Milly Lacombe

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OpiniãoEsporte

A ideologia por trás de negar absorvente e papel higiênico a presidiárias

A Comissão de Segurança Pública da Câmara dos Deputados votou no dia 5 de dezembro contra o projeto de lei que determina que penitenciárias femininas ofereçam absorventes, papel higiênico e fralda infantil para mães acompanhadas dos filhos a mulheres presas. A justificativa dos nobres deputados era a de que gastar com produtos de higiene pessoal de mulheres presas seria fazer mau uso da grana pública.

Um estudo da organização da sociedade civil Justa mostra que os gastos com esses itens seriam irrelevantes para os cofres públicos. Em média, os estados brasileiros usariam 0,01% do orçamento previsto para os presídios se investissem na compra regular de absorventes íntimos para pessoas presas que menstruam.

Então podemos esquecer o argumento dado pelos deputados que votaram contra o PL.

Isso deixado de lado, vamos falar do que está por trás desse veto.

Aqui é importante lembrar que os mesmos deputados que vetaram fraldas a presidiárias encarceradas com seus filhos pequenos são aqueles que se dizem "a favor da vida" para vociferar contra o aborto.

De que vida esse senhores são a favor? Da suposta vida de um feto. Suposta porque a menos que Deus se faça presente entre os vivos e testemunhe que feto tem vida não há como, cientificamente, provarmos que feto tem vida, ou quando a alma entra no corpo, ou quantas células são necessárias para abrigar o espírito humano, ou mesmo se existem almas.

Esses senhores não estão nem aí para bebês. Concentram suas verdades obscurantistas no feto. Depois que a mulher pari, bem, danem-se ambos. Fraldas para crianças encarceradas com suas mães? Jamais. Absorventes? Credo, consideramos um nojo falar de menstruação. Papel higiênico? Nem pensar. Comprem vocês, pessoas presas, seus itens básicos para higiene pessoal.

Essa é uma tecnologia de dominação que se chama patriarcado. Para manter um grupo devidamente controlado você precisa de coisas que vão além de força, de bala e de porrete. É preciso de uma ideologia. É preciso desenvolver, de forma constante, técnicas de humilhação.

A mesma ideologia que nega absorvente a mulheres presas é a que chama feto de vida para colocar um punhado de células em lugar hierárquico superior ao da mulher. É a mesma que incentiva o estupro negligenciando que o foco da punição esteja sobre o criminoso e colocando a fúria punitivista sobre a vítima. Ao obrigar a criança estuprada a parir - e a morrer no parto porque o corpo de uma criança não é capaz de segurar uma gestação de forma segura -, essa turma aprimora as tecnologias de violência contra meninas e mulheres.

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Essa é a mesma ideologia que nos interrompe sem cerimônia, a mesma que não quer que uma mulher receba tanto quanto um homem, a mesma que acha razoável nos julgar por nossos corpos, idades e aparências. Ela se chama patriarcado e seus filhotes, todos os dias muito bem alimentados, são o machismo e a misoginia.

Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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