Olímpico em 2024, break dance mudará esporte. Entenda como é a competição
Os Jogos Olímpicos já não são mais os mesmos. E isso não é nem uma crítica, nem um elogio. É uma constatação. Esse movimento começou com o vôlei de praia se tornando esporte olímpico em 1996, passou pela chegada do BMX Racing como primeiro "radical" a entrar no programa em 2008, e agora atinge seu momento momento mais insólito com a inclusão do break dance como modalidade dos Jogos de Paris, em 2024.
Para os mais tradicionalistas, é uma afronta ao espírito dos Jogos Olímpicos, uma aberração. O cruzamento da linha que delimitava o que é esporte e o que é cultura e arte. Skate e surfe, que há anos têm competições na televisão, pareciam estar na divisa entre esses dois mundos, o limite do aceitável pelos puristas. O break dance estaria do lado de "lá" dessa fronteira.
Para o Comitê Olímpico Internacional (COI), a decisão faz parte de uma estratégia de se comunicar com jovens urbanos que se exercitam e se entretêm de uma maneira muito diferente dos seus avós. É preciso ter apelo para essa garotada, que não vai ligar a televisão, ou o Youtube, para assistir à íntegra da competição de pentatlo moderno.
O break dance, que é oficialmente chamado de "breaking", cumpre essa função. E, se pensarmos bem, sua essência não é muito diferente da ginástica artística, do nado artístico ou dos saltos ornamentais, com a diferença, importantíssima, de que o breaking é, como o atletismo, o hipismo, a vela ou a natação, é uma atividade física natural. Se os Jogos Olímpicos já têm competições de manobras sobre prancha, sobre skate, sobre bicicleta, embaixo da água, saltando de uma plataforma, com maças, fitas e arcos, e até em cima de um cavalo com alças, por que não em uma pista de dança?
Pessoas dançam, porque querem dançar, independente de medalhas, todos os dias em São Paulo, Tóquio ou Paris. No Rio, especificamente, jovens se reúnem para apresentações de "passinho", muito antes de o breaking, com o qual guarda várias semelhanças, virar esporte olímpico. Como bem disse o então candidato a prefeito de São Paulo Arthur do Val (Patriota) em debate, o breaking está presente diariamente nas escolas.
Como é uma competição
O que os Jogos Olímpicos vão fazer é dar uma medalha de ouro ao melhor b-boy e à melhor b-girl do mundo em 2024 — é essa a nomenclatura do "atleta" de breaking. E, para isso acontecer, é necessário um processo, já em curso, de transformar uma atividade física/artística/cultural em um esporte, o que passa pela criação de regras padronizadas e de estrutura hierárquica.
Os primeiros passos estão dados. A modalidade está sob a responsabilidade da WDSF (World Dancing Sports Federation), uma entidade criada para organizar as competições internacionais de dança de salão e que conseguiu, no passado, ser reconhecida pelo COI como a responsável pela dança, mas não incluí-la no programa olímpico. Como essa relação WDSF x COI já existia, coube a ela apresentar o projeto de inclusão do breaking, agora aceito.
A segunda etapa foi padronizar regras e critérios de avaliação. Porque o breaking olímpico, a grosso modo, é exatamente aquilo que a gente assiste em filmes. Dois "dançarinos" (lembre-se, o termo é b-boy) num ringue, um DJ, um locutor, e apresentações alternadas. Enquanto um dança, o outro assiste. Vence quem fizer a melhor apresentação, com o público sentado em volta.
O livro de regras do breaking prevê competições um contra um, dois contra dois e quatro contra quatro, mas o programa olímpico, ao menos por enquanto, só terá o torneio individual, com provas no masculino e no feminino. O DJ faz parte das regras e é ele quem escolhe a música que será tocada em cada batalha, que tem um número pré-determinado de rounds, que varia de acordo com a fase da competição. Cada round, no um contra um, tem tempo máximo de 60 segundos.
Na Olimpíada, se for repetido o modelo adotado nos Jogos Olímpicos de Juventude do ano passado, em Buenos Aires, as batalhas da primeira fase terão apenas um round. Tome o boxe como comparação. Ao invés de fazer uma luta inteira, os atletas disputam lutas de um round só contra vários rivais, se alternado. Esse modelo chamado de "round robin". Mesmo sem que todos se enfrentem, é possível criar um ranking dos participantes, a partir do número de vitórias e de votos dos jurados.
Depois disso vem o mata-mata. E aí as batalhas — o termo é usado apesar do contato físico ser proibido — passam a ser de melhor de quatro rounds. Caso haja empate, vence quem tiver, no total, mais votos dos juízes na soma de todos os rounds.
E quais os critérios para definir quem vence um duelo? Essa pergunta é mais difícil de responder. Em resumo são seis variáveis: técnica, variedade, performance, musicalidade, criatividade e personalidade. Mas o modelo de avaliação é bastante mais complexo, como se vê no modelo abaixo, retirado do livro de regras. Na prática, vence quem merecer aquele "uoooooou".
Os critérios de classificação para a Olimpíada ainda serão publicados e dependem da criação de um calendário internacional oficial e unificado, que também inclua critérios de inscrição em cada torneio. É um desafio pelo qual passou recentemente o skate, por exemplo, que até quatro anos atrás não tinha um "circuito mundial'. Sequer um 'Campeonato Mundial". Na comparação com o skate há quatro anos, o breaking parece estar mais avançado.
Os próximos meses dirão também se o breaking, como o skate, vai passar por um processo de discussão de autonomia administrativa. Quando o skate virou olímpico, ele estava sob a governança do patins, o que revoltou skatistas. Houve uma reorganização global e, no Brasil, a Confederação Brasileira de Skate acabou vencendo a briga de braço com a de patins.
No Brasil, hoje quem poderia organizar o breaking, por ser filiada à WDSF, organizadora da competição olímpica, é o Conselho Nacional de Dança Desportiva e de Salão (CNDDS), que tem pouca ou nenhuma afinidade com os b-boys e b-girls. A entidade apontada para gerir o breaking no Brasil deverá ser filiada ao COB e passará a receber recursos da Lei Angelo/Piva.
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