Atletas PCDs, Anny e Bruna disputam o Pan e querem ser inspiração
O Brasil transpôs duas vezes ontem (2) uma barreira sempre presente no esporte de alto rendimento ao escalar duas atletas com deficiência física para disputarem os Jogos Pan-Americanos de Santiago. Bruna Alexandre compete por equipes no tênis de mesa, enquanto Anny Bassi disputou o revezamento 4x100m no atletismo.
As duas têm deficiências de membro superior e precisam adaptar a forma de praticar esporte a essa deficiência. Bruna, que já foi quatro vezes medalhista paralímpica, usa a mesma mão para jogar a bolinha para o alto e, depois, sacar. Anny precisa de um peso de areia para se apoiar na hora de largar.
Aos 26 anos, a catarinense de Balneário Camboriú disputa, em Santiago, a maior competição da carreira. Ela nasceu com a Síndrome de Poland, uma deformidade que afeta a região do peito e que, em alguns casos, como o dela, causa malformação de membro superior. Anny não tem os dedos e a maior parte da mão esquerda, que só vai até até a articulação do dedão.
É uma deficiência visível, mas que não a torna elegível para competir no atletismo paralímpico. "Eu acredito sim que ter uma deficiência me traz um pouco de desvantagens no atletismo. Mas, de acordo com as regras, não é o suficiente para ser elegível. Eu até tentei nadar, mas o que eu amo fazer é correr", diz ela.
João Paulo Castelleti, coordenador de classificação funcional do Comitê Paralímpico Brasileiro (CPB) explica que, para ser elegível na classe mais alta do atletismo paralímpico (de menor grau de deficiência), o atleta com malformação de membro superior deve ter o braço atingido, do ombro até a extremidade da mão, de um tamanho menor do que a distância do ombro até o pulso do outro braço. E, no caso de Any, ele é maior.
Como a mão gera maior impacto na natação, pela puxada da água, ela seria elegível no movimento paralímpico, entre outras modalidades, na natação. Mas a catarinense não pensa nisso. "Não tenho que aceitar onde as pessoas querem que eu esteja, mas estar onde eu quero estar. Eu poderia fazer outros esportes, mas tem que ter o dom. Não sei se eu entrasse no para na natação, não sei se seria tão boa quanto eu sou no atletismo. Amo estar aqui, aceito esse desafio que Deus me deu, e estou aqui", afirmou.
Anny abriu o revezamento 4x100m livre, o que significa que a largada dela foi parada, a tradicional. "A largada é meu forte", explica. Por causa da deficiência, ela usa um peso de areia, de aproxidamente 8 centímetros, para apoiar o braço e equilibrar os ombros para largar. No Pan, um árbitro chegou a querer impedi-la, mas logo entendeu a necessidade, e a autorizou a usá-lo.
Estrela paralímpica agora também quer Olimpíada
Bruna Alexandre também precisou se adaptar. Ela, que teve o braço direito amputado quando tinha apenas três meses, devido a uma trombose, consequência de uma vacina aplicada à época, inicialmente aprendeu a sacar prendendo a raquete embaixo da axila direita, jogando a bolinha para o alto, e depois recuperando a raquete. Mas isso deixava a borracha molhada, o que molhava a bola, e afetava o jogo.
"Precisei treinar por dois anos para conseguir sacar do jeito que eu saco hoje", ela explica. Assim como no caso de Anny, o que era para ser um problema, virou solução, e a largada se tornou o ponto forte do jogo de Bruna, que também é catarinense, de Criciúma.
No caso dela, a maior dificuldade é se equilibrar na mudança rápida de direção. Como Bruna joga há anos competições nacionais e continentais no tênis de mesa convencional, olímpico, essa deficiência é conhecida das rivais, que tentam explorá-la. "Eu tenho dificuldade no equilibrio, mas me adaptei bem para tentar não balançar o corpo tanto. Todas as meninas tentam me deslocar, dar um saque mais angulado, tirar da minha mão", conta.
No Pan, Bruna participou de dois jogos ontem. Em duplas, com Giulia Takahashi, venceu o primeiro jogo do duelo contra a Colômbia. Depois, repetiu a dose contra o Chile, ajudando o Brasil a avançar às quartas de final no primeiro lugar do grupo. Como o time já está classificado à Olimpíada, é grande a chance de a convocação se repetir para Paris-2024.
"Para a minha carreira, vai ser algo especial, mas acho que jogar as Olimpíadas e poder ser uma inspiração, principalmente, às pessoas com deficiência, é muito importante para mim, minha motivação", disse ela, em entrevista ao UOL, em junho.
Anny também quer ser inspiração. "Me orgulho de estar aqui, representar não apenas o Brasil, mas também minha cidade, meu estado, todas as pessoas com deficiência. Que esta seja até uma forma de inspiração, para outras pessoas verem que, quando a gente se dedica, tem resultado. A gente tem que acreditar na gente, não importa a dificuldade que você tenha."
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