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Dinheiro público para formação de atletas vai bancar NBB

Georginho é o grande nome do time de basquete do São Paulo no NBB - Divulgação/saopaulofc.net
Georginho é o grande nome do time de basquete do São Paulo no NBB Imagem: Divulgação/saopaulofc.net

13/08/2020 14h45

Dinheiro público, das Loterias, vai bancar passagens aéreas e hospedagens para as próximas duas edições do NBB, dentro de um limite de R$ 2 milhões por ano. A novidade é uma quebra de paradigmas no esporte olímpico brasileiro e a entrada Comitê Brasileiro de Clubes (CBC) nas competições adultas, antes atribuição exclusiva das confederações que fazem parte do chapéu do Comitê Olímpico do Brasil (COB). O CBC quer acordo semelhantes com outros torneios nacionais adultos, como a Superliga.

Essa mudança de entendimento foi permitida por uma alteração discreta na Lei Agnelo/Piva, rediscutida no Congresso quando o então presidente Michel Temer baixou uma Medida Provisória tirando dinheiro do esporte. Até então, a lei dizia que os valores repassados ao CBC eram "destinados única e exclusivamente para a formação de atletas olímpicos e paraolímpicos". Mas esse parágrafo foi retirado e substituído por um genérico relativo à aplicação de todos os comitês.

Isso permitiu ao CBC dar sua cartada decisiva, o acordo para bancar a logística da Liga Nacional de Basquete (LNB), que foi revelado hoje pelo Estadão. A partir de agora, o CBC coloca sua fatia do dinheiro das Loterias à disposição de ligas e confederações para bancar torneios adultos, o que antes só o COB fazia. Até então, havia uma divisão: CBC bancava a base e o COB o adulto.

A construção até se chegar a esse ponto durou anos. O CBC, que recebe cerca de R$ 70 milhões por ano das Loterias, abriu em 2014 seu primeiro edital, pra distribuir dinheiro para os clubes sociais aprimorarem sua infraestrutura. Em 2016 o comitê passou a bancar também o RH (treinadores, preparadores, fisioterapeutas) das categorias de base dos clubes. Mas o grande salto veio em 2017, quando o CBC começou a pagar por competições nacionais, em parceria com clubes e as confederações.

Em um acordo triplo, o CBC se compromete a pagar passagens e hospedagem para atletas dos clubes associados e vinculados a ele e, em cada torneio, um clube do CBC fica como organizador. Isso garantiu a confederações como o CBB poder organizar mais competições, mesmo que ficassem dependentes financeiramente. E o CBC ganhou a visibilidade que não tinha pagando por uma infraestrutura invisível para o grande público.

Mas a visibilidade das competições de base também não foi suficiente para o CBC, que historicamente se incomoda com o fato de os clubes sociais não serem lembrados quando um atleta ganha uma medalha. Fala-se do COB, as Forças Armadas (quando é o caso), da confederação, mas não do CBC. Por isso a vontade de entrar no esporte de alto rendimento, tirando dinheiro da base. No basquete o número de competições de base vai cair de 30 para no máximo 10, com a mudança da destinação do dinheiro.

O CBC ofereceu pagar até R$ 2 milhões em passagens e hospedagens ligadas à LNB em cada uma das duas próximas temporadas. O dinheiro não é repassado à liga, sendo executado pelo comitê, que gasta dezenas de milhões de reais todos os anos com reservas de viagens. Para o NBB, é um desafogo financeiro depois do fim do patrocínio da Caixa, que bancava essa despesa.

O CBC exigiu contrapartidas. Todos os clubes participantes do NBB precisarão ter equipe também na Liga Nacional de Desenvolvimento (LND), torneio sub-22 que será novamente organizado pela Liga. A CBB, que antes organizava torneios nacionais do sub-11 ao sub-19, passará a ter dinheiro para apenas três: sub-14, sub-17 e sub-19. O próximo passo é fazer acordo semelhante com a Liga de Basquete Feminino (LBF), que também perdeu a Caixa e, sem a estatal, passaria por sérias dificuldades financeiras. As conversas ainda não começaram.

Mas a movimentação não vai ficar restrita ao basquete. O CBC tem reunião marcada com a Confederação Brasileira de Vôlei (CBV) e também oferece apoio à Superliga, numa negociação mais complicada, porque muitos clubes de vôlei não têm categorias de base. Outras confederações e ligas, como a de polo aquático, devem também serem procuradas.

Arialdo Boscolo, presidente do conselho do CBC e, na prática, seu líder, diz que não irá reduzir o investimento na base para apoiar o alto rendimento, que seria financiado apenas com o dinheiro que ficou sem utilização na pandemia. Mas a entrada do CBC no adulto parece um caminho sem volta.