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Entre máscaras e aglomerações: 34.000km pelo mundo em tempos de coronavírus

Australianos estocam massa e deixam prateleiras vazias devido ao coronavírus - Julianne Cerasoli/UOL Esporte
Australianos estocam massa e deixam prateleiras vazias devido ao coronavírus Imagem: Julianne Cerasoli/UOL Esporte

Colunista do UOL

19/03/2020 04h00

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Passageiros esperam voo em Melbourne na terça-feira
Imagem: Julianne Cerasoli/UOL Esporte
Viagens canceladas, mudanças de rotas, um clima de tensão que foi se intensificando nos aeroportos e nas ruas. Viajar pelo mundo nas últimas duas semanas por conta de um GP que acabou não acontecendo na Austrália deixou claro o aumento da preocupação das pessoas com o coronavírus, mas também mostrou que há muito que ainda precisa mudar na mentalidade de pessoas e governantes.

Quando o chamado "circo" da Fórmula 1 começou a se deslocar para o GP da Austrália, semanas de questionamentos acerca da insistência dos dirigentes em seguir adiante com a temporada mesmo com o avanço do coronavírus já tinham se passado. Desde o adiamento do GP da China, dia 13 de fevereiro, a Liberty Media, que detém os direitos comerciais da categoria, vinha sendo pressionada de todos os lados, mas mantinha sua posição de deixar quaisquer decisões nas mãos dos organizadores locais.

Para quem trabalha no esporte, estas semanas foram recheadas de incertezas, especialmente para quem mora em países mais afetados: os japoneses da Honda não voltaram para casa depois dos testes de pré-temporada, temendo terem a entrada revogada, e o mesmo aconteceu com os italianos de Ferrari e Alpha Tauri. Muitos planos de viagem tiveram que ser alterados porque os voos tinham conexões da China, em Hong Kong, etc. À medida que a data do início da temporada ia se aproximando, ficava cada vez mais difícil achar uma rota "segura", dada a fluidez (palavra que seria repetida à exaustão pelo CEO da F-1, Chase Carey, ao justificar o cancelamento em cima da hora do GP da Austrália) ficava evidente. Tanto é, que os vistos dos jornalistas para o GP do Bahrein, que seria a segunda etapa, nunca foram enviados, e ao Vietnã já tinha cancelado vistos para britânicos e italianos (coincidentemente, as duas nacionalidades mais representadas no paddock).

Embarquei dia 5 de março, de Londres, rumo à Austrália, e passei por questionamentos do check-in à chegada em Sydney devido ao passaporte italiano, mesmo não tendo estado no país desde o GP da Itália, em setembro do ano passado. Em nenhum momento, no entanto, passei por qualquer checagem de temperatura ou algo semelhante, tanto na ida, quanto na volta, dia 17 de março, quase uma semana depois da declaração de pandemia. O mais surpreendente foi não haver uma checagem do tipo no aeroporto de Singapura, no qual isso é um procedimento normal.

No início de março, os voos ainda estavam lotados, a grande maioria viajava sem máscaras (cuja eficácia para quem não está doente não é comprovada) e poucas pessoas pareciam limpar as mãos durante o voo. Isso, pelo menos na minha rota, via Dubai. Colegas que voaram via Hong Kong relataram que até os comissários estavam com máscaras e o aeroporto estava às moscas, dias antes da declaração de pandemia.

Cheguei em uma Austrália que não parecia se importar com o vírus, na segunda semana de março: os aeroportos estavam cheios, assim como as praias, restaurantes, e as casas noturnas tinham filas do lado de fora. Isso continuou inclusive depois que a OMS declarou pandemia e do cancelamento da prova.

Os únicos sinais de que havia um certo grau de preocupação entre os australianos eram encontrados nos supermercados. Mesmo com as compras limitadas, já no início de março não havia papel higiênico nas prateleiras. Depois foram as massas que sumiram, depois o pão e o leite. Enquanto isso, a cerveja Corona tinha que ser colocada em promoção para incentivar as vendas.

O que foi mudando nos 10 dias em que permaneci na Austrália foi o número de pessoas andando com máscaras nas ruas de Melbourne. Mas, em sua grande maioria, eram orientais, em uma cidade na qual a segunda língua mais ouvida nas ruas é, de longe, o chinês.

A atitude relaxada dos australiano contratou com o que se viu no paddock da F-1 mesmo no um dia e meio de atividades. Com a Europa já muito preocupada com escalada rápida do vírus, poucos "ousavam" a se cumprimentar com abraços ou apertos de mão, todos higienizavam suas mãos o tempo todo e não havia outro assunto senão o questionamento da decisão da categoria ignorar tudo isso e ir a Melbourne. As entrevistas eram dadas com os pilotos cercados (e os jornalistas, amontoados para serem ouvidos por eles). Mesmo assim, com tanta gente vindo da Europa, havia a certeza de que o vírus estava correndo pelo paddock e era uma questão de tempo para que um caso fosse confirmado. Até o momento, houve duas confirmações.

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Passageiros esperam voo em Melbourne na terça-feira
Imagem: Julianne Cerasoli/UOL Esporte

Acabei permanecendo na Austrália até o que seria terça-feira após a prova, já que as linhas das agências de viagem estavam congestionadas e não pude alterar meu voo. Esperava encontrar voos e aeroportos mais vazios, mas isso só ocorreu em Melbourne. Os voos em Singapura e em Dubai estavam lotados, assim como os aeroportos. A diferença era, novamente, o número de pessoas com máscara, ainda que muitas delas fossem mais decorativas. Mas o cuidado parecia parar por aí. Nas filas, as pessoas se amontoavam, desrespeitando recomendação da OMS.

A Fórmula 1 acaba de transferir a pausa de agosto para março e abril. As fábricas das equipes ficarão paradas por três semanas, por regulamento. A mudança visa permitir que corridas sejam marcadas para o mês de agosto. A categoria tem pelo menos cinco provas para remarcar: os GPs do Bahrein, Vietnã, China, Holanda e Espanha. A expectativa é que o campeonato comece entre o final de maio e o começo de junho.