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João Paulo Diniz bancava CT, carreira de atletas e boletos de confederação
Em um país onde o esporte olímpico é bancado quase que exclusivamente pelos cofres públicos e por doações que podem ser descontadas do imposto devido, João Paulo Diniz era exceção. Mesmo depois que deixou de ter uma grande marca para expor em contratos de publicidade após a venda do Grupo Pão de Açúcar por sua família, o empresário e triatleta, que morreu ontem, continuou sendo um dos maiores mecenas do esporte no Brasil.
Gabrielle Lemes, 20 anos, medalhista de bronze no último Campeonato Sul-Americano de Triatlo, é um exemplo. Formada na Escolinha de Triathlon, projeto em grande parte bancado por Diniz, ela tinha, desde 2017, a carreira financiada pelo empresário. "Obrigada, João, por ter sido um dos meus maiores apoiadores, incentivadores, por sempre acreditar no meu potencial e em mim", postou ela no Instagram, lamentando a morte repentina do mecenas com quem havia se encontrado no meio da semana passada.
Foi pelo triatlo, que praticava como atleta amador, que Diniz entrou no esporte olímpico, ainda no fim do século passado, quando o Pão de Açúcar financiou uma seleção brasileira da modalidade, que faria sua estreia no programa dos Jogos Olímpicos em Sydney-2000. Um dos patrocinados era Juraci Moreira, que foi a três Olimpíadas, sempre com apoio da família Diniz.
Aposentado, Jura, como é conhecido, criou a Escolinha, que atualmente tem 12 núcleos e era apoiada por João Paulo. O empresário contribuía com recursos e ajudando na captação de recursos. "No início do ano, ele me disse: 'Se prepara, que logo logo teremos 40 núcleos da Escolinha pelo Brasil', e eu disse: 'Ainda bem que você parece comigo para me substituir nas visitas com as crianças'", escreveu Jura no Instagram.
De fato, os dois se pareciam muito, como fica claro nas fotos tiradas por eles um dia antes da morte de João Paulo. Os dois competiram juntos e venceram, depois de três horas e 49 minutos, o Aquaman, uma competição amadora que mistura remo e natação em águas abertas e que foi disputada em Paraty (RJ) um dia antes da morte do empresário. "Chegar na sua idade com esse pique virou minha meta, hein", escreveu Jura, sem imaginar a tragédia que levaria o "amigo, meio-irmão e meio-pai".
Apoio incondicional
Na mesma semana em que recebeu uma atleta patrocinada por ele e foi campeão nas águas, Diniz participou do lançamento da organização Siga Latin America, uma parceria entre a coalizão mundial de integridade no esporte SIGA e a brasileira Pacto Pelo Esporte, que visa restaurar a reputação do setor esportivo e recuperar sua credibilidade.
João Paulo era, afinal, forte incentivador desse objetivo. Todo ano, o Instituto Península, braço social da família Diniz, repassa R$ 350 mil como "doação incondicional", sem contrapartida, à ONG Atletas pelo Brasil, que lidera as discussões de pautas pró-Esporte no Congresso. Quando a entidade conseguiu a aprovação dos revolucionários artigos 18 e 18-A da Lei Pelé —que limitaram reeleições e deram direito a voto aos atletas—, o próprio empresário foi a Brasília com os atletas e atuou tanto publicamente quanto nos bastidores.
No triatlo, era João Paulo quem pagava, mensalmente, os boletos de uma dívida antiga da CBTri com o então Ministério do Turismo, decorrente de uma irregularidade na prestação de contas de um convênio feito em 2006. Por anos, a entidade ficou sem poder receber recursos públicos, uma vez que não tinha recursos próprios para zerar a pendência. A solução veio em 2020, quando João Paulo se ofereceu para pagar o parcelamento da dívida.
"Ele acreditou, investiu, apoiou, pagou dívidas, bancou atletas e os resultados estão aparecendo. Não há homenagens suficientes para retratar o que significa o esporte para você. Ainda tínhamos muitos projetos pela frente, incluindo a medalha olímpica do triatlo, e vamos fazê-lo, porque você merece", escreveu Marco La Porta, vice-presidente do COB e ex-presidente da CBTri.
Visão de mundo
Quando o Brasil pleiteava o direito de receber os Jogos Olímpicos de 2016, João Paulo era um dos grandes nomes do PIB brasileiro que apoiava diretamente a campanha, acreditando que o evento poderia ter grande participação do setor empresarial. O modelo defendido por eles, porém, contrastava com o defendido pelo governador Sérgio Cabral Filho, que resultou em uma Olimpíada bancada principalmente pelos cofres públicos.
Da organização dos Jogos, João Paulo passou a focar na preparação dos atletas visando a Rio-2016. Em 2011, uma entidade liderada por ele e por Roberto Klabin, e formada por diversos empresários, trouxe de volta ao Brasil o técnico de ginástica artística Oleg Ostapenko, para treinar Jade Barbosa e Daniele Hypolito na Cegin, de Curitiba.
Durante dois anos, o Movimento Livewright captou recursos de grandes empresas via Lei de Incentivo ao Esporte e bancou não só a equipe principal da Cegin em Curitiba, cujo ginásio foi reformado com patrocínio intermediado por ele, como também núcleos de formação espalhados pelo interior do Paraná.
No mesmo período, o Livewright bancou uma equipe profissional de ciclismo de pista, uma das modalidades olímpicas mais incipientes do Brasil, que treinava no Rio. Mas o projeto acabou quando o antigo velódromo construído para o Pan foi desmontado e a CBC não transformou os atletas do grupo em seleção permanente para que eles treinassem na Europa.
Insatisfeito com a atuação de algumas entidades de administração do esporte, João Paulo passou a focar seus esforços na melhoria do ambiente de negócio do esporte no Brasil e no seu projeto mais bem-sucedido, o NAR, Núcleo de Alto Rendimento, que fica em um clube municipal de São Paulo, no bairro de Santo Amaro.
A Prefeitura cedeu a área e o Instituto Península construiu pista de atletismo, campo de futebol e um galpão que tem academia de primeiro nível, áreas de luta e pista indoor de atletismo. É lá que treinam, de forma contínua, as seleções brasileiras de rúgbi e alguns dos principais nomes do atletismo olímpico e paralímpico, muitos dos quais não têm clube ou treinam com treinadores que não são contratados por esses clubes.
"Sempre na busca de uma melhor governança, João Paulo foi um dos fundadores do Movimento LiveWright. Junto com o Lide, ajudou na mudança da Lei Pelé e na aprovação da Lei de Incentivo ao Esporte. Passou a apoiar a Atletas pelo Brasil. Com a sua credibilidade e capacidade de mobilização, uniu atletas e empresários na formação do Pacto Pelo Esporte. Sempre atento, ele nunca deixou de lutar por um esporte mais desenvolvido e justo no Brasil. Perdemos um dos maiores líderes empresariais do esporte. E eu perdi um ótimo amigo", homenageou o velejador Lars Grael.
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