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O maior Rafa, a maior vitória, o maior título
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Ao conquistar o bicampeonato do Australian Open o "21", Rafael Nadal tornou-se o maior campeão de slams em simples na história do tênis masculino. Um recorde que é quase secundário (eu disse "quase"!) diante de seu triunfo sobre Daniil Medvedev, que veio em cinco sets, 5h24min, por 2/6, 6/7(5), 6/4, 6/4 e 7/5. Para este jornalista, a maior vitória da carreira do ex-número 1 do mundo e que lhe valeu seu maior título. Uma exibição memorável do maior Rafa Nadal que o mundo já viu.
"Maior" é diferente de "melhor". Não, o Nadal de 2022 não tem o vigor físico do tenista que bateu Federer na final de 2009, também em cinco sets e vindo de uma semifinal de 5h contra Fernando Verdasco. Não, o Nadal deste domingo não manteve o nível altíssimo do espanhol que derrotou Federer na decisão de Wimbledon/2008 - um jogo considerado por muito como o melhor da história. E não, Rafa nem esteve perto daquele que amassou o suíço em Roland Garros/2008 ou bateu um bravo Djokovic em cinco sets em 2013, também em Paris.
O valor do Australian Open de 2022, que chegou ao fim já na segunda-feira, em uma final que atravessou as 12 badaladas, não pode ser medido apenas por nível técnico, tempo em quadra ou colunas estatísticas. O tamanho do feito de Rafa ultrapassa tudo isso e, não por acaso, ele mesmo classificou este título como "o mais inesperado, sem dúvida" de sua vida. Tem a ver com um raro alinhamento de elementos que pesavam contra seu sucesso em Melbourne este ano.
A começar pela lesão crônica no pé. Nadal encerrou sua temporada 2021 em agosto na esperança de se recuperar. Não adiantou. Por muito tempo, os tratamentos não deram resultado. Rafa teve momentos e conversas difíceis. Disse que não saberia sequer se teria a chance de voltar ao circuito. Pela primeira vez, a aposentadoria forçada se insinuava e enviava nudes via DM.
Ainda assim, Nadal voltou a competir, mas teve covid em dezembro, após um evento de exibição em Abu Dhabi. Passou um tempo sem poder treinar. Sentiu os efeitos do vírus no corpo. A viagem à Austrália esteve em dúvida. O veterano e sua equipe, eventualmente, decidiram tentar a sorte. Melbourne seria uma espécie de primeiro passo competitivo nesse novo retorno.
Rafa navegou bem a primeira semana do Australian Open, mas logo ficou claro que, fisicamente, o obstáculo seria gigante. Nas quartas, diante de Denis Shapovalov, o ex-número 1 teve uma queda de rendimento grande a partir do terceiro set. No quinto, beirou a exaustão. Parecia perto da eliminação. Quiça de uma desistência. No entanto, entre toalhas geladas e o ventilador pessoal no banco, protagonizou um pequeno milagre. Mais na inteligência e no coração do que na técnica, levou a melhor sobre o rival 13 anos mais jovem e sobreviveu.
Veio Berrettini nas semifinais, e Nadal voltou a ter uma queda de rendimento a partir do terceiro set. Novamente, porém, encontrou uma maneira de seguir competitivo sem depender do seu auge físico e passou por mais essa barreira.
Faltava ainda o maior dos obstáculos: Daniil Medvedev, 25 anos, campeão do US Open, tenista com os melhores resultados em quadra dura nos últimos seis meses, favorito ao título nas casas de apostas e dono de um tênis completo. Um pesadelo técnico, tático e físico para qualquer adversário. Nadal entraria na decisão como azarão.
Por dois sets, Medvedev deu respostas para tudo que Nadal tentou. Trocas longas, subidas à rede, slices, saque-e-voleio... Nada funcionava consistentemente. O russo abriu 2 sets a 0 e tinha o quesito físico a seu lado. Dez anos mais jovem que o veterano de 35, Daniil deveria - no papel - levar a vantagem se a partida se alongasse. Tudo apontava para mais um título de Medvedev, que se aproximaria perigosamente de Djokovic e teria a chance de tomar o posto de número 1 do mundo nas próximas três semanas.
Nadal não tinha vantagem técnica nem tática, mas lutava com coragem e coração. Não se entregou. Saiu de 2/3 e 0/40 no terceiro set para quebrar o saque do rival no nono game e forçar o quarto set. Foi aí que piscou a primeira luz no fim do túnel. Com a partida se aproximando das 4h de duração, Medvedev deu os primeiros sinais de cansaço. Depois de se defender espetacularmente por dois sets, o russo já não chegava tão inteiro nas bolas e cometia mais erros. Nadal viu a chance e transformou a fresta em janela. Agrediu mais, disparou mais winners, mudou a dinâmica da partida e forçou um quinto set.
Quando alcançou a parcial decisiva, Nadal já havia encontrado maneiras de driblar a lesão no pé, o condicionamento físico longe do ideal e o nó tático imposto por Medvedev no começo do jogo. Era ele, o espanhol, o melhor tenista em quadra. Ainda faltava, porém, ultrapassar uma barreira. Nas finais do Australian Open de 2012, contra Novak Djokovic, e de 2017, diante de Roger Federer, Rafa teve uma quebra de vantagem no quinto set e acabou derrotado.
Esse fantasma voltou para assombrá-lo neste domingo. O veterano sacou em 5/4 e 30/0, esteve a dois pontos do título, mas cedeu a quebra. Era mais um Australian Open perto de escapar. A história, desta vez, foi diferente. Rafa deixou para trás as memórias das derrotas doídas e acreditou. "Só tentei continuar acreditando. Já perdi algumas vezes aqui tendo vantagem no placar. Talvez hoje seja o meu dia", disse ao Eurosport após a conquista.
E foi. Na hora mais importante, Nadal fez seu patronus e afastou os dementadores. Quebrou Medvedev no 11º game e confirmou o saque em seguida. Desferiu o último golpe com um voleio. Game, set, match para um Rafa que passou longe da perfeição, não foi o mestre tático de sempre e não teve as pernas de outrora. Teve, sim, o coração e a inteligência emocional de um grande campeão. Um homem que, após o jogo, foi indagado sobre o que o carregou na Austrália e respondeu com sua simplicidade típica: "Amor pelo jogo, paixão, atitude positiva e espírito de trabalho. E as pessoas certas ao meu lado, ajudando todos os dias."
Um Rafa distante do ideal. Uma virada improvável. Uma conquista inesperada.
O maior Rafa. A maior vitória. O maior título.
Coisas que eu acho:
- O 21º slam faz de Nadal o maior da história? Não acho que dê para resumir essa discussão ao número de títulos. Do mesmo jeito que nunca cravei isso quando Federer era o recordista, não acho justo fazê-lo agora, estabelecendo Nadal no topo. Acho, como sempre achei, que é possível colocar Rafa, Roger e Novak no alto - dependendo dos critérios adotados.
- Ainda sobre essa conversa, Nadal tem a seu favor um número importante: é quem tem o melhor aproveitamento, ou seja, ganhou mais do que os outros em um número menor de torneios. E segue a eterna e apaixonante pergunta sem resposta: Quantos slam teria Nadal se não tivesse sofrido com tantas lesões durante a carreira?
- Som de hoje no meu Kuba Disco: Glorious (Macklemore). Porque I feel glorious, glorious / Got a chance to start again / I was born for this, born for this / It's who I am, how could I forget? / I made it through the darkest part of the night / And now I see the sunrise / Now I feel glorious, glorious / I feel glorious, glorious
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