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Prata consagra a escola brasileira de fazer ginástica

Dois detalhes na entrevista pós-medalha ajudam a explicar a importância da prata conquistada ontem (4) pela equipe feminina de ginástica artística do Brasil no Mundial. Um, o técnico Francisco Porath, o Chico, desnorteado, contando que a técnica Iryna Ilyashenko havia sido sua estagiária. Na verdade, foi o contrário. O outro, a emoção da conversa entre Daiane dos Santos, nos estúdios da Globo, e a amiga Jade Barbosa, na Antuérpia com a medalha no peito.

O que o Brasil conquistou ontem foi a consagração da escola brasileira de ginástica artística feminina. É um feito coletivo, que vai muito além das seis ginastas e dois treinadores premiados com a prata. Um feito que não existiria se Chico, hoje técnico chefe, não tivesse sido estagiário de Iryna lá atrás. Se Daiane não tivesse aberto as portas para Jade, que por sua vez as abriu para Flávia, Rebeca e todas as outras.

Não é um resultado que veio por acaso, que caiu no colo do Brasil porque os astros assim quiseram. Foram 20 anos de construção de uma seleção brasileira. Ou mais, 22, se voltarmos a 2001, quando Daniele Hypolito ganhou a primeira medalha do país, no solo, e por muito, muito pouco, não beliscou o bronze no individual geral.

Mesmo quando o Brasil teve o que era, à época, um time dos sonhos, com Dani, Daiane e Laís Souza, em 2006, ameaçar EUA, China, Romênia e Rússia era um sonho distante. Elas tinham tradição. Nós, alguns talentos, como Jade, que chegaria chegando na equipe adulta no ano seguinte.

Na ginástica, isso são coisas muito diferentes. Em um esporte subjetivo, árbitros tendem a favorecer as potências, em um critério que pode ser reduzido em "na dúvida, para quem tá ganhando", conhecido por toda a comunidade. São as regras (não tão ocultas assim) do jogo, e é preciso jogar dentro delas.

Até conseguir transformar a soma desses talentos em um resultado coletivo, o Brasil errou muito. Apostou em um modelo de seleção permanente que não deu certo, arrebentou física e mentalmente jovens promessas, viu dezenas abandonarem o esporte cedo e só encontrou de novo uma luz no fim do túnel quando Rebeca Andrade e Flávia Saraiva chegaram ao adulto, às vésperas da Rio-2016.

Em um país que, apesar de suas dimensões continentais, não forma ginastas aos montes e tem alguns poucos clubes com equipes adultas, a aposta foi investir pesado um um grupo restrito de atletas. Cercá-las de recursos financeiros e cuidados nunca dispensados a atletas de mesmo nível de outras modalidades, a ponto de o COB pagar o aluguel para algumas ginastas e levá-las e buscá-las de casa.

A opção cobrou preço caro. Um ciclo olímpico atrás, em 2019, o Brasil sequer se classificou a Tóquio-2020 porque, com as lesões de Rebeca e Lorrane, o time passou a depender de uma ginasta que só era atleta nas horas vagas, e trabalhava como auxiliar administrativa no COB. Em uma crítica ao modelo, escrevi que as tops, sozinhas, não faziam verão. Pois fizeram.

Se em 2018, quando voltou a uma final por equipes de Mundial depois de quase três ciclos olímpicos, o Brasil flertou com a medalha, e a perdeu por nervosismo na reta final, desta vez o time cresceu de forma impressionante ao longo da prova. Nem a queda de Julia, na abertura da rotação na trave, as abalou. Pelo contrário. As incentivou a buscar os pontos perdidos.

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Uma maturidade conquistada com o tempo e com a liderança do brilhante Francisco Porath, o Chico, treinador de praticamente toda a vida de Rebeca. Foi ele a subir ao pódio, mas essa escola só existe porque frutos foram plantados, entre outros, por Keli Kitaura (que formou junto com Chico), Alexandre Carvalho (formador de Flávia), Irina (Julia e Lorrane) e Ricardo Pereira (Jade). Uma escola, afinal, formada com a contribuição de diversos professores.

Com a medalha, a seleção ganha novo status. Se conseguir repetir o time deste Mundial na Olimpíada do ano que vem, o Brasil é de novo muito favorito ao pódio. E, pelo que mostrou na Antuépia, ficando só 2,2 pontos atrás de um time norte-americano que contou com Simone Biles em plena forma, não é nenhum absurdo sonhar com o passinho que falta.

Opinião

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** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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