Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.
Atleta por liminar, brasileiro de 14 anos é fenômeno mundial no tiro
Esta é a versão online da edição desta segunda-feira (30/5) da newsletter Olhar Olímpico, que apresenta o jovem atirador Hussein Daruich, traz os bons resultados do triatlo e de Henrique Avancini no MTB, além da contratação de Jorge Bichara pela CBAt e do recorde de pontos na Liga Feminina de basquete. Para assinar o boletim e recebê-lo no seu e-mail, clique aqui. Para receber outros boletins exclusivos, assine o UOL.
Hussein Daruich já era campeão brasileiro adulto de tiro esportivo quando atingiu a idade mínima exigida pela legislação brasileira para um adolescente ter seu primeiro contato com uma arma de fogo. Aos 14 anos, agora dentro do que exige o último decreto presidencial sobre o assunto, o paranaense de origem libanesa já é o terceiro melhor do mundo entre menores de 21 anos. Com resultados constantes no nível de um finalista olímpico, é o novo fenômeno mundial do tiro esportivo.
Em boa parte do mundo, os primeiros contatos de um jovem com o tiro esportivo são tardios. No Brasil, desde maio de 2019, quando Jair Bolsonaro (PL) editou um polêmico decreto, um adolescente pode atirar em locais autorizados pelo Comando do Exército, a partir de 14 anos, com aval dos pais. Mas, antes disso, não havia nenhuma legislação que regulasse o assunto de forma terminante, permitindo ou expressamente proibindo.
Adl Daruich, médico filho de dois imigrantes libaneses radicados no interior do Paraná, diz que desconhecia qualquer proibição quando iniciou os sobrinhos no tiro ao prato, uma disciplina do tiro esportivo. Aos quatro anos, Hussein sentava no colo dele e já dava seus primeiros tiros para o alto, com o tio controlando o coice que a espingarda dá ao ser disparada. Com seis anos, o garoto acertou um prato pela primeira vez.
Aos 11, quando tinha pouco mais que a altura de uma espingarda, já estava entre os melhores do Clube de Caça e Tiro de Guarapuava (PR), cidade que é o maior celeiro de atletas de tiro ao prato do país — é de lá, por exemplo, Rodrigo Bastos, duas vezes medalhista pan-americano. Foi quando os pais e o tio consideraram levá-lo a um campeonato nacional que aconteceria em São Paulo. E descobriram que precisavam do aval da Justiça, caminho usual para quem buscava autorização para um menor de idade atirar na falta de uma legislação clara.
Liguei para o Durval (Balen, então presidente da Confederação Brasileira de Tiro Esportivo) e disse: 'O menino atira melhor que eu e que você e não querem deixar ele competir. Quero levar para atirar com os adultos, ele não oferece risco nenhum, vai comigo, com o pai e com a mãe'. Ele disse que então assinava embaixo. A gente tem conhecimento de promotores, juízes da cidade, explicamos que é um esporte olímpico e conseguimos essa licença" Adl Daruich, tio e treinador de Hussein
Com autorização judicial, aos 12 anos recém-completados, Hussein disputou pela primeira vez uma competição oficial. E, desde então, tem quebrado paradigmas na fossa olímpica, uma prova em que para cada atleta são disparados 125 pratos de cerâmica que voam a mais de 100km/h. Avançam para a fase final os seis que acertarem mais.
Com regularidade, Hussein marca acima de 115 pratos. Nas últimas três etapas do Campeonato de Excelência (que vale como circuito nacional), fez 120, 121 e 120 pontos, respectivamente, sempre acima do índice para competições como a Copa do Mundo, que é 118. Como comparação, nos Jogos Pan-Americanos de Lima-2019, isso daria a ele o terceiro lugar da fase classificação e uma vaga na final.
Aliás, foi em Lima que Hussein se mostrou ao mundo, no mês passado. Em sua primeira competição internacional, uma Copa do Mundo, acertou 73 pratos de 75 possíveis e fechou o primeiro dia do torneio no terceiro lugar, à frente, por exemplo, do italiano Erminio Frasca, que disputou a Olimpíada de Pequim-2008 quando o brasileiro ainda usava fraldas, e do mexicano Jorge Orozco, quarto colocado em Tóquio-2020, onde era o caçula da prova, aos 21 anos.
Hussein não manteve o nível no segundo dia da fase de classificação (acertou 42 de 50 pratos) e acabou fora da final, mas mostrou a que veio. A primeira medalha internacional não demoraria, e saiu no Mundial Júnior, sub-21, disputado este mês na Alemanha. Um bronze, atrás de um americano de 20 anos e um australiano de 18.
Em uma prova onde o atual campeão olímpico tem 40 anos, o atual vice-campeão olímpico tem 47, e o brasileiro Roberto Schmits foi ao pódio em Lima aos 50, ninguém nunca se destacou tanto aos 14.
A técnica do tiro eu já consegui adquirir. O que vai melhorar ainda é a concentração, a calma. Para você atirar tem que ter uma técnica boa, uma concentração muito boa, e humildade. São os três pilares, junto com um técnico bom, apoio familiar" Hussein, que usa uma arma com a coronha feita sob medida, que vai sendo trocada à medida que ele cresce
Quando perguntado sobre o que faz dele um atirador diferente dos demais, responde que é a humildade. "Não pode nunca deixar subir na cabeça. A maioria dos atletas bons é assim. Se pegar o Phelps, certeza que por ele chegar onde ele chegou ele não é metido, é humilde. Estou um pouco mais à frente dos adversários por ter humildade", opina — e o tio e treinador concorda.
