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Olhar Olímpico

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Da tradição ao carisma: por que título de Piu é um dos maiores da história?

Alison dos Santos, o Piu, no Mundial de Atletismo de 2022 - Carol Coelho/CBAt
Alison dos Santos, o Piu, no Mundial de Atletismo de 2022 Imagem: Carol Coelho/CBAt

20/07/2022 15h23

Toda medalha tem seu valor e, sendo de ouro, ele é ainda maior. Mas a conquistada ontem (19) por Alison 'Piu' dos Santos no Mundial de Atletismo, pela forma como aconteceu e pelo contexto geral, tem uma importância acima da média no esporte brasileiro, e também do mundial.

Abaixo, listo 10 fatores que fazem desse título um momento histórico:

Peso maior

O atletismo é o rei do programa olímpico, por unir atletas de tipos físicos diferentes, com qualidade diferentes, de países diferentes. Com o Mundial do Oregon chegando agora à sua metade, 52 tiveram uma classificação entre os oito primeiros de uma prova. O mundo se reúne no atletismo. Em Jogos Olímpicos, o atletismo é o esporte que mais reúne jornalistas e, via de regra, o que tem mais público.

Coisa rara

Apesar de ter cinco medalhas de ouro olímpicas, o Brasil só havia ganhado um título no Mundial de Atletismo, com Fabiana Murer, no salto com vara. Não só o ouro de Piu é apenas o segundo do país na história, como fazia 11 longos anos que o Brasil não comemorava uma conquista deste tamanho em Mundial.

Tradição

O título veio nos 400m com barreiras masculino, uma prova que faz parte do programa olímpico desde 1900. Todas as provas valem o mesmo: uma medalha de ouro, uma de prata e uma de bronze, mas, por tradição, existe uma inegável hierarquia entre elas. De tão importante, os 400m com barreiras foram escolhidos para fechar o programa de ontem.

Entre os melhores

Piu se tornou campeão justo quando os 400m com barreiras estão mais em evidência do que nunca. Na final de ontem estavam os três melhores de todos os tempos: ele, o norueguês Karsten Warholm, recordista mundial, e o norte-americano Rai Benjamin. Isso não é comum. Nos 400m rasos, por exemplo, os quatro primeiros da lista fizeram suas marcas em 2016, 1999, 1988 e 2007. Cada um dominou um momento da história. Piu, Warholm e Benjamin têm que competir entre si.

Na hora certa

E evolução dos tempos dos 400m com barreiras nos últimos anos é impressionante. Até 2018, só um único homem (Kevin Young), uma única vez (em Barcelona-1992), havia corrido a prova na casa de 46 segundos. Parecia coisa de outro mundo. Mas, nos últimos quatro anos, foram 12 apresentações neste nível. O antigo recorde, que era 46s78, foi superado por Warholm em Oslo em julho do ano passado e, depois, melhorado pelo próprio norueguês em Tóquio, quando ele correu em 45s94. Ontem, Piu também deixou para trás a antiga marca de Young.

99%

E Piu claramente não correu tudo que podia. Nos 20 metros finais, já com a vitória garantida, ele desacelerou. O título veio com 46s29, mas, se quisesse, o brasileiro teria no mínimo assumido o segundo lugar do ranking de todos os tempos, que está com Benjamin, pelos 46s17 de Tóquio.

Entre os grandes

O atletismo tem um método de comparar resultados de provas diferentes, uma tabela de pontuação. Por essa tabela, Piu fez, ontem 1.322 pontos. Considerando todas as vezes, na história, que homens entraram para correr uma prova de atletismo em qualquer lugar do mundo, só em nove oportunidades alguém foi melhor: Usain Bolt no auge, cinco vezes, em três finais olímpicas e duas finais mundiais de 100m e 200m, Michael Johnson na final olímpica de Atlanta, Yohan Blake em uma prova em Bruxelas em 2011 (ambos nos 200m), e Warholm e Benjamin na final olímpica em que venceram Piu.

Maior da história

Assim, essa é, claro, a melhor apresentação de um atleta brasileiro em todos os tempos. E de longe. O ouro de Thiago Braz no salto com vara no Rio, por exemplo, valeu "só" 1.275 pontos. Quando João do Pulo bateu o recorde mundial do salto triplo, a prova foi de 1.260 pontos — Jadel Gregório depois, melhorou o recorde brasileiro com uma prova de 1.261 pontos. No feminino, a líder por esse critério é Maurren Maggi, com 1.275.

Vai longe

Piu tem só 22 anos. Quando fiz minha primeira entrevista com ele, em 2019, ele contou que o plano no início daquela temporada era se classificar para o Mundial Júnior. Em junho, já estava classificado para o Mundial adulto, em que foi sétimo. O crescimento foi meteórico, mas fica a impressão que o brasileiro ainda tem muito a crescer.

Piuzera

Ao ser campeão mundial da forma que foi e com o carisma que tem, Piu volta a colocar o atletismo na boca do povo. A modalidade passa por péssimo momento financeiro, com clubes e prefeituras retirando investimento. O renascimento do atletismo brasileiro passa muito pelo sucesso de Piu.