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STJD adverte Carol Solberg e a proíbe de repetir o "Fora, Bolsonaro"

Talita e Carol Solberg - Divulgação
Talita e Carol Solberg Imagem: Divulgação

13/10/2020 14h50

A 1ª Comissão Disciplinar do Superior Tribunal de Justiça Desportiva (STJD) advertiu a jogadora de vôlei de praia Carol Solberg pela fala "Fora, Bolsonaro" em uma competição nacional em setembro. Ela foi condenada, por três votos a dois, com base no artigo 191 do Código Brasileiro de Justiça Desportiva (CBJD), por descumprir regulamento, com multa convertida em advertência. Os auditores, porém, deixaram claro que Carol não pode voltar a se manifestar politicamente na quadra de jogo. O voto de Minerva foi do presidente da comissão, Otacílio Araújo. "Foi um puxão de orelha, uma advertência. Se ela repetir, pode ser punida de uma forma pior", ele justificou.

"Você não está ali para se manifestar de forma politicamente ou religiosamente. A gente, no passado, todo mundo lembra que quando um atleta fazia o gol ele mostrava 'alô mamãe', 'alô papai'. Isso foi banido. Por quê? Por que não é o momento adequado. A atleta pode falar a vontade nas redes sociais dela, que ninguém vai falar nela. Mas se ela for nas redes sociais dela e falar mal do tribunal, ela pode ser denunciada", continuou justificando o presidente.

"Na minha opinião para expressar o que ela expressou naquele momento ela está errada. Ela não deveria ter falado aquilo. Se ela desse entrevista no outro dia, muito bem, opinião dela, fora das quatro linhas. Não tinha público, mas estava sendo transmitido por uma rede de TV. O atleta tem que saber que é o grande artista do espetáculo. Tem certas horas que você não pode falar coisas dentro da quadra de jogo. Dentro da quadra de jogo é errado. Em entrevista coletiva, como no futebol, é errado", continuou o presidente.

O entendimento foi de que ela descumpriu o artigo 3.3 de um anexo do regulamento do Circuito Brasileiro de Vôlei de Praia. Esse artigo, em documento assinado por Carol, diz que: "O jogador se compromete a não divulgar, através dos meios de comunicações, sua opinião pessoal ou informação que reflita críticas ou possa, direta ou indiretamente, prejudicar ou denegrir a imagem da CBV e/ou os patrocinadores e parceiros comerciais das competições".

Carol inicialmente estava acusada por dois artigos, mas o próprio procurador (acusação) retirou a acusação com base no artigo 258 — "Assumir qualquer conduta contrária à disciplina ou à ética desportiva não tipificada pelas demais regras deste Código". O relator Robson Vieira concordou, mas defendeu que a fala de Carol descumpriu o regulamento porque, no entender dele, o "Fora, Bolsonaro" prejudica a CBV. Ele recomendou multa de R$ 1 mil, convertida em advertência.

O auditor Rodrigo Darbilly votou parecido, escolhendo apenas outro valor de multa que não será aplicada, de R$ 500. Na sequência foi o estreante auditor Marcos Eduardo Bomfim que votou, discordando do enquadramento no 191. "Não vejo como enquadrar, não entendo que ela tenha descumprido qualquer regra da competição. As declarações não causaram qualquer prejuízo aos parceiros da CBV ou à própria CBV".

O quarto voto foi do auditor Gustavo Silveira, que concordou que ela não violou o regulamento. "O artigo 24 do estatuto do Banco do Brasil fala da diretoria executiva. Se algum desses diretores fosse atingido, eu não teria dúvida. Mas não vejo o presidente da República, seja ele quem for.,. ele não faz parte da diretoria do Banco do Brasil, patrocinador da confederação".

O presidente da comissão foi o único a defender que Carol deveria ser punida no artigo 258, com pena de suspensão de um torneio, no que foi voto vencido por quatro a um. Como ele votou a favor da condenação no 191, ela foi oficialmente punida, por três votos a dois, com pena convertida em advertência. Tanto a procuradoria quanto a defesa podem recorrer ao Tribunal Pleno do STJD.

O julgamento

A primeira a falar no julgamento foi Carol, que explicou o motivo do "Fora, Bolsonaro". "Estava muito, muito feliz de ter ganhado o bronze e na hora de dar minha entrevista não consegui não pensar em tudo que está acontecendo no Brasil e me veio um grito totalmente espontâneo de tristeza e insatisfação com o que está acontecendo", afirmou, reforçando que "não quis ofender Banco do Brasil ou CBV, de forma alguma".

