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Olhar Olímpico

Pivô de fraude no COB tinha relação pessoal com P. Wanderley, diz ex-esposa

Paulo Wanderley -
Paulo Wanderley

17/02/2020 04h00

Demitido do Comitê Olímpico do Brasil (COB) depois que uma auditoria independente o apontou como figura central de um esquema de beneficiamento de empresas e pessoas de seu ciclo familiar em contratos de tecnologia, Leonardo Rosário mantinha uma relação "extra-trabalho" com o presidente do comitê, Paulo Wanderley, antes de este chegar ao cargo. A revelação é de Valéria Gobbi, ex-esposa do técnico em informática, que aparecia como proprietária de uma empresa que prestou serviços para o COB, mas que agora reconhece que era laranja do ex-marido.

Em entrevista ao Olha Olímpico, Gobbi contou que Rosário "não tinha hora" para ir ao encontro de Paulo Wanderley quando o dirigente estava em Vitória (ES), onde morou boa parte da vida e iniciou sua carreira no esporte olímpico. "Eles se encontravam em feriados, sábado, domingo... As ligações eram também fora de hora. Ele tratava o Paulo dentro de casa como alguém próximo, como alguém que ele admirava", lembra. Todas as empresas e pessoas envolvidas no escândalo são de Vitória, como o presidente do COB.

Em nota ao blog, Paulo Wanderley disse que manteve "relacionamento estrita e exclusivamente profissional" com Rosário, mas não respondeu as diversas perguntas feitas pela reportagem. Ficaram sem respostas, por exemplo, questões como: quando e como começou a relação entre eles e quem indicou a contratação de Rosário ao COB.

Segundo Gobbi, que viveu com Rosário até o final de 2017 (mesma época em que Paulo Wanderley assumiu o COB), a relação entre os dois se tornou mais próxima entre 2016 e 2017. "Todas as vezes que ele [Paulo] vinha no estado, acho que ele não morava aqui, toda vez eles costumavam se encontrar. Ou pela manhã, ou no almoço. Ele frequentava até a casa da mãe do Paulo, parece que instalou câmeras lá. Ela tinha problemas de saúde. O Leonardo tratava o Paulo com bastante afeto."

O esquema de fraudes foi denunciado de forma anônima para o então compliance officer do COB em meados do ano passado e investigado pela auditoria independente Kroll. Mas a existência dessa investigação só foi tornada pública pelo Olhar Olímpico em novembro, quando a reportagem teve acesso a um relatório preliminar. O COB nunca tornou público o relatório final, nem explicou por que o escopo da auditoria não incluía entender quem se beneficiou com as contratações irregulares feitas no entorno de Rosário.

O técnico de informática (que informou ao COB ter um diploma universitário apesar de a ex-esposa afirmar nunca tê-lo visto estudando) trabalhou para a Confederação Brasileira de Judô (CBJ) na época que esta era presidida por Paulo Wanderley. Logo depois que o dirigente assumiu a presidência do COB, no final de 2017, Rosário também passou a prestar serviços para o comitê.

O primeiro contato foi em 5 de janeiro de 2018, pela empresa LBM Tecnologia, da qual Rosário era sócio. Só em 2018 a empresa receber R$ 50 mil em três contratações sem licitação. De fevereiro a dezembro, Rosário ainda trabalhou como colaborador do COB, recebendo em regime de RPA (Recibo de Pagamento Autônomo) um total de R$ 146 mil, sendo R$ 13,3 mil ao mês. Em junho uma empresa em nome da esposa dele foi contratada para um serviço de R$ 24 mil. Depois, em janeiro de 2019, Rosário foi empregado como gerente executivo de TI no COB, com salário bruto de R$ 25,9 mil.

Quando Rosário já prestava serviços para o COB, a Rodrigues Design LTDA, conhecida como RDWEB, venceu uma concorrência simples e foi contratada por R$ 250 mil para desenvolver um sistema, ainda que o estatuto do COB exige concorrência padrão por serviços acima de R$ 25 mil. Nessa concorrência simples, ela concorreu contra a Vix Vitória, empresa que no papel pertencia à esposa de Rosário. "Ele não podia ter nada no nome dele, era o que ele alegava. Ele só chegava, me entregava e pedia para eu assinar. Eu nunca tive acesso a contas, contrato. Elas só estavam em meu nome", conta Gobbi.

Ela afirma que Paulo Wanderley tinha conhecimento da situação, que vinha desde 2006, quando Rosário foi acusado de furto, estelionato e falsidade ideológica. Nos autos do processo consta que Rosário era laranja de um esquema liderado por uma terceira, com quem se relacionava. O processo correu em segredo de Justiça e foi extinto em agosto de 2018 porque o juiz responsável entendeu que os crimes haviam prescrito.

Em um outro processo cível, Rosário é defendido pela advogada Ludmila Montibeler Pereira, irmã de Everson Montibeller, a segunda pessoa investigada pela Kroll. Este também chegou ao COB em 2018 como RPA e foi contratado como especialista de sistemas em 8 de janeiro de 2019, com salário de R$ 16,5 mil. Montibeller é sócio da RDWEB.

Quando pediu a separação, Gobbi disse que também solicitou para ser retirada de todas as empresas nas quais aparecia como sócia, tendo sido atendida com atraso. Ela afirma não se lembrar de Montibeller, que segue empregado pelo COB, e diz que o agora ex-marido melhorou de vida depois de começar a trabalhar no comitê. "Mudou de casa, de carro. Parece que deu uma evoluída. Amigos em comum disseram que ele falava que tinha um salário de R$ 40 mil por mês, que ele era chefe de muitas pessoas, que ele mandava e desmandava lá onde ele trabalhava, mas eu não ouvi isso diretamente, relata.

Em nota à reportagem, o COB reforça que a contratação da Kroll para investigar as denúncias sobre as contratações na área de TI foi feita por Paulo Wanderley e pontua que "o parecer final da Kroll aponta que não houve irregularidades ou prejuízos para o COB, ao contrário do que quer fazer crer o blog".O COB nunca tornou o parecer final público. O comitê revelou alguns detalhes à reportagem, entre eles, que a auditoria recomendou uma investigação sobre todas as empresas e pessoas contratadas pela área de TI desde quando Paulo Wanderley assumiu a presidência.