Milly Lacombe

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Acusação de crime sexual contra Valdívia convida a falar de consentimento

Mais um jogador é acusado de estar envolvido em um episódio de violência de gênero. Dessa vez foi o chileno Valdívia, ídolo palmeirense, acusado de abuso sexual por uma tatuadora.

O ex-jogador alega que o encontro sexual foi de comum acordo; a tatuadora diz que não foi: estiveram juntos, tomaram alguns drinks e depois ela só se lembra de acordar desorientada e com indícios corporais de que havia passado por violência sexual.

Não sabemos o que exatamente aconteceu nesse caso, mas sabemos do contexto dos crimes de violência sexual no mundo e sabemos que "consentimento" é território muitas vezes contraditório para homens e mulheres.

O que é o consentimento: é uma pessoa adulta estar a fim de transar com a outra pessoa adulta. Basicamente é isso. Seria simples, mas é bastante complexo.

Muitas vezes uma mulher não sabe se está ou não a fim e não tem tempo de decidir ou mesmo de sentir. O homem se antecipa e, sem se preocupar em perceber o sentimento da outra pessoa, força a barra. Vejam: nem sempre envolve violência. Nem sempre pode ser provado. Só as duas pessoas envolvidas no sexo sabem o que aconteceu nos casos mais sensíveis.

Como resolver essa parada? Primeiro estabelecemos que "não é não". Se a mulher diz não, tudo depois disso é estupro. Mesmo que seja feito na maciota e sem violência. Mesmo que ela não reaja. Mesmo que ela cale.

Basta? Não acho que baste porque homens costumam alegar "não terem escutado ela dizer não".

Então a regra evoluiu: só sim é sim.

Ainda assim a gente pisa em outro campo minado: colocar nas costas da mulher a clareza do desejo é pesado. Repito: muitas vezes não sabemos. Muitas vezes estamos em dúvida. Muitas e muitas e muitas vezes uma mulher transa sem ter vontade de transar. Eu realmente não sei que tipo de pessoa pode seguir no sexo sem ser correspondido por sons, iniciativas, impulsos, reações vindas do outro ser humano envolvido. Mas não vou entrar nesse debate aqui.

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O que importa saber é que o consentimento pode ser seguido de uma negativa. A mulher pode querer transar e mudar de ideia em seguida, ou algum tempo depois, ou na hora que ela quiser. Nessa hora o "não" precisa ser escutado. Tudo depois do "não" é estupro.

Eu duvido que um homem não consiga perceber se aquela pessoa que está ali com ele está ou não a fim. Mas muitos justificam que não perceberam e por isso deram continuidade.

A verdade é que em casos como o de Valdívia ambos podem estar dizendo o que acham que é a verdade. E então, se ficar provado que não havia consentimento o homem vai ter que encarar o fato de que ignorar que está cometendo um crime não o torna inocente.

Outra coisa importante: consentimento não é sinônimo de desejo. Tem horas que a mulher tem o desejo mas não quer seguir por ter medo, receio etc. E o medo pode ser de engravidar, de sentir dor, de morrer. O fundamental aqui é focar no consentimento. Toda mulher deixa claro - com palavras ou gestos e atitudes - o que quer de um homem na cama. Não saber escutar é, além de uma arrebatadora falta de sensibilidade, muitas vezes criminoso.

Sobre violência de gênero no Brasil

Uma mulher é estuprada a cada oito minutos. Três mulheres são vítimas de feminicídio por dia. Vinte e seis mulheres sofrem agressão física por hora. Em 2023, foram contabilizados 258.941 registros de agressões decorrentes de violência doméstica, um aumento de 10% em relação a 2022. Todos os números são subnotificados porque a maioria das mulheres vítimas de violência de gênero não prestam queixa.

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Não tolere violência, saiba como procurar ajuda
O Ligue 190 é o número de emergência indicado para quem estiver presenciando uma situação de agressão. A Polícia Militar poderá agir imediatamente e levar o agressor a uma delegacia.

Também é possível pedir ajuda e se informar pelo número 180, do governo federal, criado para mulheres que estão passando por situações de violência. A Central de Atendimento à Mulher funciona em todo o país e também no exterior, 24 horas por dia. A ligação é gratuita.

O Ligue 180 recebe denúncias, dá orientação de especialistas e encaminhamento para serviços de proteção e auxílio psicológico. Também é possível acionar esse serviço pelo WhatsApp. Nesse caso, acesse o (61) 99656-5008.

Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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