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Astro do esqui, Lucas se naturaliza e faz Brasil sonhar com medalha na neve

Quando o norueguês Lucas Pinheiro contou a este colunista que adoraria representar o Brasil — "Eu ia amar esquiar com o Brasil no coração. Eu tenho amor pelo Brasil" —, a ideia parecia uma loucura. No Comitê Olímpico do Brasil (COB), ter um dos melhores esquiadores do mundo não passava de utopia, ainda que ele seja filho de uma brasileira. Três anos e meio depois daquela revelação, o sonho vai se concretizar.

A imprensa da Noruega já noticia o que só será anunciado oficialmente na quinta-feira (7), em uma entrevista coletiva na Áustria: Lucas vai abandonar a "aposentadoria" (e, aqui, cabem muitas aspas), para defender esportivamente o Brasil. Vai realizar o que disse sonhar, na sua primeira entrevista à imprensa brasileira, a esta coluna, em 2020.

"Quero tanto descobrir a neve para brasileiros... Eu sinto tanto amor pelo Brasil e esse esporte não tem o foco dos brasileiros. É muito legal que tenha um coração brasileiro na neve", disse na ocasião, quando era só um estreante em Copas do Mundo.

Agora, muda a nacionalidade esportiva com uma carreira consagrada, e ainda bem no início. Na temporada passada, no inverno europeu entre 2022 e 2023, ganhou o circuito da Copa do Mundo no slalom, foi sétimo no slalom gigante, e quarto no overall, que soma os pontos conquistados nas quatro provas do esqui alpino.

Dos 10 melhores, era o único garoto. O segundo mais jovem é três anos mais velho que ele, e a média do grupo é de pelo menos seis anos a mais do que o agora brasileiro. Daí se entende o potencial de Lucas e o choque no mundo do esqui quando ele anunciou aposentadoria, antes do início da temporada 2023/2024, que está prestes a acabar.

Desde então, se especulava se ele não passaria a defender o Brasil. Na época, um dirigente graúdo do COB, questionado pela coluna, desconversou. Mas Lucas passou a dar sinais. Veio passar férias em Ilhabela, reduziu o e-commerce de sua marca a uma pescoceira com as cores do Brasil, e declarou sua paixão pelo país. Parecia questão de tempo.

Lucas tem passaporte brasileiro porque é filho de uma brasileira. A história é de novela: Alessandra e Bjørn se sentaram lado a lado em um voo entre São Paulo e Miami no final dos anos 1990. Trocaram olhares, conversaram longamente, e logo se tornariam pais de Lucas, que sempre se dividiu entre o futebol brasileiro, a nossa paixão nacional, e o esqui alpino, paixão deles.

Reproduzo texto da coluna que contou essa história, em 2020:

"Quando eu estou no Brasil, eu adoro esse jeito de brasileiro. É muito diferente da família norueguesa, tem mais calor, mais amor. Eu adoro. Eu sou uma pessoa que tem muito amor, sou muito amoroso. Essa é a única coisa que eu não gosto da Noruega. Quero que as pessoas sejam mais calorosas, quero encontrar pessoas, quero abraçar", explicou Lucas, em um português inteligível.

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A mãe dele, e ele por consequência, continuou morando em Oslo mesmo depois de se separar do ex-marido. Lucas cresceu ali, sonhando ser jogador de futebol. Não tem ideia de quantas horas passou assistindo, no Youtube, vídeos de Ronaldinho e Ronaldo.

"Meu time preferido é a seleção brasileira", conta o esquiador, induzido pela família a torcer pelo Palmeiras, mas fã mesmo do Manchester United. Veio ao país para a Copa do Mundo, mesmo que não tivesse ingresso para nenhuma partida. Em Oslo, desfila com a camisa canarinho e o sobrenome brasileiro: Pinheiro.

Quando criança, Lucas vinha visitar os tios e avós em Campinas e São Paulo, todo verão norueguês e todo Natal. Mas futebol, num país nórdico, só se joga em parte do ano. No inverno a neve cobre tudo e, para que o menino não deixasse de praticar esporte enquanto os campos estão fechados, o pai sugeriu que ele tentasse o esqui. Lucas topou, gostou, e aos 12 anos enviou e-mail à Confederação Brasileira de Desportos na Neve (CBDE) pedindo um uniforme do Brasil. Ganhou e usou enquanto pôde.

O hobby, porém, foi virando coisa séria e, para poder competir, Lucas deixou de vir ao Brasil no Natal. Os resultados foram aparecendo. Foi campeão nacional júnior em 2017 e ganhou duas medalhas no Mundial Júnior de 2019, na Itália.

Volto à atualidade: Lucas só vai explicar na coletiva de amanhã por que escolheu representar o Brasil. A entrevista será na sede da Red Bull, sua principal patrocinadora. Em 2020, ele já dizia o que o incomodava: "Ter patrocinadores aqui na Noruega é muito difícil. A seleção nacional pega todos os espaços do meu uniforme. Você não pode levar patrocinador na minha roupa de corrida. Aí é muito difícil ter patrocinador."

No Brasil, a Confederação Brasileira de Desportos na Neve (CBDN) não tem patrocinadores.

Reportagem

Texto que relata acontecimentos, baseado em fatos e dados observados ou verificados diretamente pelo jornalista ou obtidos pelo acesso a fontes jornalísticas reconhecidas e confiáveis.

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