Conheça pelota basca, que tem palmada e brasileiro que nunca pisou no país
"Como você vê, não precisa de muita coisa. Uma parede, uma linha branca, uma bola, abaixar ali e vai. Queria muito que as crianças praticassem esse esporte nessa modalidade frontball", sonha Filipe Otheguy, único representante do Brasil na pelota basca dos Jogos Pan-Americanos.
Curiosamente, ele mesmo nunca pisou no Brasil, e não joga frontball, ainda que esteja disputando esta competição no Pan de Santiago, já classificado às semifinais. É quase como se um jogador de handebol estivesse jogando polo aquático. Amanhã, às 9h, pega o favoritíssimo David Alvarez, do México, por um lugar na final.
A pelota basca, como o nome já diz, é um esporte originário do País Basco, uma região de fortes tradições culturais na divisa oceânica entre Espanha e França, exatamente onde Filipe nasceu, cresceu e vive até hoje. Nos Campeonatos Mundiais, quase todas as medalhas são distribuídas entre franceses, espanhóis e mexicanos, com algum destaque para argentinos e cubanos.
O jogo tem a mesma lógica do tênis: uma disputa entre duas pessoas em que o objetivo é fazer com que o rival não consiga rebater a bola depois de ela tocar uma vez no chão dentro de uma área delimitada. A diferença é que não há uma rede, mas um paredão, enorme. No Brasil, o único está localizado no Paulistano, clube da elite de São Paulo.
No Pan, o torneio acontece em um clube da rica comunidade espanhola de Santiago, o Estadio Español, uma pequena versão do paraíso onde existe uma quadra de pelota basca de mais de 50 metros de profundidade, com muros altos em três lados, e grades resistentes separando o jogo da arquibancada. A pelota voa tão rápido que machuca. Por precaução, os próprios jogadores usam proteção nos olhos.
Filipe, porém, está competindo em uma versão bem mais simples e monótona. "No Pan deste ano não tem competição da modalidade que eu jogo, que é o trinquet", ele explica. O brasileiro, que tem as mãos muito calejadas, é especialista em uma versão da pelota basca em que se bate na bolinha com a palma da mão, dentro dessa quadra enorme. Em Lima-2019, ele foi bronze nela. Mas, em Santiago, só se joga o trinquet em duplas, e ele é o único atleta de alto rendimento brasileiro.
A opção, então, foi entrar em uma outra prova, o frontball, que onde também se usa a palma da mão para rebater, mas a bolinha é bem mais leve, e a "parede" é um colchão quadrado, de uns 6m de altura, posicionado no meio de uma quadra poliesportiva comum, dessas que existem em todos os cantos no Brasil.
Enquanto ele enfrentava o cubano Cristian Abréu, hoje mais cedo, em um lado do colchão, uma uruguaia vencia uma boliviana no outro. Quando alguém errava a mira, a bolinha atrapalhava o jogo do outro lado.
A vitória foi do cubano, por 2 sets a 0, parciais de 12/5 e 12/10, em um jogo longo, de mais de uma hora. Como o paredão é mole, e, a bolinha, leve, a pelota não pega velocidade, e cada jogador chega a bater nela 15, 20 vezes em cada ponto. De todos os esportes de confronto no Pan é, de longe, o menos emocionante. Tanto que não havia mais do que 20 espectadores nas pequenas arquibancadas.
Para Filipe, que é amador, a derrota doeu muito, porque o jogo era a chance de fugir do mexicano na semifinal e tentar subir um lugar no pódio na comparação com Lima-2019, quando se tornou o primeiro brasileiro a competir nesse esporte em um Pan. "Eu disputei a Copa do Mundo de 2018, me classifiquei para o Pan, e foi quando fui entender o que precisava fazer para poder competir", conta.
Filho da brasileira Luiza Inácio e do francês Paxkal Otheguy, Filipe nunca visitou a família no Ceará. Residente na pequena cidade de Saint-Pée sur Nivelle, na divisa da França com a Espanha, ele fala bem o português, ainda que com um sotaque meio francês, meio espanhol, por razões óbvias.
Até antes de Lima-2019, sequer tinha passaporte brasileiro. Como também não tinha ligação com a Sociedade Brasileira de Pelota Basca, entidade representativa da modalidade no Brasil, sua convocação para Lima-2019 foi cheia de dificuldades. Agora, porém, foi mais fácil. "Eu tenho contato direto com o COB, que bancou tudo para que eu viesse ao Pan", explicou. A forma de retribuir será tentar mais uma medalha.
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