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Atletismo faz Mundial ruim, mas tem chance de reverter a um ano de Paris

O Brasil não fez, definitivamente, um bom Mundial de Atletismo em Budapeste (Hungria). Ganhou uma medalha, com Caio Bonfim, conquistou outras cinco classificações entre os oito primeiros de provas olímpicas — o que vale pontos em um 'quadro de medalhas' alternativo da modalidade —, mas de forma geral mostrou involução na comparação com 2022.

Já escrevi algumas vezes que o atletismo brasileiro tem um abismo entre a "elite" e todo o resto. O Mundial do ano passado havia mostrado que esse topo da pirâmide estava mais povoado. Mas a competição encerrada ontem (27) viu a maior parte dessa elite piorar seus resultados e, ainda mais grave, passar longe de disputar medalha.

Alison 'Piu' caiu de ouro para quinto, mas tem a desculpa de ter passado boa parte do ano machucado. Darlan Romani foi de quinto a oitavo, mas nas eliminatórias fez uma marca que poderia valer bronze — o problema dele foi acertar na hora errada. Letícia Oro não repetiu o feito de tirar um salto da cartola, indo do bronze para o 12º lugar, e Almir Cunha Junior, sétimo no ano passado, nem final pegou desta vez: terminou em 21º.

Daniel do Nascimento, que flertou com se naturalizar chinês e foi oitavo na maratona do Mundial passado, desta vez abriu mão da competição. E Thiago Braz, quarto em 2022, está suspenso por doping. O 4x100m masculino até repetiu, na pista, o sétimo lugar do ano passado (foi depois desclassificado), mas com atuação muito pior. Erica Sena, voltando de gravidez (por isso não competiu em 2022), marchou a prova quase toda de 20km com vontade de ir no banheiro e terminou só em 13º.

Do grupo que parecia estar chegando à elite, Rafael Pereira repetiu o 17º lugar nos 110m com barreiras, o que demonstra um freio na evolução que ele vinha apresentando desde 2021, e Vitória Rosa, 12ª colocada no ano passado nos 200m, com direito a recorde sul-americano, desabou para o 44º e penúltimo lugar. Finalista olímpica no disco e 15ª em Eugene, Izabela Silva desta vez foi só 22ª.

E a lista de decepções continua. Nos 100m masculino, o Brasil foi de dois semifinalistas em 2022 para um 34º como melhor resultado em 2023, os resultados nas provas de campo masculina pioraram, apesar da expectativa sobre os jovens Pedro e Luiz Maurício, do disco, e na pista feminina foram oito classificações piores do que de 2022, contra só uma no sentido contrário. O revezamento 4x100m feminino foi, com folga, o pior do Mundial.

As boas notícias, em contrapartida, são contadas nos dedos. Para elite, são só três, duas na marcha atlética. Caio Bonfim foi bronze, com condições de brigar por prata (tinha duas advertências e resolveu não arriscar), e Viviane Lyra terminou em oitavo. Como a Olimpíada terá prova por equipes, com um homem e uma mulher, o Brasil tem chances reais de disputar também essa medalha.

Jucilene Sales de Lima, aos 32 anos, alcançou o melhor resultado da carreira: o oitavo lugar do Mundial no dardo. A prova está aberta e teve no pódio uma colombiana, Flor Ruiz, da mesma idade da brasileira, que sempre teve desempenhos semelhantes. Se Ruiz conseguiu, Jucilene também pode conseguir.

De resto, valem destaque o 17º lugar de Flávia Maria de Lima nos 800m, melhorando suas marcas nas eliminatórias e na semifinal (ainda que muito longe de brigar por final), o 15º de Renan Gallina, de 19 anos, que foi ao Mundial voltando de lesão, e se apresentou bem nos 200m. Ele claramente não deu seu melhor em Budapeste, e pode ser finalista em Paris. No salto em altura, Fernando Ferreira não foi finalista, mas terminou em uma boa 16ª colocação.

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Apesar disso tudo, o cenário pensando em Paris não é catastrófico. Talento o Brasil tem tanto para repetir a melhor campanha da história em número de medalhas (três em Pequim-2008) quanto para alcançar um novo recorde de finais. Mas é preciso corrigir a rota. Os meninos do 4x100m precisam ter mais chances de correr, Letícia Oro e Renan precisam treinar no exterior, Darlan não pode se esconder como se escondeu este ano.

Sigo com a opinião de que o Brasil tem levado delegações grandes demais aos Mundiais, com diversos atletas que não têm condições de conquistar resultados relevantes. Gente que faz o seu melhor na temporada e chega 18 minutos depois das vencedoras da maratona.

A CBAt parece estar dedicando esforços demais a trazer ao Brasil eventos que valem pontos no ranking mundial, mesmo sem grande competitividade, para poder classificar mais gente aos Mundiais. A estratégia deveria ser revista para o ano que vem. Quem tiver condições de brigar na parte de cima vai se classificar à Olimpíada com ou sem esses eventos. E, os demais, que tenham apoio para evoluir tecnicamente e também terem condições de se apresentarem em alto nível. Não é o tamanho da delegação que faz uma potência.

Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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