Ela também afirmou que não se arrepende. "Não me sinto nem um pouco arrependida. Só manifestei minha opinião. Da mesma forma que vejo que os meninos da seleção de vôlei de quadra manifestaram a opinião deles, uma opinião contrária à minha, do futebol também. Não me arrependo", completou. Depois, ela ainda foi questionada outras duas vezes sobre ter ofendido o BB ou a CBV, mantendo a negativa. "Nunca tive nenhum problema com a CBV. Represento o Brasil desde os 15 anos e nunca tive problema com a CBV nem com ninguém."

Em seguida foi o subprocurador geral Wagner Dantas a falar, defendendo que o que seria julgado não era o direito de livre expressão, mas "se houve ou não violação a um regulamento". "O direito individual não pode ser exercido sem controle", opinou, antes de afirmar que a declaração de Carol poderia trazer graves consequências. "Se houvesse público presente com natural consumo de bebidas as palavras poderiam desencadear consequências inimagináveis."

Ele aproveitou sua fala, de cerca de 15 minutos, para rebater críticas recebidas pelo STJD pela denúncia, afirmando que o caso Carol não pode "nem de perto" ser comparado com o "17" de Wallace e Maurício Souza porque o gesto destes aconteceu no Mundial, na jurisdição de outro tribunal, e que se ela tivesse gritado "Viva, Bolsonaro" seria denunciada do mesmo jeito. "Não se trata de vedação à livre manifestação da atleta, mas sim se o local era adequado." Em nenhum momento ele explicou como a fala de Carol fere o regulamento da competição.

A defesa foi representada pelo advogado Leonardo Andreotti, que defendeu a inocência da jogadora. "Não foram palavras dirigidas à confederação, patrocinadores ou parceiros comerciais. Não cabe dizer em prejudicar a imagem da CBV. O artigo 191 não proíbe a manifestação de atleta", ele defendeu.

No seu voto, o relator Robson Vieira disse entender que o 'Fora, Bolsonaro" prejudica a CBV e o Banco do Brasil. "Isso pode refletir numa próxima renovação de patrocínio, ou em uma campanha de marketing que a CBV esteja mensurando". "Na transmissão do evento desportivo as marcas podem ter direito a não querer vincular sua marca a uma questão política", ele justificou, defendendo que ela feriu, sim, o regulamento.

Relembre o caso

A fala de Carol Solberg aconteceu após a partida que valia o bronze em Saquarema (RJ), em 20 de setembro. Encerrado o jogo, ainda na quadra de areia, a dupla vencedora pôde se pronunciar para a transmissão do SporTV. Primeiro Talita falou e, na sequência, Carol pegou o microfone e disse que não poderia esquecer, emendando o "Fora, Bolsonaro".

Ainda que o jogo, em um domingo de manhã, não tenha tido audiência expressiva, a fala ganhou repercussão sendo reproduzida nas redes sociais, especialmente no Twitter. Logo a discussão foi polarizada. Perfis de esquerda elogiando a postura de Carol e perfis de direita criticando, muitos pedindo o fim de um suposto patrocínio do Banco do Brasil a ela, que na verdade não existe.

A CBV se pronunciou no mesmo dia "repudiando" a fala que, no entender da confederação "denigre" (termo considerado racista) a imagem da modalidade. A Comissão Nacional de Atletas de Vôlei de Praia, presidida por Emanuel Rego, também soltou nota criticando Carol. Essas reprimendas jogaram mais luz sobre o caso.

A súmula da partida não citou a fala, mas, mesmo assim, o subprocurador Wagner Dantas, que teve acesso à fala a partir da repercussão na imprensa e nas mídias sociais, optou por denunciar Carol com base no regulamento da competição, pedindo pena máxima. Em entrevista ao Olhar Olímpico, ele contou que é também crítico ao governo, declara-se "antifascista", mas que a denúncia era seu dever de ofício.

Logo o presidente a OAB, Felipe Santa Cruz, aceitou defendê-la junto com Andreotti, tornando o julgamento ainda mais político. Marcado para a última terça, esse julgamento, porém, acabou adiado, depois de pedidos do Movimento Nacional de Direitos Humanos (MNDH) e da Associação Brasileira de Imprensa (ABI) para serem incluídos como "amigos da corte" (amicus curiae) no processo. Na sexta, o relator recusou esses pedidos.

No mesmo dia, o Ministério Público Federal do Rio de Janeiro (MPF-RJ) enviou despacho à CBV e ao STJD questionando sobre o julgamento. No documento, o MPF lembra que, há dois anos, não houve punição quando os jogadores Wallace e Maurício Souza fizeram o número 17 com as mãos após uma partida da seleção de vôlei no Mundial, ainda na quadra. Este era o número do então candidato Jair Bolsonaro, que os dois publicamente apoiavam. A foto foi publicada pela CBV nas redes sociais e os dois nunca foram sequer denunciados.

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