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Rodolfo Rodrigues

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Por que o Brasileirão está cada vez mais parecido com o Campeonato Inglês

Gerson, do Flamengo, disputa a bola com Zé Rafael, do Palmeiras, em jogo no primeiro turno do Brasileiro de 2020 - Cesar Greco / Palmeiras
Gerson, do Flamengo, disputa a bola com Zé Rafael, do Palmeiras, em jogo no primeiro turno do Brasileiro de 2020 Imagem: Cesar Greco / Palmeiras

Colunista do UOL

02/03/2021 04h00

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Calma, não estou louco. Sei muito bem que o Campeonato Brasileiro está décadas de distância na organização e bilhões de dólares atrás do Campeonato Inglês em termos de faturamento.

A comparação que faço aqui diz respeito à força dos mais ricos e o consequente resultado obtido por eles em campo e o enfraquecimento de clubes que já foram campeões e estão cada vez mais distantes de voltarem a ser o que já foram. Algo que vem acontecendo no Brasileirão nos últimos anos e se assemelhando com a Premier League inglesa.

Clubes com as maiores receitas no futebol brasileiros nos últimos anos, Flamengo e Palmeiras vêm se alternando nas conquistas recentes. Nas últimas 5 edições, o Flamengo foi 3º em 2016, 6º em 2017, vice em 2018 e campeão em 2019 e 2020. O Palmeiras, campeão em 2016, foi vice em 2017, campeão em 2018, 3º em 2019 e 7º agora, mas num ano atípico em que disputou outras decisões simultâneas.

Últimos dois campeões da Libertadores, Flamengo (2019) e Palmeiras (2020) vêm entrando nos últimos brasileiros com os elencos mais valiosos, criando um abismo enorme diante de alguns rivais que até o início da última década estavam praticamente em situações financeiras parecidas e com elencos bem equilibrados.

Basta lembrar que o Palmeiras foi rebaixado em 2002, em 2012 e quase caiu em 2014 (escapou na última rodada). O Flamengo, tirando 2007, 2008 e 2009, fez campanhas bem ruins no Brasileirão recente, como o 17º lugar em 2004, o 15º em 2005, o 16º em 2013 (quando também quase caiu) e o 12º lugar em 2015.

Para se ter uma ideia, entre 2003 e 2015, os clubes que mais pontuaram no Brasileirão foram São Paulo, Cruzeiro, Internacional, Santos, Corinthians e Fluminense, que tinham ficado com 12 dos 13 títulos. De 2016 para cá, Flamengo e Palmeiras dispararam. Nessas últimas 5 edições, o Flamengo ganhou 2 títulos, foi vice em um campeonato e somou 360 pontos. O Palmeiras, também duas vezes campeão, fez 355 pontos. O Santos, 3º na lista fez 312, seguido por Grêmio (305) e São Paulo (294). O Corinthians, campeão em 2017, é apenas o 8º da lista com 278 pontos.

No Brasileirão, além de Flamengo e Palmeiras, outros clubes que vêm apresentando crescimento nas receitas nos últimos anos vêm também ficando nas primeiras colocações, como Grêmio (que nos últimos anos ganhou a Libertadores, em 2017, e vem disputando finais de Copa do Brasil) e Internacional.

Para Amir Somoggi, sócio diretor da Sports Value, empresa de marketing esportivo, há algumas razões para isso. "O Flamengo se reestruturou e cresceu investindo no futebol sem reduzir custos, sendo mais arriscado e tendo mais retorno com as conquistas. Já o Palmeiras, que teve um aporte alto de patrocínio a mais do que vale, teve ainda uma receita alta com seu estádio, conseguindo ser forte. Agora, com os títulos, ele vem conseguindo equilibrar suas finanças", explica Amir.

Em 2019, segundo estudos da Sports Value, os clubes com mais receitas no Brasil foram o Flamengo (R$ 950 milhões), Palmeiras (R$ 642 mi), Internacional (R$ 441 mi), Grêmio (R$ 440 mi), Corinthians (R$ 426 mi), Santos (R$ 400 mi), São Paulo (R$ 398 mi) e Athletico-PR (R$ 390 mi). Cenário que quase condiz com a realidade dos times em campo nessa temporada 2020, com exceção do Corinthians, que teve um desempenho bem abaixo, e com o Fluminense, que conseguiu chegar na 5ª colocação.

Nos últimos 5 anos, outra diferença do abismo desses clubes que aparece visível é o número de participações na Libertadores. Grêmio, Palmeiras e Flamengo estiveram em todas as edições entre 2017 e 2021. Por outro lado, Vasco, Botafogo e Fluminense foram uma vez só.

Com receitas cada vez maiores, elencos fortes, premiações por títulos, Flamengo e Palmeiras estão se distanciando cada vez mais no Brasil e se aproximando ao que Manchester City e Liverpool vêm fazendo na Inglaterra. Lá, temos também um grupo dos clubes mais ricos no momento, mas com esses dois vivendo um momento muito melhor.

Os big-6, ou os 6 grandes, é formado por Manchester City, Manchester United, Liverpool, Chelsea, Arsenal e Tottenham, os clubes mais ricos, com os elencos mais caros e os mais bem-sucedidos em termos de resultados na Premier League, embora o Leicester e o Everton estejam querendo entrar nesse grupo cada vez mais. Nos últimos 15 anos, tivemos 3 clubes com mais conquistas (Manchester United e Chelsea com 5 títulos cada e Manchester City com 4), além de Leicester e Liverpool com 1 cada.

Nas últimas edições, no entanto, City e Liverpool vêm se sobressaindo sobre os demais concorrentes. Campeão em 2018 e 2019, na era Guardiola, o City foi vice em 2020 e já caminha para mais uma conquista. O Liverpool, nessa era do técnico Klopp, foi vice em 2019 e campeão em 2020, encerrando um jejum que durava desde 1990. Nesse meio tempo, foi ainda campeão da Champions League (2019) e vice em 2018.

Por outro lado, clubes que já conquistaram o Campeonato Inglês hoje vivem situações bem distintas e cada vez mais longe desses poderosos da atualidade. O Sunderland, 5º time com mais títulos na história, com 6 conquistas ao lado do Chelsea e do Manchester City, hoje está na 3ª divisão. O Leeds, campeão em 1992, o último antes do início da Premier League, só retornou agora à primeira divisão, depois de 17 anos fora. O Nottingham Forest, campeão inglês em 1978 e bicampeão europeu em 1979 e 1980, esteve na 1ª divisão pela última vez em 1999.

No Brasil, o clube dos 12 grandes parece existir hoje mais pelo passado e pelo tamanho das torcidas. Vasco, rebaixado pela 4ª vez desde 2008, e Botafogo, que caiu pela 3ª vez, estão cada vez mais distantes de voltar a ser grandes outra vez. Assim como o Cruzeiro, que em pleno ano de seu centenário segue na Série B do Brasileiro, completamente endividado e desfigurado.

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