Letícia pegou Carol Solberg no colo; agora, será sua técnica olímpica
A principal treinadora de vôlei de praia da história do país está de volta às Olimpíadas. Doze anos após a prata com Alison e Emanuel em Londres-2012, Letícia Pessoa retorna aos Jogos trazendo consigo uma velha conhecida. Ela foi companheira de equipe de Isabel Salgado, e pegou Carol Solberg no colo. Agora, será sua técnica em Paris.
"Eu conheci ela quando nasceu. Eu jogava com a Isabel na época, entrava para passar no lugar da Isabel. Inclusive quando a Isabel estava com aquele barrigão, grávida ainda da Maria Clara. Eu lembro de pegar a Carol no colo, até. Num voo, a Isabel pediu ajuda: 'Segura ela um pouco aí'", diverte-se Letícia.
Diferente de Isabel, primeira grande estrela do vôlei brasileiro, Letícia não nasceu para jogar voleibol: era baixinha demais em uma época onde não existia o posto de líbero.
Descobriu isso de uma forma traumática: voltando de uma seleção infanto-juvenil, seu técnico perguntou o que ela queria do vôlei. "Quero ser campeã olímpica", disse na lata. "Então vou te dar uma notícia ruim e uma notícia boa. A ruim é que você não vai ser uma atleta olímpica. Mas você tem um talento muito grande para ser líder, para ser técnica. Então, eu queria que você pensasse nisso."
Então atleta do Flamengo, aposentou-se como jogadora aos 18 e virou técnica do mirim do Fluminense. "Eu me apaixonei desde cedo. Quando você tem um atleta, você tem que tirar o melhor dele, mas, para tirar o melhor dele, ele tem que confiar em você. E para confiar, você tem que realmente querer o melhor dele."
Letícia vê o esporte e a profissão assim porque realmente quer o melhor dos seus atletas. Não teve filhos, mas sete afilhados. Entre eles, um dos filhos de Emanuel Rego, de quem foi treinadora. Dele e de Alison, a quem descobriu na quadra e levou para a praia, ganhou o apelido de Felícia — "Gosta tanto da gente que chega a maltratar", brincava o Mamute em 2012.
A lista de ex-comandados de Letícia Pessoa é longa, porque a trajetória também é. Precursora, migrou para o vôlei de praia no comecinho dos anos 1990, quando Rose e Roseli, duas ex-colegas de Flamengo, fizeram essa migração e a chamaram para ser técnica delas. "Na época quase não tinha treino, só jogo", lembra. Treinadas por Letícia, Rose e Roseli foram terceira colocadas na exibição do vôlei de praia em Barcelona-1992.
Era o início de uma história de sucesso para a modalidade e para Letícia, que treinou, entre outras duplas, Isabel/Roseli (primeiras a vencer etapa de Circuito Mundial), Shelda Behar/Adriana e Juliana/Maria Elisa. No masculino, trabalhou com Alison/Emanuel, Ricardo/Emanuel (no reencontro) e Alison/Harley.
Foram inúmeras medalhas e títulos em Circuito Mundial e três medalhas olímpicas, todas de prata, com Shelda/Adriana (2000 e 2004) e Alison/Emanuel (2012).
Desde então, porém, ela está fora dos Jogos. Ficou perto de classificar Juliana/Maria Elisa para o Rio e viu o trabalho com Ágatha/Duda ser encerrado abruptamente no meio do último ciclo, segundo ela por uma briga com o marido de Ágatha, que também era preparador físico da dupla.
Já trabalhava com Bárbara quando Carol lhe deu um presente de natal ao fim de 2020: topava entrar para o time, até então sem grandes perspectivas, nem patrocinador. Mas que agora chega a Paris como quarto cabeça de chave, cotado a uma medalha, e que volta a colocar uma treinadora mulher do vôlei brasileiro nos Jogos após 12 anos.
Letícia se diz emocionada de pensar que as Olimpíadas finalmente terão um número equivalente de homens e mulheres competindo — ainda que haja enorme discrepância na função de treinador, que ela ocupa.
"É uma Olimpíada que está colocando os valores olímpicos, a amizade, o respeito, a igualdade. Jogar embaixo da Torre Eiffel, sabe, isso é um presente de Deus. A gente tem que aproveitar isso, tem que se divertir, porque vai ter muita gente vendo, e não tinha ninguém vendo enquanto a gente ralava. Vai ser um presente para o povo brasileiro, para nossas famílias, para nossos amigos. Só a gente sabe o quanto a gente ralou para conquistar esse espaço."
Em Paris, vai querer o ouro que não conquistou com duplas que chegaram como favoritas. "Nas Olimpíadas, gatinho vira leão, e leão vira gatinho".
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