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Opinião

O que Hamilton vai ter que entender para ser um grande na Ferrari

Antes de mais nada, Lewis Hamilton já chega à Ferrari como um grande piloto, é claro. É o maior vencedor da história. Mas ser grande na Ferrari requer atributos diferentes. Alain Prost talvez seja o melhor exemplo de um grande piloto que não é lembrado como um dos grandes ferraristas. Ao mesmo tempo em que Gilles Villeneuve não seria tão lembrado se não tivesse sido um dos grandes na Ferrari.

São duas coisas diferentes porque os números não conferem grandeza automática em Maranello.

Eu tive uma aula de Ferrari em uma visita a Maranello ano passado. Conversando com o pessoal da fábrica, com quem recebeu pilotos ao longo de décadas em lojas e restaurantes. Estava dando uma mãozinha para um colega britânico que estava escrevendo um livro sobre a Scuderia e queria conversar com locais sem a barreira da língua.

É impressionante o poder que a figura de Michael Schumacher ainda tem no imaginário de todos. É claro que cada trajetória é única, mas tudo o que ouvíamos sobre o alemão focava em um mesmo ponto: ele entendeu o que era preciso para se certificar de que todos os que estavam ao seu redor se desdobrassem por ele. Ele se desdobrava por eles e, juntos, formaram uma das equipes mais vencedoras da história.

A união Schumacher-Ferrari só não é a mais vencedora da história porque, depois dela, veio o casamento do próprio Lewis Hamilton com a Mercedes. Mas foram sucessos construídos de maneira diferente.

Schumacher entendeu rapidamente que teria que lidar com os mecânicos como se fossem da sua família. E de uma família bem diferente do que ele estava acostumado na Alemanha. Antes de aprender a falar italiano, aprendeu a falar com as mãos e, com isso, estabeleceu uma comunicação mais profunda com cada um.

Ele lembrava de detalhes da vida das famílias dos membros da equipe, perguntava se a filha de nome X tinha melhorado as notas de matemática, por exemplo. E isso é muito lembrado até hoje.

Ele se conectou por meio da comida também, outro ponto importante na cultura italiana. Elegeu sua "mamma", Rosella, logo na noite anterior ao lançamento de seu primeiro carro na Ferrari, em 1996, e ela se tornou a única que cozinhava para ele. Até hoje, Rosella diz que Michael está em primeiro lugar no coração dela e, todos os outros (e ela cresceu praticamente dentro da pista de Fiorano), ficam em segundo, sem qualquer distinção.

Estabelecendo essas fortes conexões, Schumacher teve mais facilidade de impor a sua carga quase insana de trabalho. E os resultados foram aparecendo.

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Os tempos eram outros e o regulamento não limitava testes privados. Hamilton não vai "morar" na pista de Fiorano, que fica colada na fábrica, como Schumacher fez, e esse nem é seu estilo. Lewis tem muito claro que precisa se desconectar totalmente da F1 para poder focar ao máximo durante os finais de semana de corrida, e nem simulador costuma fazer. Ele prefere se ver como o último elo de uma engrenagem, dando espaço para que os demais envolvidos no processo brilhem sem depender dele.

Ao mesmo tempo, é um cara sensível e certamente sabe que a receita para ser grande na Ferrari requer ingredientes que muito provavelmente não fizeram parte de seus pratos até aqui.

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Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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