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Olhar Olímpico

Nadador olímpico na Rio-2016 vira médico no combate ao coronavírus

Marcos Macedo, atleta olímpico, agora trabalha como médico - Arquivo Pessoal
Marcos Macedo, atleta olímpico, agora trabalha como médico Imagem: Arquivo Pessoal

28/03/2020 04h00

Enquanto a enorme parte dos seus companheiros de seleção brasileira nos Jogos Rio-2016 refazem os planos para tentar classificação para a próxima Olímpicos, agora em 2021, Marcos Macedo tem outras preocupações. Aos 29 anos, o agora ex-nadador está na linha de frente ao combate ao coronavírus, trabalhando 80 horas por semana em hospitais de São Paulo. Apesar do indiscutível histórico de atleta e da pouca idade, ele tem tomado todas as medidas de precaução para não se contaminar.

Macedo é caso raro no esporte brasileiro de alto rendimento, tendo se dividido entre os treinamentos voltados à classificação olímpica e os muitos anos de estudos necessários para entrar em medicina em uma universidade federal, a do Rio Grande do Norte (UFRN). "Nunca foi fácil, mas também não é o que todo mundo achava de muito fora da realidade. Era questão de organização. Quando estava no cursinho, conseguia dobrar. Acordava 4h15 para treinar e depois fazia outro treino 19h", lembra. Em 2011, na tentativa de se classificar para o Mundial de Xangai, passava a noite em claro, estudando escondido. Deu certo.

O foco na faculdade de medicina só foi deixado de lado no ano dos Jogos Olímpicos do Rio, quando Macedo trancou o curso para se dedicar aos treinamentos. A meta era não só se classificar nos 100m borboleta como também avançar à final olímpica. O sonho foi interrompido por uma infecção. "Emagreci quase 6 kg, estava ameaçado de fazer uma cirurgia, e só de última hora não preciso. No dia que cheguei na Vila Olímpica estava há 10 dias sem treinar, me recuperando", lembra. Terminou no 34º lugar.

Macedo sabia que aquela era sua primeira e última Olimpíada. "Já sabia que depois disso, acabando internato, já tinha essa fase de residência e aí realmente é o período que não dá para conciliar." Graduado no final de 2018, se despediu do esporte no Troféu Maria Lenk do ano passado e, no começo de 2020, entrou para a residência em psiquiatria na Unifesp. Veio para São Paulo sem nem imaginar o desafio que teria pela frente: o Covid-19.

"É uma situação que nunca pensei, que nunca imaginei que fosse vivenciar. Uma epidemia dessa magnitude, que fosse parar um país. Mobilizar o mundo. Nunca passou pela minha cabeça que eu ia enfrentar isso. Mas não chega a passar medo. Me sinto na obrigação de poder ajudar. Não é uma obrigação, mas é uma vontade", analisa.

No setor de psiquiatria do Hospital Universitário da Unifesp, o médico já sente os efeitos da pandemia. "Como é pronto socorro, com acesso aberto a qualquer paciente, agora que o vírus é comunitário a gente não sabe quem é portador assintomático ou não, acaba que as precauções são iguais. É como se todos os pacientes fossem potenciais contaminantes. Os cuidados são os mesmos", conta. A bolsa da residência é baixa e, para complementar a renda, Macedo dá plantões em hospitais particulares da cidade, na área de clínica geral. Ali, entra na linha de frente do combate à pandemia.

O ex-nadador potiguar diz que não tem sequer tempo de se informar por veículos de imprensa de massa - sites, TV's, jornais -, mas que constantemente lê artigos científicos para entender os riscos e os tratamentos. Segundo ele, é um aprendizado diário. "A parte psicológica é algo que a gente não estava preparado. Saber como enfrentar uma epidemia dessas ou nunca ter pensado nisso deixa muita gente mais ansioso. Ao longo dos dias a gente vai se preparando. A cada nova atualização que a gente vai recebendo a gente vai adaptando o fluxo dos pacientes. A gente está adaptando e evoluindo no meio da crise".

A partir do que tem estudado sobre o novo coronavírus, Macedo não tem dúvidas de que o distanciamento social é fundamental para conter a disseminação do vírus. "Sou completamente favorável a essas medidas de quarentena. Até o momento todos os países que escaparam de ter uma incidência e mortalidade altíssima foram os que conseguiram realizar de forma mais precoce o isolamento, como Cingapura, só para citar um exemplo. Se não temos um sistema de saúde com leitos e equipamentos suficientes para tantas pessoas doentes a única medida plausível é evitar que elas adoeçam".

O nadador também eliminou todo e qualquer contato social evitável. Não encontra mais os amigos da natação e vai do hospital para casa. Seu histórico de atleta nada vale nesse momento. "Sou jovem e saudável, mas até então não está relatado na ciência que práticas de atleta profissional tenham qualquer influência na evolução da doença. Jovens de forma geral costumam ter formas mais brandas ou assintomáticas, mas certamente não confiaria no meu histórico de atleta".