que nosso herói lembra de dar esse recado sem lé nem cré? Ah, por favor, Abel ou quem redigiu essa bizarrice que foi chamada de desculpas. Por favor, né.

"Quando concedo uma entrevista coletiva, entendo que não estou respondendo diretamente à repórter, ou ao repórter, que me faz a pergunta, mas sim a todos os presentes na conferência e também aos nossos atletas e torcedores", diz a nota.

Nesse ponto ele nos chamar de imbecis com força. O que isso quer dizer? A pergunta da jornalista da BandNews era sobre um jogador contundido e a resposta foi "só devo satisfação a três mulheres". Para quem era esse recado? Qual a lógica do argumento?

Uma nota minimamente decente começaria com "Estou vendo com atenção as reações ao que eu disse ontem e tive que parar para refletir. A dor que causei não pode ser por mim julgada. Posso apenas tentar entender o que fiz e por que fiz. Ainda não tenho todos os recursos para chegar a uma conclusão, mas preciso me desculpar com a repórter. Revi o que aconteceu e entendi que soou muito machista. Se soou machista então talvez eu precise corrigir em mim esse machismo que nem eu sabia que estava tão à flor da pele".

Qualquer coisa nesse sentido seria aceitável e nos faria acreditar que Abel iria atrás de compreender o machismo contido na resposta e, depois, de se livrar dele. Como vi em um grupo feminista de mensagens: Abel precisava fazer o mínimo e nem isso ele conseguiu.

Uma nota de repúdio que segue com o desrespeito às mulheres e deve mesmo agradar apenas o ex-goleiro Marcos que saiu correndo para defender o macho da vez e todos os outros homens hétero que amam amar homens hétero por aí. Uma nota que desrespeita inclusive a chefe de Abel, que vem fazendo o que nenhum boleiro jamais fez pela luta das mulheres no futebol. Em tempo: parem de cobrar mulheres por erros de homens, sejam elas subordinas ou chefes do macho que errou. Se querem ajudar na luta, parem com isso.

É muito difícil ser mulher nesse meio. Já ser homem é a coisa mais fácil do mundo. Estamos aqui implorando por aliados e por ajuda nessa luta que todos os dias nos massacra. Não precisamos de falsos amigos que se sentem no direito de julgar nossa dor ou nossas alianças. Precisamos de homens que nos escutem. Já seria bom demais se tivéssemos ao nosso lado exemplares do sexo masculinos capazes de escutar sem tentar contra-argumentar, espernear, reagir ou, a que mais gostam, explicar. Ouçam. Parem e ouçam o que estamos dizendo. Parem e ouçam o que estamos contando a respeito de dor, de exclusão, de diminuição, de silenciamentos, de apagamentos.

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