O limite de idade não será problema para a Olimpíada de Paris-2024. Ao contrário de outras modalidades, o tiro não implementou um limite etário para os Jogos. Em Tóquio-2020, o mais jovem da prova de Hussein, a fossa olímpica, tinha 20 anos. No Japão foi quebrado o recorde de atirador mais jovem a ir ao pódio: o chinês Sheng Lihao, de 16 anos e 8 meses, conquistou a medalha de prata na pistola de ar de 10 metros, que não usa munição de fogo. Hussein terá 16 anos e 10 meses em Paris.
Ontem, Hussein foi o segundo colocado da 5ª etapa do Campeonato de Excelência, manteve a vice-liderança do ranking nacional, e encaminhou vaga para os Jogos Sul-Americanos, em Assunção (Paraguai), classificatório para os Jogos Pan-Americanos de Santiago-2023, e para o Campeonato das Américas, classificatório para as Olimpíadas de Paris.
Mas ele não pode competir nem na cidade vizinha sem acompanhamento. No Brasil, é preciso ter 25 anos para ser um CAC (colecionador, atirador ou caçador). Com 14, Hussein, que é patrocinado pela Taurus e pela Companhia Brasileira de Cartuchos (CBC) — tem desconto de 50% em cada um dos 200 cartuchos de R$ 3,20 que atira por dia —, usa armas registradas em nome do pai e precisa sempre estar acompanhado dele ou do tio para poder estar com seu armamento na hora da competição.
Ele concorda com a restrição. "Tem muito jovem que faz um monte de coisa que a arma de fogo não tolera. Se mudassem a regra e colocassem com 17 anos, por exemplo, eu ia gostar desgostando. Para mim ia ser bom, mas vai saber como a piazada ia usar."
Apesar dos resultados fantásticos, Hussein não pode nem descansar tranquilo como melhor atirador da família. Na etapa nacional disputada no fim de semana, ele foi superado pelo primo Haddy, que usa o sobrenome Darwich (Hussein é 'Daruich') e tem 15 anos. Os dois começaram juntos, treinam juntos sob o comando do tio Adl, mas Haddy, que foi 111º no Mundial em que o primo foi bronze, nunca havia passado de 116 pontos. Ontem, fez 121.
Além dos dois, Adl também treina a sobrinha Hannah, irmã de Hussein, mais uma que foi ao Campeonato Mundial da Alemanha em maio, onde ficou na 106ª posição na disputa feminina. Mas ela já quase não vai mais ao campo de tiro. Aos 18 anos, dedica-se à faculdade de medicina.
Mais destaques olímpicos
Ex-olímpicos, Reinaldo Colucci e Pâmella Oliveira vencem Ironman Brasil
Não se trata de uma disputa olímpica, mas que legal ver Reinaldo Colucci e Pâmella Oliveira vencerem um Ironman. Ambos fizeram carreira antes no triatlo olímpico, migraram para o Ironman, mas só haviam vencido provas mais curtas, as 70.3. Ontem, venceram o Ironman Brasil, única prova em território brasileiro, em Florianópolis. No masculino, é só a segunda vitória do Brasil em casa — a primeira foi de Igor Amorelli, em 2014. No feminino, Fernanda Keller ganhou duas vezes (2004 e 2008) e Ariane Monticeli uma, em 2015, antes de ser suspensa por doping.
O Brasil também começou bem a corrida por vagas do triatlo em Paris-2024. Neste fim de semana, na Copa do Mundo de Arzachena (Itália), primeiro evento válido para o ranking olímpico, Manoel Messias foi prata e Luisa Baptista conquistou o bronze.
Jorge Bichara, demitido do COB, é contratado para gerenciar o atletismo
Pouco mais de dois meses depois de ser demitido, Jorge Bichara, que era diretor técnico do Comitê Olímpico do Brasil (COB), assumiu função equivalente na Confederação Brasileira de Atletismo (CBAt). Perdem as outras modalidades, mas ganha o atletismo, que terá Bichara acompanhando, como já fazia há anos, o treinamento de nomes como Thiago Braz e Alison dos Santos, o Piu. Na CBAt, Bichara terá o desafio de olhar também para atletas que estão dois, três degraus abaixo da elite, e trabalhar pela evolução deles. Se tiver sucesso, será uma grande conquista para o esporte brasileiro.
Henrique Avancini é campeão pan-americano
Maior ciclista da história do país (de longe), Henrique Avancini conquistou neste fim de semana o seu segundo título pan-americano. Agora número nove do ranking mundial, deixou para trás o mexicano Ulloa para vencer a prova principal em Catamarca, na Argentina. José Gabriel Marques, número 54 do mundo, conquistou um bom quarto lugar.
Thayná bate recorde de pontos da Liga de Basquete Feminino
Thayná, da LSB, do Rio, bateu o recorde de pontos da história da Liga de Basquete Feminino (LBF) no fim de semana, na vitória tranquila sobre o time de Sorocaba por 105 a 49. A ala marcou incríveis 46 pontos, cinco a mais do que o antigo recorde, que era de Iziane. Detalhe: Thayná ainda pegou 16 rebotes na partida. O Sorocaba é o saco de pancadas da competição, com 14 derrotas em 14 jogos. O Sesi/Araraquara lidera, com 14 vitórias em 15, seguido de Sampaio Correa, Vera Cruz e Santo André.
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