Milly Lacombe

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OpiniãoEsporte

Como Will Ferrell lidou com a transição de gênero do melhor amigo?

"Will e Harper" conta a história de como o comediante Will Ferrell lidou com a transição de gênero de seu melhor amigo depois de três décadas de amizade. A notícia foi dada por email a Ferrell, de modo direto: "Hey, Will. Uma coisa que você precisa saber: estarei transacionando para viver como mulher". Will ficou paralisado, sem saber como reagir.

Eram muitas as perguntas e as incertezas. Como, durante os 27 anos de amizade, ele nunca soube que o amigo passava por tantos questionamentos? Tentando resgatar o passado, Ferrell não encontrava sinais. E então ele teve uma ideia: e se cruzassem os Estados Unidos de carro para, nessa jornada, se reencontrarem? Harper topou. E assim começa o filme.

Will e Harper se conheceram enquanto faziam Saturday Night Live, Will como ator e Harper como roteirista. Harper, então um homem, começou como roteirista júnior e virou o roteirista-chefe antes de se aposentar - e de transicionar.

Enquanto dirigem por estradas vicinais, Will e Harper falam sobre a vida, sobre masculinidade, sobre inseguranças, medos, coragem. Harper começa confessando que não tem dúvida de que Will amava quem ela era, mas que ele já não é mais quem era e, assim, não tem certeza de como o amigo vai reagir.

A primeira parada é para um café da manhã com os dois filhos de Harper, que contam brevemente como lidaram com a transição do pai, que já não é mais assim chamado. De lá, pé na estrada para o interior do país. Harper visita locais que eram familiares antes da transição e reflete sobre como a sociedade a trata nessa nova circunstância.

Enquanto a paisagem muda, Will e Harper falam sobre como Harper foi de um homem de masculinidade absolutamente regular, com toda a toxicidade que ela traz, a existir como mulher, e de toda a dor que ela sentiu por viver quase 60 anos em um corpo que não reconhecia como seu - se obrigando a fazer tudo o que achava que um homem deveria fazer para ser aceito.

Através de diálogos sensíveis, Will e Harper vão se reencontrando a cada quilômetro dessa travessia. Pouco a pouco, a imagem do amigo vai morrendo e a da amiga vai nascendo - tanto para Will quanto para quem assiste. É nítido como o amor é o tecido que une a relação e também como tanto Will quanto Harper têm dificuldade em se entregar sem reservas ao que sentem. Mas é no esforço para se entregarem que mora a poesia do documentário.

Um filme sobre amor e amizade. Um filme sobre como cada um de nós está numa batalha invisível com os monstros que nos habitam e sobre o que podemos fazer para nos aceitar e conviver. No final, a frase que para mim define as violências que a sociedade comete contra todos os que não existem em um corpo masculino e branco. Harper diz: eu amo esse país, mas não sei dizer se esse país segue me amando nessa nova versão. Não, Harper, esse país já não te ama como amava quando você era homem. E por isso lutamos. Bem vinda à luta, Harper Steele.

Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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