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Olhar Olímpico

MP e polícia civil investigam humoristas por ofensas a deficientes

25/04/2020 13h13

Provocados por uma denúncia feita pelo Comitê Paraolímpico Brasileiro (CPB), o Ministério Público e a Polícia Civil de São Paulo instauraram inquéritos para investigar os ditos humoristas Abner Henrique e Dihh Lopes por show em que zombavam de deficientes, incluindo atletas paraolímpicos.

O show foi realizado em novembro de 2019, em Campo Grande (MS), mas a gravação, deletada pelo Youtube por "conteúdo inadequado", começou a circular no início do mês de abril. Em um trecho do vídeo, Dihh Lopes diz: "No Teleton tem muitas crianças sonhando em voltar a andar. Se a gente parar para pensar deveria chamar Criança Esperança. No Criança Esperança ajudam criança com câncer, né? Mas tá errado. Se tem criança que não tem esperança".

Abner Henrique zomba de portadores de Síndrome de Down e de autistas, além de atacar atletas paraolímpicos. "Eu gosto de assistir Paraolimpíada. Tem uma vantagem. Se você por exemplo faz atletismo, você nunca vai sentir câimbra", disse, para delírio do colega e da plateia.

Para o CPB, as falas configuram conduta criminosa, prevista no artigo 88 do Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei n. 13.146/2015), que prevê pena de um a três anos de reclusão e multa, podendo a reclusão para quem "praticar, induzir ou incitar discriminação de pessoa em razão de sua deficiência". A mesma lei amplia a pena para reclusão de dois a cinco anos quando o crime "é cometido por intermédio de meios de comunicação social ou de publicação de qualquer natureza", o que seria o caso de uma publicação no Youtube.

"É preciso lembrar que a liberdade de expressão não é absoluta, ou seja, encontra limites na própria Lei. Não é possível, a pretexto de livre manifestação, proferir falas de cunho racistas, preconceituosas, discriminatórias, difamatórias ou atentatórias, como são as que foram produzidas pelos agentes e reproduzidas nesta peça", lembrou o CPB na denúncia feita ao MP.

Logo o MP paulista acatou a denúncia e abriu inquérito civil na 6ª Promotoria de Justiça de Direitos Humanos - área de pessoas com deficiência. Na semana passada foi a vez da Polícia Civil também instaurar inquérito criminal, que pode levar os humoristas à cadeia. Essa segunda investigação corre na Primeira Delegacia de Polícia da Pessoa com Deficiência.

Os humoristas se defenderam pelas redes sociais alegando que o show foi de "humor negro, subgênero que utiliza temas sérios ou sensíveis para extrai comicidade" e que essa é uma "forma de humor que continuaremos a praticar". "Temos liberdade para expressar nossa forma de arte e a ela não renunciaremos", escreveram.

Os dois humoristas disseram entender que "em momento nenhum" ultrapassaram o "limite da comédia", pelo contrário, porque a intenção não era passar "conhecimento científico, realista e preciso sobre os assuntos", apenas fazerem rir. Eles ainda alegam que o show não teve dinheiro público, ainda que esse fato nunca tenha estado em questão.

Não é o que pensam diversas entidades que assinaram nota conjunta de repúdio contra os "pretensos comediantes Abner Henrique e Dihh Lopes pelo modo ofensivo, ultrajante e desumano como trataram as pessoas com deficiência em seus shows". "O conteúdo apresentado pela dupla e compartilhado nas redes sociais não só nos encoleriza, mas nos entristece dado que um comportamento discriminatório, absolutamente inconcebível, ainda conta com aplausos e risadas do público que teve o desprivilegio de assistir àquele verdadeiro show de horrores promovido por esta famigerada dupla", diz a nota de repúdio.

Assinam, além do próprio CPB, também o Comitê Paraolímpico Internacional (IPC), Comitê Olímpico do Brasil (COB), Organização Atletas pelo Brasil, Movimento Orgulho Autista Brasil (MOAB), Fórum Nacional dos Secretários de Esporte e diversas federações esportivas. Entidades de apoio aos deficientes, como a AACD, também se posicionaram.