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Queda mostra que Mercedes não lidou bem com duas mudanças nas regras da F1
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Pode ser difícil entender como a mesma equipe que dominou a F1 por mais tempo na história da categoria, conquistando oito títulos consecutivos de construtores, pôde se perder em tão pouco tempo, chegando a ficar atrás da própria cliente Aston Martin. Mas também é verdade que não foi só o carro que mudou do início de 2022 para cá. E a queda do time de Lewis Hamilton e George Russell também passa pela maneira como eles lidaram com essas mudanças.
Na verdade, essa história tem seus paralelos com o fim de outro domínio, da Ferrari do início do milênio. Os seis títulos seguidos de construtores foram construídos à base de muitos testes (a Ferrari chegou a testar em três pistas diferentes em um mesmo dia!) e uma relação de prioridade com a Bridgestone, que não tinha outras equipes grandes como cliente.
Era uma época, claro, em que a F1 tinha mais de um fornecedor de pneus e os testes eram ilimitados. Quando o fornecedor passou a ser único, em 2007, e os testes sofreram reduções drásticas, nos anos seguintes, a Ferrari foi perdendo sua força. E isso ficou claro quando houve uma grande mudança de regulamento (2009) e, a partir daí, eles só lutaram pelo campeonato em duas oportunidades (2010 e, em menor escala, 2012) mais se aproveitando das brechas dos rivais Red Bull e McLaren do que pela superioridade de seu equipamento.
O que mudou na F1 desde que a Mercedes dominava
A Mercedes já foi estruturada para outra F1. Com pneus propositalmente de alta degradação, quase sem testes de pista, mas com muita simulação na fábrica, e principalmente com uma integração muito grande entre motor e carro. E foi pelo sucesso dessa integração que eles despontaram em 2014, quando a categoria adotou a unidade de potência híbrida.
A vantagem de potência foi diminuindo à medida que os outros iam avançando, mas o foco nas suspensões ajudava o carro no trato dos pneus, a aerodinâmica era copiada pelos demais, e os títulos iam se somando.
Até que a F1 mudou novamente.
Duas regras que entraram em vigor no começo de 2021 atingiram a Mercedes de uma maneira que eles mesmos não previam, e de maneira combinada. O teto de gastos obrigou o time a diminuir enormemente seu orçamento, que superava os 440 milhões de dólares em 2019. O limite será algo em torno de 145 milhões neste ano (o cálculo exato depende da inflação anual no final de março), mas sem contar salários dos pilotos, custos com marketing, etc. Então dá para dizer que eles tiveram que cortar por volta de 200 milhões.
Isso significou a perda de alguns profissionais importantes na área técnica. E deve ser doloroso ver que seus principais nomes da aerodinâmica, Eric Blandin e Enrico Balbo, agora estão na Aston Martin e na Red Bull, respectivamente.
A segunda regra é a que limita o desenvolvimento aerodinâmico de acordo com a posição da equipe no campeonato. Isso começou a valer em janeiro de 2021, exatamente quando, também por regulamento, as equipes puderam colocar o projeto do carro novo no túnel de vento. A Mercedes foi quem teve menos tempo disponível nos seis primeiros meses. Depois foi a segunda nos seis meses seguintes, e voltou a ser a primeira entre janeiro e junho de 2022.
Essas duas regras obrigam uma equipe como a Mercedes a ser mais eficiente com os recursos que tem à disposição. E é nisso que o time está tendo dificuldade quando comparado especialmente com a Red Bull. Até porque os cortes no orçamento foram semelhantes, o tempo de desenvolvimento aerodinâmico, também. E o rival também perdeu nomes importantes para a Aston Martin.
O que deu errado em 2022 e como voltar ao topo
Na pré-temporada de 2022, o corpo técnico da Mercedes se preocupou mais em esconder seu conceito mais extremo do que comprovar se ele funcionava. Ao longo do ano, se convenceu de que, se controlasse os saltos do carro, o rendimento apareceria. Assim, foi assegurado ao chefe Toto Wolff que não seria necessário mudar o conceito, pois seria uma questão de desenvolvê-lo.
Chega 2023, o carro não salta mais, mas segue gerando muita resistência ao ar ao mesmo tempo em que não produz pressão aerodinâmica suficiente nas curvas. Para corrigir o primeiro problema, eles são obrigados a usar uma asa traseira mais baixa, e isso atrapalha o rendimento dos pneus na corrida. Já o segundo problema faz com que os pilotos não consigam contornar as curvas de alta com tanta velocidade, prejudicando o tempo total de volta.
Hamilton está certo em questionar por que estes comportamentos do carro do ano passado não foram retificados. Tudo indica que existe algo no processo do departamento técnico que está emperrando as decisões. Seria alguma ferramenta? Seria soberba? Não dá para saber de fora.
O fato é que a Mercedes não colocou todas as fichas no seu conceito. Existe uma solução já no túnel de vento, com previsão de ir para a pista no início da temporada europeia (GP da Emilia Romagna, em meados de maio) ou, nas previsões mais otimistas, na prova anterior, em Miami. As laterais podem mudar antes, mas só isso não vai revolucionar o rendimento do carro. A equipe já confirmou que "haverá mudanças visíveis no carro nas próximas corridas."
Recomeçar a este ponto significa admitir que vai levar um tempo para voltar à ponta, pois muito tempo foi perdido enquanto os outros entendiam melhor conceitos que estão funcionando bem, principalmente o da Red Bull. Por outro lado, a evolução muito significativa e relativamente rápida da Aston Martin (usando o túnel de vento da Mercedes, diga-se de passagem) talvez tenha mostrado para a Mercedes que a tarefa não é tão difícil como eles imaginavam.
Mas a recuperação vai levar tempo, e também passa pela identificação dos fatores que levaram o time a errar e insistir por tanto tempo no erro. E por adaptar-se a essa nova F1 da eficiência. Para não virar uma nova Ferrari.
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