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Prefeitura tenta afrouxar lei de ruído e pode ajudar Pacaembu a ter shows

Fachada do estádio do Pacaembu, em 2014 - Junior Lago/UOL
Fachada do estádio do Pacaembu, em 2014 Imagem: Junior Lago/UOL

08/11/2022 22h17

A Prefeitura de São Paulo apresentou nesta terça-feira (8) e tem expectativa que seja votado amanhã (9) na Câmara dos Vereadores um "jabuti" em um projeto de lei para afrouxar as regras de limite sonoro para a realização de grandes shows na cidade. A iniciativa beneficia espaços de eventos como o Estádio do Pacaembu, onde os grandes espetáculos são proibidos exatamente por causa do barulho. Áreas como o Anhembi, o Ibirapuera e os entornos dos estádios de Palmeiras, São Paulo e Corinthians também devem ser afetadas.

O jabuti, nome pelo qual é conhecida a tentativa de alterar uma legislação a partir de inclusão de mudança no texto da lei em projeto sobre outro assunto, foi apresentado hoje pelo líder do governo, Fábio Riva (PSDB), em uma audiência pública da Comissão de Política Urbana, Metropolitana e Meio Ambiente. A discussão, ali, era sobre o PL 362/2022, que estabelece regras para as chamadas Dark Kitchens, as cozinhas industriais que têm se espalhado pela cidade para vender refeições por aplicativo.

Quem acessa os documentos do PL 362/2022 no site da Câmara não encontra o substitutivo apresentado pelo Executivo, mas ele foi distribuído aos presentes na reunião. O Olhar Olímpico teve acesso ao documento que, em seu artigo 13, propõe uma alteração no Plano Diretor para flexibilizar as regras para shows.

"Desde que previamente autorizados pelo Poder Público, os eventos e shows de grande porte, assim definidos em decreto regulamentar, que por sua natureza não ocorrem de forma continuada, estão sujeitos ao limite de pressão sonora RLAqe de 85db (oitenta e cinco decibéis)", diz o texto, que também altera a legislação para que a medição seja nos receptores da fonte sonora.

Essa flexibilização já havia sido proposta em um projeto de lei de 2018, que passou por essa mesma comissão em maio. Na ocasião, o físico e pesquisador do IPT (Instituto de Pesquisas Tecnológicas) Marcelo Mello Aquilino explicou os prejuízos para a população.

"85 decibéis é um valor extremamente alto, que vai nos trazer uma série de problemas tanto de incomodidade quanto de saúde. Para ter uma ideia, 85 decibéis é o permitido dentro de fábricas, onde existe todo um critério de segurança do trabalho. É inviável aplicar isso na cidade de São Paulo", explicou.

Depois de passar por essa audiência pública, o projeto de lei de 2018 teve seu trâmite interno na Câmara paralisado. Agora, o assunto volta com o jabuti no substitutivo do projeto das Dark Kitchens, que deve ser votado amanhã. Os assuntos não estão relacionados — e é isso que torna o projeto um jabuti.

"De acordo com dados da Ouvidoria Geral do Município, foi constatado em 2022 um crescimento nas queixas de poluição sonora de 83% em comparação aos mesmos meses do ano anterior. Entretanto, não se aumenta a estrutura de fiscalização que a Prefeitura possui. Isto sim seria mais do que necessário. Infelizmente, ficamos com a impressão que a poluição sonora não está sendo tratada como uma questão de saúde pública, mas no anseio de atender interesses privados específicos sobrepujando o interesse público, premissa da atuação de nossos representantes eleitos", reclamou, em nota, a Viva Pacaembu, associação de moradores do bairro.

O projeto, em tese, também beneficiaria o Allianz Parque, estádio gerido pela Real Arenas. Em abril, o local chegou a ser fechado pela Justiça, por desrespeitar os limites de barulho impostos pelo PSIU (Programa Silêncio Urbano), depois de três multas aplicadas pela prefeitura. Há duas semanas, porém, representantes da Real Arenas e da WTorre assinaram um Compromisso de Ajustamento de Conduta (TAC) com a prefeitura e o Ministério Público, com a arena se comprometendo a realizar mais obras anti-ruído.

Procurada, a prefeitura negou que o projeto seja um jabuti, porque o PL das cozinhas também trata de ruídos. A Casa Civil justificou a iniciativa de limitar o barulho de shows a 85 decibéis citando que outro artigo da mesma lei exclui a fiscalização em "manifestações em festividades religiosas, comemorações oficiais, reuniões desportivas, festejos ou ensaios carnavalescos e juninos, passeatas, desfiles, fanfarras, bandas de música".