Por que o exemplo de Hamilton não levou mais negros ao automobilismo?
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Lewis Hamilton, inglês de avô caribenho, foi o primeiro piloto negro a alinhar em um grid da Fórmula 1, em 2007. De lá para cá, apenas Pascal Wehrlein, alemão de mãe das Ilhas Maurício, chegou até a categoria. No grid atual, o britânico segue cercado de pilotos brancos - a exceção é o asiático Alex Albon, também inglês de nascimento, mas que corre pela Tailândia, país de sua mãe -, e isso se repete nas categorias de base. Ainda que a presença do hexacampeão tenha colaborado com o aumento da diversidade nas arquibancadas - hoje se vê mais negros, sempre com roupas e acessórios alusivos à equipe Mercedes ou ao piloto inglês -, isso não se estendeu às pistas.
Hamilton sabe que sua representatividade inspirou crianças negras a sonharem em seguir seus passos, mas tem consciência de que muito mudou desde que ele começou no esporte. Sua carreira foi meteórica: ele e seu pai, Anthony, percorriam a Inglaterra com karts e motores de segunda mão, sendo frequentemente ridicularizados pela cor de sua pele e pelo equipamento que usavam. Mas os resultados do menino chamaram a atenção da McLaren, que o contratou em 1997, quando o inglês tinha 12 anos, e, juntamente com a Mercedes, financiaram sua carreira a partir daí até ele chegar à Fórmula 1, aos 22.
O problema é que, aos 12 anos, um piloto atualmente já tem uma estrutura muito mais cara ao seu redor. É o que costuma ser chamado de "Verstapização" do automobilismo, devido ao fato de a carreira de Max Verstappen ter sido gerida de forma bastante profissional desde muito cedo. O sucesso dele, que chegou à Fórmula 1 muito bem preparado aos 17 anos, rapidamente revolucionou o tratamento das carreiras das crianças e acabou deixando o esporte ainda mais próximo da elite.
Ainda há algumas exceções, de pilotos contemporâneos de Max, como Esteban Ocon e Alex Albon, que tiveram gestões de carreira muito mais problemáticas do ponto de vista financeiro, mas é algo que se tornou uma preocupação no mundo do automobilismo. Para Hamilton, cabe à federação criar formas de mudar isso.
"No momento, não há ninguém surgindo com uma trajetória parecida com a minha. Até porque, se estivéssemos começando agora, não teríamos conseguido. Hoje se gasta 300 mil libras (quase R$ 2 milhões) logo nos seus primeiros anos de kart, e a gente não tinha tanto dinheiro. Nossa casa não valia nem perto disso, e meu pai teve que refinanciar nosso apartamento umas duas ou três vezes, e ele valia umas 40, 50 mil libras (cerca de 300 mil reais)", lembra Hamilton, cujo pai chegou a ter três empregos para sustentar a família e a carreira do filho.
"Acho que, no momento, é mais difícil [ter diversidade] porque correr se tornou mais caro. Isso é algo em que eu realmente quero me envolver, junto à FIA, pois acho que é um grande problema", diagnosticou.
Hamilton assume protagonismo e cobra ações da FIA
Preparando-se para a temporada em que pode se tornar o maior vencedor da história da Fórmula 1, Lewis Hamilton assumiu protagonismo ao cobrar do mundo do automobilismo um posicionamento sobre as manifestações antirracistas que começaram nos Estados Unidos depois da morte do negro George Floyd, vítima de abordagem policial em Minnesota. O posicionamento forte do hexacampeão fez com que vários pilotos e até a própria F1 divulgassem mensagens de apoio. Mas isso é apenas a ponta do iceberg da luta do inglês para promover a diversidade em seu esporte.
Hamilton tem cobrado a Federação Internacional de Automobilismo para tomar medidas práticas que viabilizem carreiras como a dele e entende que o melhor caminho para isso é diminuindo os gastos das categorias de kart, porta de entrada das crianças na modalidade, e garantindo que elas permaneçam na escola enquanto perseguem seu sonho.
"Correr está ficando cada vez mais caro, e as crianças estão perdendo cada vez mais tempo de escola. Não acho que a FIA está se preocupando com o fato de muitas crianças não estarem terminando a escola para focarem no automobilismo. E também não acho que eles se importam se os caras que estão chegando vêm de famílias ricas ou não, mas acredito que seja muito importante que haja diversidade", disse Hamilton, ao UOL Esporte, em outubro do ano passado.
O hexacampeão defende que a própria federação não aceite pilotos que estejam sacrificando sua educação em busca de uma carreira no automobilismo.
"Gosto do que a Fórmula E faz, com o evento ser só no sábado e domingo, acho que deveriam fazer o mesmo com o kart [para que as crianças não percam dias de aula]. Não acho que a FIA ou a CIK [Comissão Internacional de Kartismo] deveriam dar permissão para crianças que não estejam em dia na escola competirem. Eles não vão ficar felizes em me ouvir falando isso, mas acho que o automobilismo pode ter um impacto positivo nesta direção", opinou.
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